Apesar de envolver membros da sua família, como o assessor legislativo Jorge Caiado, podendo o próprio Ronaldo vir a ser acusado de suposta negligência com a chacina para queimar arquivos da execução de Fábio Escobar (ex-coordenador de campanha na primeira eleição para governador, ainda pelo partido DEM), ambos seguem blindados por um anjo da guarda chamado judiciário coronelista goiano. Mas o tratamento destoante dos juízes com esse caso, em relação até mesmo a retórica punitivista do tipo beligerante do governador em matéria de Segurança Pública, o seu principal mote de campanha, não se restringe a estirpe Caiado, pois que, atualmente, todos os réus acusados de envolvimento com o crime encontram-se em liberdade mesmo que monitorada, em alguns casos, inclusive Cacai Toledo, ex-foragido da Justiça apontado como mandante do crime. Em razão disso, os defensores de direitos humanos acionaram a PGR e o Conselho Nacional de Direitos Humanos, desde o início de 2025, e tem incentivado a publicação de artigos em canais de comunicação autônomos como a Revista Fórum.
Para além desse quadro desolador, no dia 22 de novembro de 2024, a Justiça absolveu cinco policiais militares pela acusação de homicídio contra três das sete supostas vítimas, relacionadas à execução de Fábio, prevalecendo a velha tese de excludente de ilicitude ou culpabilidade por legítima defesa aos atos de resistência a prisão, o que tem efeito prático em desmembrar qualquer relação factual de parte da chacina para supostamente queimar arquivos de possíveis testemunhas da morte de Fábio Escobar, da morte dele, propriamente dita. Ou seja, transforma-se a morte de supostas pobres vítimas pobres da polícia em marginais que ameaçaram a ordem pública, voltando a se utilizar, quando convém, os maneirismos eugenistas de combate a criminalidade insuflado por Caiado. A letalidade policial e o encarceramento massivo nunca estiveram tão em alta e as prisões militares, tão cheias, pois, os casos mais gritantes de arbítrio estatal incentivado pelo governador que tão mal tem remunerado os seus policiais, acabam sendo investigados, mostrando que a incitação da violência e autoestima policial é um conto de vigário para os recrutas.
Motivado por esse cenário de guerra civil, foi lançado em abril o Grupo de Pesquisa sobre Violência Policial pelo Núcleo de Estudos sobre Criminalidade e Violência (NECRIVI/UFG), que poderá demonstrar com dados estatísticos a real situação da atuação policial em Goiás, como já o fizera o CNJ em relação a inúmeros relatos de violações de direitos humanos e práticas de tortura por parte dos agentes penais, o que redundou em uma força-tarefa da entidade, cujo produto final foi a proposição de um Caderno de Recomendações exclusivo para o sistema prisional goiano. O Núcleo tem mostrado como além de apologias (nos hinos de treinamento) e práticas de violações de direitos fundamentais em abordagens virulentas como forma de política pública, combinadas com fraudes e falsos testemunhos sobre cena do crime, e o governador manter as costas quentes dos policiais não implantando câmeras corporais, visando evitar produção de provas contra policiais, até mesmo viaturas militares, civis, penais e demais órgãos afins circularam sem placas de 2019 à 2024, o que prejudicou a identificação em tentativas de investigações de possíveis abusos de poder por parte das autoridades desses carros fantasmas.
Segundo o professor Djaci, líder do grupo, se no passado recente, Goiânia teve esquadrões da morte formados por grupos pontuais de servidores desvirtuados, atualmente, com a institucionalização velada dos atos de resistência, o aparato policial do Estado tornou-se um tácito e tático braço paramilitar do caiadismo enquanto projeto de poder e governo, em detrimento do Estado Democrático de Direito de fato. O caráter racista, classista e xenófobo da violência urbana é acompanhada da violência doméstica machista, que caminha pari passu ao aumento da taxa de letalidade policial, e tem na voz vociferante e tamanho colossal intimidador da pessoa física do governador, o modelo de virilidade tóxica do homem goiano heteronormativo e patriarcalista.
Ao mesmo tempo, a população está sendo cada vez mais violada nos seus direitos de imagem e intimidade, acossada por sistemas microfísicos de vigilância pantóptica por reconhecimento facial de média distância, implantado pelo estado e municípios em postes de ruas comerciais de grande movimento em regime de Parceria Público Privada, o que tem movimentado o já lucrativo setor privado de parafernálias digitais de monitoramento por imagem -, desde que as entidades públicas e privadas começaram a utilizar câmeras nos limites das suas propriedades particulares. Tais tratamentos desumanos da população, considerada criminosa até que se prove o contrário, são legitimados pelo governador no seu bordão maquiavélico “Ou bandido muda de profissão, ou muda de Estado” (versão eufemista de “Bandido bom, é bandido morto”), que contém, de forma subliminar, uma suposta grave ameaça à integridade física ou jurídica do suposto meliante, caso não opte por uma das duas opções da sentença, que parece não considerar a possibilidade civilizada de uma ação ostensiva da polícia dentro estrita legalidade do processo com ampla defesa e contraditório. Como sabemos que o suposto marginal costuma ser revistado, investigado e acusado mesmo sem provas, simplesmente, por ser pobre, preto, periférico, migrante, usuário de álcool ou drogas, é possível pensar que o caiadismo está legitimando práticas eugenistas, racistas, sexistas e xenofóbicas disfarçadas de combatividade estatal contra o crime.
