Para ativista, pandemia só aumentou a invisibilidade das pessoas em situação de rua

“A realidade nacional é que população em situação de rua vive em extrema miséria e completo abandono”, diz Laureci Dias, a Laura, uma das coordenadoras do Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de Rua

Laureci Elias Dias, a Laura - Foto: Arquivo pessoal
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As recentes manifestações de descaso do poder público diante da trágica situação das pessoas em situação de rua provocaram revolta e indignação em quem já viu de perto as dificuldades de não ter onde morar.

Laureci Elias Dias, conhecida como Laura, superou uma história de 20 anos no crack e, hoje, é coordenadora do Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de Rua (MNLDPR), na Baixada Santista.

Ela relembra, com tristeza, dos exemplos recentes de desrespeito a essa população ocorrido na capital paulista e copiado em Santos, no litoral, onde reside com a mãe. As prefeituras de ambas as cidades colocaram pedras em baixo e viadutos para impedir que as pessoas em situação de rua dormissem no local.

“A realidade nacional é que população em situação de rua vive um cenário precário, de extrema miséria e de completo abandono. São invisíveis aos olhos de muitas pessoas, que se recusam a ver a desigualdade social no mundo”, relata Laura, que, após superar o vício, conheceu a militância, onde atua há um ano e meio.

“É preciso desenvolver mais políticas públicas para o segmento, como, por exemplo, criar cursos profissionalizantes para ajudar que essas pessoas sejam ressocializadas”, acredita ela.

Pandemia

Laura destaca que o panorama em relação a como vivem essas pessoas se agravou em consequência da pandemia do coronavírus.

“Os equipamentos destinados às pessoas em situação de rua oferecidos pelas prefeituras, como núcleos de convivência e outras iniciativas de proteção social, muitas vezes encontram dificuldades em atender essa população. Após a pandemia, se viram em situação ainda pior, por causa do isolamento social, ou seja, tiveram de afastar funcionários que pertencem aos grupos de risco ou os que contraíram a Covid-19”, ressalta.

Além disso, acrescenta ela, a necessidade da permanência em casa fez diminuir muito o número de pessoas que se dirigiam aos locais de acolhimento para doar alimentos, por exemplo.

Outro fator que associa a pandemia à piora no quadro das pessoas em situação de vulnerabilidade social é o aumento expressivo do desemprego em todo o país, aponta Laura. “Com isso, mais pessoas não encontraram outra alternativa a não ser morar na rua”.

Pedras no caminho

No início de fevereiro, a gestão do prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), instalou pedras na parte inferior de um viaduto na Zona Leste da capital. O objetivo era evitar que as pessoas em situação de rua dormissem no local.

A medida causou reação popular. Diante do silêncio de Covas em relação à repercussão negativa, o padre Julio Lancellotti, que há muitos anos desenvolve um importante trabalho social com essa população, empunhou uma marreta e foi retirar as pedras.

Padra Julio Lancellotti - Fotos: Reprodução

Sob o comando do prefeito Rogério Santos, também do PSDB, a cidade de Santos registrou o mesmo problema. A administração municipal colocou pedras sob o viaduto que se localiza na entrada da cidade.

Inspirado pela ação do padre Julio Lancellotti, um grupo de ativistas, entre eles Laura, foi ao local e, usou marretas e picaretas para quebrar as pedras.

“Nossa ação foi pacífica, um ato simbólico contra o higienismo social que, infelizmente, está acontecendo em toda parte do mundo”, diz Laura, que reconhece: “O padre Lancellotti foi inspiração”.

Foto da ação embaixo do viaduto na entrada de Santos - Foto: : Arquivo pessoal

Constituição

A coordenadora do MNLDPR diz que as ações do movimento se caracterizam pela luta pelos direitos de políticas públicas destinadas a esse segmento.

“Nossa principal atividade é discutir políticas para fazer com que se cumpra o que está na Constituição, para que a população de rua tenha os mesmos direitos de todos e seja tratada como qualquer cidadão. E, também, para se fazer cumprir o Decreto Federal nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009, que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua”, completa.