Projeto pede investigação de “autos de resistência seguida de morte”

Proposta pretende coibir abusos policiais que ocorrem em todo o Brasil

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Proposta pretende coibir abusos policiais que ocorrem em todo o Brasil Por Igor Carvalho O deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) protocolou na noite da última quarta-feira (19), na Câmara dos Deputados, um projeto de lei que pretende obrigar que sejam investigados casos de “resistência seguida de morte”, além de determinar outros procedimentos para o caso de mortes violentas envolvendo agentes do Estado. O projeto determina que, nos casos qualificados como "resistência", se do "emprego da força resultar ofensa à integridade corporal ou à vida do resistente, a autoridade policial competente deverá instaurar imediatamente inquérito para apurar esse fato, sem prejuízo de eventual prisão em flagrante". “Se não houver um controle, há a possibilidade de uma ação policial violenta, que é ilegal, e temos que agir aqui [Brasília], pois o número de mortes é altíssimo”, argumentou o parlamentar. “Esses autos acabam escondendo o uso excessivo da força policial”, garante. O PL prevê ainda que, após a instauração do inquérito, "será feita imediata comunicação ao Ministério Público e à Defensoria Pública, sem prejuízo do posterior envio de cópia do feito ao órgão correcional correspondente e, onde houver, à Ouvidoria, ou órgão de atribuições análogas". Os números de mortes pela ação da polícia em todo o Brasil são alarmantes. Em São Paulo, no primeiro semestre de 2012, 239 pessoas tiveram suas mortes justificadas por meio dos “autos de resistência seguida de morte”. A taxa de homicídios chega a 1,16 para cada 100 mil habitantes. Na Bahia, morreram, de janeiro a agosto, 267 pessoas em confronto com policiais, enquanto no Rio de Janeiro foram 214 assassinatos. O ouvidor geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Luiz Gonzaga Dantas, alega que a nova lei irá reafirmar, apenas, o que já está previsto, mas não é cumprido. “O ordenamento jurídico, nosso código penal, determina que qualquer morte violenta deva ser registrada como ‘homicídio’. Está lá, no artigo 121 [do Código Penal], isso deveria ser simples e investigado, mas não é assim que funciona.” Dantas vai além: para ele, seria necessário obrigar que todo socorro, em casos de suposto confronto entre civis e militares, com vítimas, seja prestado pelo SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência). “Temos registros de pessoas que são mortas no caminho para hospitais, dentro das viaturas, por tortura.” O ouvidor lembrou que o “papel da polícia é a prevenção ao crime, mas que alguns policiais têm agido em desacordo com esse princípio.” Na mesma linha do ouvidor está Daniela Skromov Albuquerque, defensora pública do Estado de São Paulo, que participou das discussões sobre a Lei e que também não é tão otimista quanto a sua eficácia. Ela acredita que a alteração legislativa não será suficiente. “É um projeto bem vindo, porém, não deve mudar esse cenário. Todo policial que se envolve em ‘evento morte’ deveria ser afastado do cargo. O problema vai além, ele é de ordem prática e ideológica, na atuação da polícia militar.” Como exemplo de sua preocupação, Skromov cita uma das infrações que é cometida de forma cotidiana. “O projeto pede a preservação da cena do crime, mas isso já é lei. No entanto, infringe-se, vivemos no país em que não se cumprem as leis, em que existe a cultura da ‘lei que pega’”, finalizou. Movimentos sociais comemoram Débora Maria Silva é fundadora do Mães de Maio, grupo criado em 2006 por parentes de jovens assassinados após ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC) de São Paulo. Em maio daquele ano, cerca de 492 jovens teriam sido executados em retaliação aos ataques da facção (leia mais aqui) e, desde então, o movimento luta pelo fim dos “autos de resistência seguida de morte”, que justificam a morte de 84 jovens naquele ano. Para Débora, esse projeto é um “embrião de vida". "Significa que muitas mães não vão perder os filhos assassinados nas periferias, significa que o Estado não vai mais produzir nossas lágrimas”, crê. Danilo César, militante do grupo, afirma que haverá cobrança. “Vamos acompanhar e estaremos atentos, a luta continua”, adverte. Outros pontos do projeto de lei: - É vedado o acompanhamento do exame de corpo de delito por pessoa estranha ao quadro de peritos e auxiliares; - Nos casos de morte violenta, será obrigatório exame interno, documentação fotográfica e coleta de vestígios encontrados durante o exame necroscópico; - O exame interno sempre será realizado nos casos de morte violenta ocorrida em ações com envolvimento de agentes do Estado; - É vedado o acompanhamento da autópsia por pessoa estranha ao quadro de peritos e auxiliares, exceto se indicados por representantes da vítima; - Os cadáveres serão sempre fotografados na posição em que forem encontrados, bem como todas as lesões externas e vestígios deixados no local do crime; - Para o efeito de exame do local onde houver sido praticada a infração, a autoridade providenciará imediatamente para que não se altere o estado das coisas até a chegada dos peritos, que deverão instruir seus laudos com fotografias, desenhos ou esquemas elucidativos (Foto: http://www.flickr.com/photos/leasepics/)