ATIVISMO

Técnico Roger Machado diz que racistas se sentem “autorizados” por Bolsonaro

“A representatividade da população negra em outras áreas é muito parecida com a do futebol”, aponta o treinador, hoje no Grêmio

Roger: "cultura de ódio com muito mais força nos últimos quatro anos".Créditos: Lucas Uebel/Grêmio FBPA/Divulgação/JC
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Um dos poucos técnicos negros que atuam na elite do futebol brasileiro, o ex-jogador Roger Machado, de 47 anos, atualmente no comando do Grêmio (RS), afirmou que as declarações e a conduta de Jair Bolsonaro (PL) estimulam o racismo.

“Os indivíduos racistas que estavam escondidos porque a sociedade os reprimia se sentem autorizados a se manifestar, segundo as posturas e pontos de vista do líder da nação, porque estes são convergentes. Temos que resistir, porque sua intenção é que retrocedamos, e isso não podemos permitir”, afirmou Roger, em entrevista a Rodrigo Almonacid, na Folha de S.Paulo.

Roger tem uma teoria sobre por que existem tão poucos técnicos negros no Brasil. “O futebol revela o que somos como sociedade. A representatividade da população negra em outras áreas é muito parecida com a do futebol. Quando negros e brancos decidem ascender na pirâmide social, os filtros começam a aparecer. São os filtros da ideologia que criou o racismo e que atribui ao negro uma condição de menor inteligência, menor capacidade de liderança e gestão, justamente as competências de um treinador de futebol”.

Ele mencionou o que ocorreu com ele no início de sua carreira. “Nos meus primeiros trabalhos como treinador, muitas vezes, quando era demitido, questionavam a minha capacidade de gerir grupos, sendo que essa era uma das grandes capacidades que eu sempre tive como jogador, como liderança, como capitão”, disse.

Em relação ao avanço de manifestações racistas em estádios brasileiras, Roger avaliou que “aumentam da mesma forma que os atos discriminatórios na sociedade. Os que acreditam estar perdendo parte de seus privilégios nessa rede que o racismo construiu durante 500 anos reagem de forma mais agressiva. É um processo relacionado com uma cultura de ódio que vivemos com muito mais força nos últimos quatro anos no Brasil. Mas não é uma situação regional, é global”.

Nível de escolaridade baixo impacta na consciência e na construção ideológica

Questionado se jogadores e outros técnicos deveriam se posicionar com mais veemência, ele respondeu: “Como atletas somos treinados para não sairmos do campo. Há muitas formas diferentes de se manifestar. A questão é que a maioria de nós, lamentavelmente, tem um nível de escolaridade mais baixo porque o país não privilegiou nossa educação plena. Isso também impacta na nossa consciência em nossa construção ideológica para debater esses assuntos”.

Roger Machado tem passagens por vários times considerados grandes do futebol brasileiro, como Palmeiras, Fluminense e Atlético-MG.