Nobel da Paz detona Facebook, enquanto China regula redes e jogos – Por Kerison Lopes

Todas as evidências mostraram que o mundo está sob o domínio de Zuckerberg. Menos a China. Por lá, suas redes sociais não fazem parte do dia a dia dos cidadãos

Facebook na China (Reprodução)
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Por Kerison Lopes *

Na última sexta-feira, o Instituto Nobel da Paz norueguês designou a comenda à jornalista filipina Maria Ressa e seu colega russo Dmitry Muratov. Eles foram escolhidos entre 329 candidatos para valorizar "o jornalismo livre, independente e baseado em fatos, que serve para proteger contra abuso de poder, mentiras e propaganda de guerra", como justificou o comitê em seu comunicado.

Muratov é um dos fundadores do jornal Novaja Gazetano, que já teve seis jornalistas assassinados e Ressa dirige a agência de notícias Rapper, que surgiu de uma página do Facebook lançada em 2012. Perseguida pela ditadura do presidente filipino Rodrigo Duterte, não foi contra ele que Maria Ressa disparou no dia seguinte à premiação. Direcionou suas críticas à plataforma Facebook, que acusou de ser uma ameaça à democracia. Para ela, o gigante da mídia social falha em não proteger seus usuários contra a disseminação do ódio e a desinformação, além de ser “tendencioso contra os fatos”. O povo filipino é o que mais gasta tempo em mídia social no mundo e 97% da população está conectada na empresa de Mark Zuckerberg.

Após a eleição de Duterte em 2016, a jornalista evidenciou a importância do Facebook na sua vitória, através de milhares de páginas que disseminavam notícias falsas a serviço do ditador. Qualquer semelhança com a ascensão de Jair Bolsonaro não é mera coincidência. Por aqui também a plataforma foi fundamental no pleito presidencial, assim como o Watshap, outra empresa pertencente a Zuckerberg.

Na mesma semana da escolha do Nobel, o Facebook sofreu outros duros golpes. Sua ex-funcionária Frances Haugen afirmou que a rede social "enfraquece a democracia". Em depoimento à uma comissão do Senado dos Estados Unidos, a ex-gerente de produtos afirmou "que os produtos do Facebook prejudicam os adolescentes, semeiam divisões e enfraquecem a democracia”. Dias antes do depoimento, o planeta acompanhou perplexo o apagão digital das plataformas de propriedade do bilionário americano. Watshap, Facebook e Instagram ficaram fora do ar por seis horas e mostraram como estamos dependentes de empresas que estão nas mãos de apenas um homem.

Todas as evidências mostraram que o mundo está sob o domínio de Zuckerberg. Menos a China. Por lá, suas redes sociais não fazem parte do dia a dia dos cidadãos. O governo comunista sempre alegou que o Facebook é uma ferramenta de disseminação de boatos e ideias contrárias aos interesses do povo chinês. Depois dos estragos feitos na democracia de muitos países como Filipinas e Brasil, agora o Comité Nobel Norueguês, ao homenagear Maria Ressa, chega à mesma conclusão.

Apesar de estar protegida dos males das plataformas estadunidenses, a China reconhece que não são apenas elas que estão adoecendo o mundo. Seus habitantes sofrem as consequências que a internet tem trazido no mundo inteiro. E este foi o tema de um simpósio promovido pela agência reguladora de entretenimento via rádio, televisão e internet, ligada ao governo chinês.

Do encontro, realizado em setembro, algumas decisões foram tomadas e estão virando leis. Uma delas proíbe menores de idade de jogarem videogames durante a semana. Eles poderão utilizar apenas entre 20h e 21h de sextas, sábados, domingos e feriados. Outra diz respeito a limitações ao que chamam de “cultura de celebridades”. São o que no Brasil se acostumou a chamar de influenciadores digitais. As novas regras valem para todos que têm grande número de seguidores nas redes sociais.

Os debates do simpósio concluíram o que é nítido no mundo inteiro: os “influencers” manipulam os internautas, principalmente em questões de imagem corporal e no consumismo exacerbado e supérfluo. A publicidade que praticam é um dos pontos que o governo chinês resolveu intervir. Caso sejam artistas, podem exercer seu papel na rede, desde que não usem sua influência para promover publicidade.

*Kerison Lopes é presidente da Casa do Jornalista de Minas Gerais, ex-presidente da UBES e do Sindicato dos Jornalistas e fundador do Bloco Volta Belchior.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.