Se na base “tá tudo dominado” pela polícia militar, civil e penal, transformada em quase em milícia armada do governador, no alto escalão do judiciário a situação não é alentadora. É notória a influência de Caiado no TJ-GO, que parece acossado em contrariar os interesses do governador e da Governadoria, responsáveis por pagar os altos salários e auxílios extras que deveriam existir para quem recebe salário mínimo, como se todo possível revés do governador fosse percebido por ele como uma espécie de emparedamento. A situação agravou-se após Ronaldo ter logrado êxito relativo ao julgar e punir, após convencer dezenas de membros do Órgão Especial do Tribunal, que o, até então, destemido desembargador Adriano Roberto Linhares merecia ser suspenso, por ele ter feito, numa audiência, críticas panfletárias piegas e evasivas, porém necessárias, ao óbvio papel opressor da polícia de Caiado.
Coincidentemente ou não, foi esse o magistrado que se “detinha” sobre o caso de Fábio Escobar, e que acabou se declarado “suspeito” após a falsa querela armada pelo governador de pedir a cabeça dele para defender a polícia, mas que parece ter nítido contorno de suposta interferência no poder para enfraquecer o membro do judiciário que poderia com uma sentença dar fim a liberdade de seu primo e a carreira política do próprio governador. Em tese, ele, Gracinha Caiado (esposa) e Anna Vitória (filha) deveriam estar participando das oitivas da investigação, já que, segundo a Revista Fórum, tiveram acesso a uma ficha criminal falsa de Fábio Escobar, visando forjar uma alta periculosidade dele e relativizar a relevância de sua vida, colocando sua trajetória no mesmo barco das trevas de outros suspeitos mortos por “justa causa”, com base na Lei de Talião da polícia em combate. Duas testemunhas policiais, no caso, o coronel Benito Franco e Newton Castilho) afirmaram terem sido procuradas por Cacai Toledo, para atuarem, supostamente, como “exterminadores do passado” e cessar o denuncismo de Fábio Escobar de suposto Caixa 2 na campanha de Caiado pelo DEM.
Policiais dispostos a matar para ganhar honrarias do Governo Estadual e presidente do Tribunal disposto a mudar colega de Vara (como aponta gravação do ex-presidente Carlos França para desembargador Adriano Linhares), só para acalmar as animosidades com o governador de família que virou já lenda urbana como sinônimo de desmandos mandonistas. Estão criadas as bases fascistas para a hegemonia da direita e extrema direita com o bolso-caiadismo em Goiás e no Brasil, o que poderá catapultar Caiado, caso ocorra a provável desistência do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, para o segundo turno da disputa presidencial. A diferença entre Caiado é que seu totalitarismo tem como base de apoio fundante as forças oficiais de segurança pública e justiça, enquanto com Bolsonaro se deu por meio do poder paralelo das milícias. Se Bolsonaro, por vezes, comparado ao Poderoso Chefão, foi associado ao Caso Marielle Franco por “sincronicidade”, simplesmente, por ter vínculos de vizinhança (Cond. Vivendas, Barra de Tijuca) com Ronny Lessa, Ronaldo Caiado é associável à chacina de Fábio Escobar pela porta da frente, mesmo que na terceira pessoa, no caso, por intermédio de um membro do seu clã com cargo público e acesso livre na época ao Palácio das Esmeraldas, ou seja, sem necessidade retórica de apelar para fascinantes teorias de conspiração. No entanto, tal paralelismo é comumente evitado pela imprensa goiana que prefere falar do Caso Escobar, de forma higiênica, sem mencionar muito o nome do governador, só o sobrenome através do primo, como se ele não fosse extensão do fenótipo dele.
O que mais parece espantar é a não-ação de Lula e do PT nacional para dar mais atenção aos fenômenos políticos que tem ocorrido neste tubo de ensaio da campanha presidencial que se tornou Goiás, passando a ocupar as suas trincheiras no Cerrado, haja vista que a vitória de Caiado poderá significar a prisão e liberdade eterna de Lula ou Bolsonaro, respectivamente. A recente visita de Edinho Silva para pedir, aos deputados federais e estaduais do PT goiano, apoio para a sua candidatura à presidência do partido, é um aceno ainda tímido para fazer Goiás esquecer a cartilha do pequizismo caiadista com pretensões genocídas (e quiçá totalitaristas), que pretende fazer o Palácio das Esmeraldas, um trampolim seguro para o do Planalto. E, de fato, geograficamente, ele está bem próximo do objetivo, enquanto Lula se esquece de cuidar dessa espécie de fazenda federal no Estado de Goiás chamada Brasília, talvez, equivalente, em termos de agrimensura, às terras da família Caiado no Estado. Brasília, que corre sérios riscos de ser novamente invadida, dessa vez, com tapete vermelho, pelos mesmos cangaceiros do 8 de janeiro.
Entre mortos e executados: operação policial em Águas Lindas de Goiás resulta em 3 óbitos mal explicados
Operação policial, realizada no dia 12 de abril, resultou na morte de um adulto e de dois adolescentes na cidade de Águas Lindas de Goiás. As mortes teriam ocorrido em um contexto de suposto confronto policial com sujeitos, supostamente, faccionados. Isso é o que diz a nota oficial e o boletim de ocorrência da Polícia Militar do Estado de Goiás (PMGO). Mas os fatos parecem apontar para suspeita de execução sumária e violação grave de Direitos Humanos e Fundamentais previstos na Constituição Federal, confirmando as suspeitas de que a Polícia do governador é fora da lei e tem atuado por meio de justiçamento hamurábico. Os vizinhos do apartamento do ocorrido mencionaram que foram ouvidos gritos de clamor e súplicas pelas vidas dos jovens executados. Segundo o deputado Mauro Rubem do PT, "policiais já foram na cidade de Águas Lindas intimidar as famílias das vítimas, e isso é muito grave. É mais uma atitude violenta não autorizada da polícia que não pode ser naturalizada”.