Debate eleitoral não é favor das emissoras, é obrigação com o interesse público; por Alencar Santana

O que estamos vendo nas atuais eleições municipais em várias cidades do país é um escancarado processo de censura e silenciamento de vozes opositoras aos candidatos apoiados pelos donos dos emissoras. Isso é um grave crime contra a democracia

Único debate entre candidatos de São Paulo realizado nesta eleição, na Bandeirantes (Reprodução)
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Por Alencar Santana Braga*

O Brasil chega às eleições de 2020 com duas grandes ameaças à democracia. Por um lado, a extrema-direita participa de forma organizada da disputa eleitoral e quer levar à esfera municipal a política de morte e destruição que Jair Bolsonaro aplica no governo federal. Por outro, grandes meios de comunicação restringem o direito à informação da sociedade, que não poderá saber o que pensam os candidatos a prefeito da maioria das cidades brasileiras, já que emissoras de rádio e televisão decidiram, por conta própria, não realizar debates em muitos dos maiores municípios do País.

A tarefa de derrotar a extrema-direita nas eleições cabe aos partidos políticos do campo democrático, movimentos sociais e demais organizações da sociedade civil.

Já a atribuição de garantir que a população não tenha – mais uma vez – o seu direito à informação violado por grupos empresariais que possuem concessões públicas é uma obrigação fundamental e inequívoca da Justiça Eleitoral, como ente organizador das eleições no Brasil.

Com base nestas premissas, apresentei em 2019 um projeto de lei (PL 814/2019) para tornar obrigatória a realização de debates nas eleições para os cargos de presidente, governador e prefeito, com participação também obrigatória de todos os candidatos.

Meu projeto estabelece que a Justiça Eleitoral organize pelo menos um debate em cada eleição para cargos do Executivo, em qualquer nível federativo. Aos meios de comunicação caberia a obrigação de transmitir o evento. E esse debate organizado pelo ente público não elimina a possibilidade de outros debates promovidos por quem quer que seja, inclusive pelos próprios meios de comunicação.

O que não podemos aceitar é uma situação como a de 2018, em que Jair Bolsonaro fugiu de todos os debates no 2º turno contra Fernando Haddad, preferindo apenas dar entrevistas a emissoras simpáticas que trocaram o jornalismo pela propaganda eleitoral mal dissimulada.

E ainda menos aceitável é que empresas que recebem concessões públicas do Estado se omitam da responsabilidade em promover o contraditório entre candidatos a cargos eletivos.

O que estamos vendo nas atuais eleições municipais em várias cidades do país é um escancarado processo de censura e silenciamento de vozes opositoras aos candidatos apoiados pelos donos dos emissoras. Isso é um grave crime contra a democracia que precisa ser coibido na forma da lei.

A transmissão de debates eleitorais organizados pela Justiça Eleitoral é um dever que se deve estabelecer para empresas de comunicação detentoras de concessões públicas. Assim como a presença obrigatória dos candidatos nos debates é o compromisso mínimo que estes devem ter com o eleitorado.

Existem muitas propostas legislativas sobre esse tema em tramitação no Congresso Nacional e espero que possamos aprovar uma legislação sobre isso até julho de 2021, de modo que as eleições de 2022 já possam ocorrer com estes compromissos essenciais das emissoras e dos candidatos transformados em lei.

*Alencar Santana Braga é advogado e deputado federal (PT-SP), foi deputado estadual e vereador em Guarulhos, sempre pelo PT