O recente diálogo entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump, realizado nesta semana, ultrapassa o campo da diplomacia formal. Trata-se de uma iniciativa política marcada por movimentos estratégicos e senso de realidade, que recoloca o Brasil no centro das discussões internacionais e evidencia, ao mesmo tempo, a solidão crescente da extrema direita — tanto em Brasília quanto em Washington.
Mais do que uma simples troca de palavras entre dois chefes de Estado, o encontro mostrou que, na política internacional contemporânea, ideologias rígidas cedem espaço a acordos instrumentais e interesses concretos.
O tom cordial surpreendeu analistas acostumados a vê-los em polos opostos: o presidente dos Estados Unidos, sob pressão por resultados econômicos domésticos e tensões comerciais com a China, identificou no Brasil um parceiro estratégico; Lula, por sua vez, interpretou o momento como uma oportunidade de ampliar o canal de diálogo com Washington sem renunciar à defesa da soberania nacional.
Segundo fontes do Departamento de Estado e da chancelaria brasileira, a pauta incluiu temas como energia, biocombustíveis e reindustrialização, além de uma sinalização sobre a possível revisão de tarifas que afetam produtos brasileiros, como café e aço. Esses tópicos demonstram que o contato não se limitou à retórica: desde o início, houve tentativa de convergir interesses econômicos com impacto direto sobre setores exportadores e cadeias produtivas nacionais.
Politicamente, o efeito imediato é claro. Ao estabelecer um canal direto com Washington, Lula esvazia a narrativa de exclusividade que parte da direita radical buscava manter em torno das relações com os Estados Unidos. Figuras que se apresentavam como pontes privilegiadas — como o deputado Eduardo Bolsonaro — veem seu protagonismo reduzido: a centralidade passa a ser institucional e presidencial, e não mais dependente de canais informais.
O bolsonarismo, embora ainda detenha influência em setores do eleitorado e do Congresso, perde, com este episódio, parte de sua legitimidade no plano externo. Convém distinguir ato político de resultado concreto.
A conversão do entendimento diplomático em medidas práticas — como redução tarifária, acordos de cooperação setorial e mecanismos de acompanhamento técnico — dependerá de negociações prolongadas. Nos Estados Unidos, tais decisões enfrentam o crivo do Congresso e a resistência de setores industriais; no Brasil, o desafio será transformar o capital diplomático do diálogo em ganhos tangíveis para a economia.
Para fortalecer a análise pública, será fundamental observar indicadores objetivos: comunicados oficiais com prazos e metas, deliberações sobre tarifas, reações dos mercados e associações setoriais, além de sondagens que avaliem o impacto político interno dessa iniciativa.
Anne Applebaum, colunista da revista norte-americana The Atlantic, observou que “o novo realismo de Lula ecoa uma tendência global: líderes que compreendem que o poder hoje está na habilidade de conversar com adversários, e não apenas com aliados”. É uma leitura que traduz com precisão o espírito dessa movimentação diplomática — um aceno à política da convergência, mais do que à diplomacia da confrontação.
A aproximação entre Lula e Trump representa um reposicionamento estratégico do Brasil: sinaliza capacidade de interlocução ampla e pragmática, enfraquece o apelo de discursos personalistas e devolve ao país um papel relevante no diálogo global.
Lula, ao reabrir uma via direta com o presidente dos Estados Unidos, envia uma mensagem ao mundo e ao Brasil: o país está de volta à mesa onde se decide o futuro — e, desta vez, sem depender dos extremos que tentaram sequestrar a sua voz.
*Marcelo Avelino Copelli é jornalista correspondente na Europa, editor de Política e pesquisador na área de Comunicação
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.