A jornalista e escritora Milly Lacombe deu uma aula sobre acolhimento na noite desta quinta-feira (16), em suas redes, a Anderson Farias (PSD), prefeito de São José dos Campos, que a tirou de um evento literário por uma suposta fala contra a família cristã.
Poucas semanas depois do veto à jornalista, o próprio prefeito se viu envolvido em um escândalo enorme. O gestor é acusado de violência doméstica pela esposa e primeira-dama, Sheila Thomaz, e também foi citado em um boletim de ocorrência registrado por uma servidora da prefeitura apontada como sua amante.
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Com uma fala ponderada e sem tom acusatório, Milly Lacombe começa: “eu sabia que um dia eu gravaria esse vídeo — só não achei que ia ser tão cedo.”
A seguir, a jornalista afirma: “vamos falar sobre o prefeito de São José dos Campos, que vetou a minha participação em uma recente feira literária e que agora está sendo acusado pela ex-mulher de violência de gênero. A amante também teria registrado um boletim de ocorrência.”
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“Parece moralismo, mas não é”
“Tudo isso importa. Parece moralismo, mas não é”, alerta. “Ele cancelou a minha participação dizendo que eu não respeitava os valores cristãos da família tradicional brasileira. Então, vamos lá, gente — sim, é a vida que se repete, né?”
Ela diz que tem lido tudo que é publicado sobre o assunto. “E, realmente, as histórias são medonhas, horrorosas. Por enquanto, estamos no âmbito da acusação, nada foi provado, mas ainda assim são denúncias muito sérias, que precisam ser investigadas. Envolvem violência contra a mulher, envolvem o fato de que ter uma amante já é algo que... eu não deveria estar rindo, porque é sério. É um assunto muito sério. Mas esse é o cara que disse que eu não respeito os valores cristãos da família”, lamenta.
Inclusão
“Eu gostaria muito, de verdade, de não estar certa. Gostaria de não precisar fazer esse vídeo”, ressalta. “O que eu mais queria era ter ido a São José dos Campos, participado da feira, dialogado com as pessoas da cidade, levado a minha pauta, a minha agenda — que é justamente a inclusão de pessoas marginalizadas e a defesa de um núcleo familiar que inclua, que seja inclusivo.”
E acrescenta: “imagina que lindo se eu tivesse podido ir até lá e estabelecer esse diálogo, até mesmo com ele. Um político que sabe o que é política teria me chamado pra conversar. A gente tem valores muito diferentes, mas vamos sentar numa mesa e ver o que é isso. Onde a gente pode encontrar um ponto em comum? Como a gente pode dialogar?”
“Mas, enfim, não é o momento que a gente está vivendo. Infelizmente, o fato é que eu estava certa”, lamenta. “Eu gostaria muito que a feira tivesse acontecido. Porque, quando editaram um vídeo meu falando sobre família, quando manipularam a minha imagem e fizeram circular dentro de uma rede muito óbvia, colocaram minha vida em risco. Eles colocaram em circulação uma ameaça, uma onda de raiva e ódio”, denuncia.
“E a feira deixou de acontecer. Vocês perderam meses de trabalho, pessoas com famílias perderam o fruto de meses de dedicação”, destaca.
Família e tabu
A seguir, ao invés de partir para o revanchismo, ela traz as atitudes do prefeito para dentro do seu discurso:
“A gente precisa, sim, tirar essa discussão sobre o que é família desse ambiente de tabu. A gente sabe quantas violências são praticadas dentro de um núcleo chamado de família. E precisamos discutir como fazer da família um lugar mais amoroso, afetuoso, que represente de fato os valores cristãos do respeito, da dignidade, da inclusão, do carinho, de todo mundo se ajudando pra crescer e ser alguém melhor.”
“Eu sabia que um dia eu ia gravar esse vídeo, porque esses julgamentos morais sempre — sempre — escondem alguma outra coisa”, insisti ela.
Acolhimento
E alerta: “se a gente for falar de família de uma maneira realmente cristã, a gente vai ter que falar de mães e filhas em situação de rua, de mães solo vivendo na precariedade, de famílias que colocam crianças LGBTQIA+ na rua.”
Ao final, ela destaca ser este “o debate honesto sobre família — e não impedir o diálogo, cancelar uma feira literária e, semanas depois, estar envolvido em um escândalo com amante, boletim de ocorrência e suspeita de violência de gênero”.
“Enfim, gente… é tudo muito lamentável. Eu só gostaria que a feira tivesse acontecido.
Eu só gostaria que a gente pudesse batalhar por núcleos familiares amorosos, inclusivos e baseados no respeito, sem hierarquias e sem a autoridade opressora que a gente vê hoje”, encerra.
Veja o vídeo abaixo: