Fraude: Comissão da UFRGS aponta que 239 cotistas raciais não são negros nem pardos

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A partir de denúncias de estudantes negros, uma comissão da Universidade Federal do Rio Grande do Sul constatou que ao menos 239 estudantes brancos fraudaram o sistema de cotas raciais Por Luis Eduardo Gomes, no Sul 21  A Comissão Especial de Verificação da Autodeclaração Racial da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), criada para avaliar denúncias de fraudes em cotas raciais, apontou que 239 alunos que ingressaram na universidade por meio de cotas raciais após se autodeclararam pardos não apresentaram as características fenotípicas para que fossem enquadrados como tal. Após uma série de denúncias, oriundas especialmente do coletivo de estudantes negros Balanta, a UFRGS anunciou em novembro que decidiu convocar 334 pessoas suspeitas de fraudar a política de cotas para comparecerem diante da comissão entre os dias 24 e 29 de novembro. De acordo com o presidente da comissão, Edilson Nabarro, que é vice-coordenador da Coordenadoria do Programa de Ações Afirmativas, órgão responsável pelo monitoramento da política de cotas na UFRGS, todos os 334 estudantes identificados como suspeitos foram notificados e houve confirmação de que 304 receberam a notificação. Desses, 274 compareceram diante da comissão, que fez uma análise silenciosa das características fenotípicas dos estudantes e considerou que 239 deles não tinham características que os permitia serem enquadrados como negros ou pardos. Ele explica que, no processo, todos os membros de uma comissão, formada por ao menos três pessoas, decidiram por consenso que o estudante não apresentava os marcadores fenotípicos do negro – para ele, o processo de negro – características como o tipo de cabelo, formato do nariz e lábios. Edilson diz que todos os estudantes que podem ter a matrícula indeferida se autodeclararam pardos quando participaram do processo seletivo. Os resultados da verificação pela comissão foram divulgados para os estudantes no período entre 4 e 6 de dezembro e agora eles terão até o próximo dia 20 para apresentarem recursos à universidade, que tomará uma decisão final até o dia 9 de janeiro. Os estudantes que não tiverem o recurso aceito, terão a próxima matrícula indeferida e passarão por um processo de desligamento da universidade. Os estudantes terão agora na fase de recursos a oportunidade de apresentarem todos os documentos e informações que acharem necessárias para subsidiar sua autodeclaração racial, incluindo fotos de parentes próximos. Contudo, Edilson destaca que, a princípio, a reversão da indicação da comissão será mais fácil de ser revertida em casos de descendência direta, como pai ou mãe, e não de ancestralidade mais distante, como avós e bisavós. “Porque não estão presentes os traços fenotípicos que podem levar uma pessoa a ser discriminada”, diz. Edilson destacou que há casos complexos que estão na “intersecção entre o negro pardo e o branco amorenado”, aqueles em que não estão muito acentuados os traços fenotípicos do negro e estão presentes traços do branco. “É o caso de um casamento inter-racial de um homem branco e uma mulher negra, ou vice-versa, que pode ter gerado um filho mais claro. A aferição foi solitária, nós não vimos família. A gente vai ver o contexto familiar no recurso”, diz Edilson. Ele afirma que esse é um ponto importante da política de cotas raciais, a questão da discriminação racial, que ocorreria no Brasil pelas características físicas, e que para os demais estudantes de baixa renda existem as cotas sociais. “Nós do movimento negro explicamos isso de uma maneira muito simplória: quem é a pessoa que o vigilante de um shopping center tem que ficar atenta?”, diz. “Tu já viu um torcedor racista pedir fotos ou documentos dos pais para chamar um jogador de macaco”. Tribunal racial? O presidente da comissão de verificação diz que a questão de fraudes passou a ser relevante com a legislação nacional sobre as cotas raciais, de 2012, que estabeleceu a possibilidade dos estudantes se autodeclararem pardos. “Aí trouxe a possibilidade do uso de má fé ou engano de enquadramento”, diz. Questionado se acha que os casos apontados pela comissão se tratam de má fé ou de engano por parte dos estudantes sobre o termo pardo, Edilson explica que, para a política de ação afirmativa, a categoria negro não é uma cor, mas sim uma categoria social, que inclui pretos ou pardos e que não existiria a figura do branco pardo. “Os negros podem ser pretos ou pardos. O que há é uma confusão de acharem que há uma dimensão de brancos pardos ou até loiros pardos, usando o argumento de afrodescendência”, diz. Uma das críticas ao processo realizado na UFRGS é que se trataria de um tribunal racial. Para Edilson, o fato de que 35 alunos tiveram a autodeclaração deferida afastaria essa presunção de que houve um tribunal racial. “A comissão não foi feita para excluir alunos, mas para ratificar ou retificar a declaração que eles fizeram”, diz.