Um ano de omissão, descaso e negacionismo: Brasil transformado em ameaça para o mundo

Artigo assinado por três ex-ministros da Saúde (Alexandre Padilha, Arthur Chioro e Humberto Costa) deixa o desastroso governo Bolsonaro nu e denuncia o genocídio decorrente do negacionismo do presidente

Foto: The Telengana Today/Reprodução
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Por Alexandre Padilha, Arthur Chioro e Humberto Costa *

Há um ano do registro da morte da primeira vítima da Covid-19, o Brasil vive, neste março de 2021, um déjà-vu piorado do que foi o ano de 2020. Diante do pior cenário da doença no país, com altas taxas de transmissão e recordes diários de óbitos – chegamos a 2.349 mortes em 24 horas – e vivemos o momento mais aterrorizador da pandemia.

Com desempenho desastroso, omisso, negacionista e insensível do governo Bolsonaro no combate à Covid-19, somos o epicentro da doença e passamos, no início do mês, os Estados Unidos, assumindo a liderança no mundo como o país que mais registra novos casos de coronavírus por dia.

Por incompetência do governo Bolsonaro, o Brasil é uma ameaça ao mundo, pária internacional, por ter se tornado terreno fértil ao surgimento de novas variantes do coronavírus que têm mostrado maior capacidade de transmissão e acometimento de jovens.

Somos reconhecidos mundialmente como fracasso na resposta à pandemia, na defesa da vida, na gestão da saúde e na negligência pela pífia cooperação internacional para compra de vacinas.

Não vivemos segunda ou terceira onda no país porque não houve sequer a estabilização da pandemia. Em 2020, ficamos por 14 semanas com mais de mil mortes diárias, tivemos redução, mas nunca estabilização. 

A perpetuação do negacionismo provocou, até agora, a perda de mais de 270 mil vidas e é impensável e inadmissível o Brasil, pelo tamanho do nosso sistema público de saúde, não ter um plano de vacinação consolidado e menos de 2% da população brasileira vacinada com duas doses há um ano da maior tragédia humana que o país já enfrentou, sendo agora o período de maior colapso do sistema público em todos os estados da federação. 

A ineficiência deste governo militarizou o Ministério da Saúde, não ofereceu testagem suficiente – e encalhou milhares de testes –, não priorizou a Atenção Básica, não repassou recursos para a manutenção de leitos de UTI, resultando no fechamento de 2/3 dos leitos de UTI para Covid-19 e apresentou um cronograma fictício de vacinação. Sequer garantiu insumos necessários para o enfretamento da pandemia. As mortes por falta de oxigênio expressam a dimensão mais cruel dessa irresponsável (des)coordenação do SUS.

Vencemos a pandemia da H1N1 em 2010, sendo o país que mais vacinou contra a doença por um sistema público de saúde no planeta. Foram mais de 100 milhões de vacinados, sendo 80 milhões em três meses. Isso aconteceu porque nos planejamos para uma campanha eficiente e porque éramos respeitados como atores globais no segmento da saúde, como um líder na garantia de acesso a medicamentos, vacinas e na transferência de tecnologia. 

No Brasil sem Bolsonaro, era possível termos iniciado a campanha de vacinação contra a Covid-19 em dezembro de 2020. O Brasil de Bolsonaro criou uma guerra xenofóbica ideológica com vacinas comprovadamente seguras e eficazes, produzidas em outros países, e recusou 70 milhões de doses da vacina da Pfizer.  Adquiriu o número mínimo de vacinas disponibilizados pelo Fundo da OMS/Unicef.

Além de não ser negacionista, para termos um plano de vacinação amplo e robusto era preciso ter priorizado ações de cooperação com outros países, ter boa parceria com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e com governadores e prefeitos. Mas não é o que Bolsonaro quer. 

Resultado: Brasil na rabeira da vacinação, não temos doses suficientes, não vamos conseguir vacinar toda a população apta antes do inverno e a pororoca da Covid-19 não terá fim. 

A luta social por vacina já para todos vem da sociedade, unida com o Congresso Nacional e com os governadores, para que Bolsonaro seja forçado a sancionar as leis que obriguem a compra de vacinas, acelere o processo de autorização para incorporação de vários imunizantes e que estados e municípios comprem doses quando o Ministério da Saúde não oferecer suficientes. Só assim podemos salvar vidas e recuperar a economia. 

Mas é preciso ressaltar que a falta de vacinas não é causa da tragédia. Ela é consequência da imensa incompetência de um governo inepto, cuja política de Estado em favor da propagação do vírus tem promovido um verdadeiro genocídio que precisa ser parado imediatamente.

*Alexandre Padilha, Arthur Chioro e Humberto Costa são ex-ministros da Saúde.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.