De Bamiyan, Palmyra e Weintraub: a destruição do mundo, por Marcos Danhoni

“Weintraub se coloca no mesmo caldo tóxico que engendrou o fundamentalismo talebã do Afeganistão ou o regime islâmico ultrafundamentalista e assassino do ISIS, na Síria”

Abraham Weintraub - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Por Marcos Cesar Danhoni Neves*

“Ninguém liberta ninguém. As pessoas se libertam em comunhão” (Paulo Freire).

Cena 1: março de 2001. Milicianos pertencentes ao regime Talebã invadem o Vale de Bamiyan, Afeganistão, onde há muitos séculos passavam as caravanas da rota da seda, ligando a China à Índia, e dinamitam as duas grandes estátuas de Buda, uma de 55 metros e a outra de 38 metros de altura.

As duas esculturas tinham sido esculpidas na rocha cerca de 1.500 anos antes do trágico evento que as fizeram desaparecer para sempre. O regime fundamentalista talebã havia reduzido a pó um dois dos mais eloquentes e longevos monumentos da tradição e da cultura budista, numa região que, outrora, cultuava a paz e a harmonia ente seus habitantes.

Cena 2: junho de 2015. Pelotões não regulares das milícias do Exército Islâmico, ISIS, invadem a bela e histórica cidade de Palmyra (Síria), com um grande sítio histórico da ocupação romana datada de dois mil anos, e destroem quase completamente seus belos monumentos, estátuas e portais.

A longa ocupação dos fundamentalistas islâmicos na cidade instaurou o terror, assassinando boa parte de seus habitantes, submetendo-os a prisões, torturas e à fome. A bela cidade da Síria foi completamente devastada, destruindo o legado deixado no cruzamento das civilizações do Oriente e do Ocidente.

Cena 3: 7 de maio de 2020. Abraham Weintraub, ministro das hordas palacianas do DesGoverno miliciano de Bolsonaro, afirma para a imprensa que removerá, na verdade, destruirá, o painel em homenagem ao educador Paulo Freire, inaugurado oficialmente diante do Prédio do MEC, em Brasília, no dia 12 de dezembro de 2003, pelo então ministro da Educação, Christovam Buarque.

O ato de ameaça de Weintraub localiza-se dentro de um grande mapa da destruição da educação, da ciência e da cultura brasileira. Os sinais são evidentes e escancarados: cortes de bolsas, criminalização das ciências sociais e humanas; pauperização das universidades públicas; evocação do fundamentalismo religioso; fornecimento de infraestrutura para grupos organizados de vândalos e agressores; ameaças de toda ordem etc.

O ministro Weintraub, que nada entende de educação, de universidade (entrou na Unifesp mediante notas baixíssimas), de Língua Portuguesa, de cultura, mira suas armas, calibradas com a retórica fascista, ameaçando todo processo que tirou o Brasil do marco civilizatório emerso após o fim do regime instaurado pelo golpe militar de 1964.

Pretendendo manter um calendário do Enem, mesmo em meio a uma pandemia, e fazendo chacota que a Covid-19 não matará mais que 40 mil pessoas, Weintraub se coloca no mesmo caldo tóxico que engendrou o fundamentalismo talebã do Afeganistão ou o regime islâmico ultrafundamentalista e assassino do ISIS, na Síria.

Weintraub não está sozinho, óbvio, como diria o velho homem do filme “O Poço!”. Damares Alves, Ricardo Salles, Regina Duarte, Paulo Guedes, André Mendonça e o chefe dos chefes, Jair Messias Bolsonaro, além dos asseclas que eles empregaram no grande projeto de destruição da nação brasileira, farão com que o belo painel dedicado ao nosso maior educador e mais conhecido personagem e marco da educação mundial, Paulo Freire, seja destruído!

Porém, a História é pródiga! Sobre as ruínas uma nova civilização prosperará, reconstruindo suas bases e relegando ao lixo da velha civilização a vergonha dos atos que praticaram em nome de valores estranhos à nossa própria humanidade.

*Marcos Cesar Danhoni Neves é professor titular da Universidade Estadual de Maringá, autor do livro “Lições da Escuridão” entre outras obras.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum