Secretaria de Segurança de SP se cala sobre denúncia de tortura da PM contra motoboy: "Corregedoria à disposição"

Procurada pela Fórum, SSP se omitiu sobre as denúncias de que um motoboy, após sofrer abordagem violenta, teria sido torturado e ameaçado de morte por policiais; para advogado, resposta vaga da pasta visa "acobertamento" de mais um caso de violência" e governador João Doria estimula esse tipo de ação

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A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP) decidiu se omitir quanto com relação às denúncias de um entregador de aplicativos de que ele teria sido torturado por policiais militares.

Nesta terça-feira (14), um motoboy de 23 anos sofreu uma abordagem violenta da Polícia Militar na avenida Rebouças, zona oeste da capital paulista, em que foi sufocado pelos agentes, enquanto gritava "não consigo respirar". Ele participava de uma manifestação de entregadores por melhores condições de trabalho e, segundo a SSP, foi abordado por estar com a placa da motocicleta encoberta e teve que ser contido por oferecer resistência.

O entregador, após as cenas de violência registradas em vídeos, foi detido, encaminhado para o 14º DP, onde assinou um termo circunstanciado, e sua moto foi apreendida. Já depois de liberado, o motoboy, aos prantos, gravou um vídeo denunciando que teria levado choques elétricos dos policiais, já dentro da viatura, e também que teria sido ameaçado de morte pelos agentes. Confira os vídeos das denúncias aqui.

Fórum procurou a SSP para obter um posicionamento sobre as denúncias do motoboy de que ele teria sofrido tortura, mas a pasta se limitou a dizer que "a Corregedoria da PM está à disposição para registrar e apurar qualquer denúncia contra seus agentes".

No restante da nota, a secretaria informou apenas que o motociclista ofereceu resistência a abordagem e que "foi constatado que ele está com a habilitação vencida desde 2019", explicando que ele foi encaminhado à DP, a moto apreendida e que foi solicitado exames de corpo de delito ao rapaz e aos policiais envolvidos, sem mencionar qualquer ação quanto às denúncias de violência já após a detenção do entregador.

Para o advogado Ariel de Castro Alves, que é especialista em políticas de direitos humanos e segurança pública pela PUC- SP, a resposta da secretaria de Segurança Pública sobre as denúncias é "meramente burocrática e corporativista, visando o acobertamento de mais esse caso de violência polícia".

"Sequer anunciam a instauração de sindicância ou Inquérito Policial Militar (IMP). Praticamente dizem que o fato do rapaz estar com a moto na calçada e com documentação do veículo supostamente irregular, seria motivo suficiente para os abusos e uso excessivo da força", afirmou o advogado, que também é conselheiro do Condepe-SP (Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana), em entrevista à Fórum.

Ariel apontou ainda que, caso as denúncias do entregador sejam confirmadas, os agentes podem ser enquadrados por crime de tortura, conforme previsto na Lei 9.455 de 1997, que diz em seu artigo primeiro que é crime "submeter alguém, sob guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo", com pena de dois a oito anos de prisão.

Política de Estado

O novo caso de violência policial desta terça-feira acontece na mesma semana em que veio à tona o caso de uma mulher negra que teve uma perna quebrada e o pescoço pisoteado por um policial militar durante uma abordagem. Isso sem falar os inúmeros episódios de abusos de agentes do Estado nas periferias que não viram notícia.

De acordo com o advogado Ariel de Castro Alves, essa postura da PM faz parte de uma "política de Estado", que é incentivada pelo governador João Doria (PSDB) desde sua campanha na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes.

"Faz parte de uma política de estado. PMs são treinados para isso, para a prática de violência. E são acobertados por suas corporações, com a conivência e omissão de órgãos de controle e fiscalização. O governador João Doria desde a campanha estimulou a violência policial, afirmando que a polícia estaria autorizada para matar suspeitos e que contrataria os melhores advogados para a defesa dos policiais acusados de excessos e assassinatos", declarou.

Bolsonaro

Ariel explicou, ainda, que a escalada de violência policial Brasil afora tem influência direta do presidente Jair Bolsonaro. "A escalada de violência policial certamente é impulsionada pelos discursos e projetos do presidente Jair Bolsonaro, que propôs a ampliação das chamadas excludentes de ilicitudes para favorecer policiais que cometem abusos e assassinatos, além dos discursos de governadores como João Doria e Wilson Witzel. Doria até condecorou PMs envolvidos numa ocorrência com várias mortes em Guararema no ano passado", pontuou.

Segundo o advogado, "os policiais nunca se sentiram tão respaldados pelos governos, promotorias, parlamentares e judiciário para cometerem abusos".

"Por isso tudo é fundamental tratarmos da desmilitarização das polícias. Medida necessária urgentemente! Os celulares viraram as únicas armas das comunidades contra a crescente violência policial", opinou Ariel, que atual com casos de violência policial desde 1997 e faz parte do Grupo Tortura Nunca Mais.