DECLÍNIO DO IMPÉRIO?

Como o governo Trump pode acabar (sem querer) com o domínio do dólar no mundo

Políticas econômicas e tarifárias do "America First" podem ser um tiro no pé por parte do presidente eleito

Donald Trump pode conseguir o que ele não quer: acelerar o declínio da hegemonia do dólar no planetaCréditos: Gage Skidmore de Peoria/Wikimedia Commons
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No final de novembro, o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, ameaçou as nações integrantes do Brics afirmando que iria impor tarifas de 100% aos produtos destes países se eles passassem a usar uma nova moeda, rompendo com a hegemonia do dólar.

“Pedimos que vocês se comprometam a nunca criar uma nova moeda do Brics e a não apoiar nenhuma outra moeda para substituir o poderoso dólar americano, ou enfrentarão tarifas de 100% ”, escreveu Trump em sua rede social.

Dias depois, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, respondeu ao bilionário. “Como uma importante plataforma de cooperação para os mercados emergentes e os países em desenvolvimento, o BRICS defende a abertura, a inclusão e a cooperação ganha-ganha, não o confronto em bloco, e não tem como alvo nenhum terceiro. O objetivo é realizar o desenvolvimento e a prosperidade comuns.”

O fato é que o dólar como moeda utilizada nas transações globais é um dos pilares da economia estadunidense, não se trata apenas de uma questão de "orgulho patriótico" de Trump ou algo similar. Em artigo no The Conversation, o professor de Finanças da Universidade de Stirling, no Reino Unido, David McMillan, explica que isto traz benefícios particulares para os EUA, "pois outros países precisam manter dólares americanos para facilitar o comércio e pagar por muitas commodities. Isso significa que a demanda pelo dólar americano permanece alta, então ele não sofre pressão para depreciar".

"Um ponto mais importante talvez é que, quando os países compram dólares americanos, eles não os mantêm em dinheiro. Em vez disso, eles compram letras do Tesouro dos Estados Unidos e, assim, na verdade, emprestam dinheiro ao governo dos EUA. Essa alta demanda por títulos do Tesouro estadunidenses significa que o governo dos EUA é capaz de tomar emprestado a uma taxa mais barata do que seria possível de outra forma", explica ele.

Como Trump pode enfraquecer o papel do dólar no mercado global?

Por outro lado, o dólar americano forte acaba aumentando o preço das commodities precificadas em dólar e, para os EUA, isso pode prejudicar seus negócios de exportação. O Brasil já viveu isso em momentos de real sobrevalorizado, por exemplo.

E o presidente eleito promete elevar tarifas de importação. E não só contra o Brics, mas contra a China, México, Canadá... Uma política protecionista serviria para fortalecer ainda mais o dólar americano, já que menos importações significarão menos dólares americanos sendo vendidos no mercado de câmbio.

Além disso, as políticas econômicas do republicano devem aumentar a dívida do país. O professor cita um estudo apontando que os planos de Trump podem adicionar até US$ 15 trilhões ao montante que os Estados Unidos devem ao longo de uma década. Uma queda no valor das reservas de dólares dos EUA pode resultar em algumas nações menos dispostas a manter dívida do país.

Segundo McMillan, os países poderiam concordar em usar alternativas como moeda de reserva e um meio de pagar por commodities internacionais, para fugir do custo elevado do dólar.

Os impactos para os EUA e o mundo

Com este cenário, os países precisariam então reter menos dólares americanos e venderiam seus títulos do Tesouro estadunidense. "O resultado será um aumento no custo da dívida para os EUA e uma queda no valor do dólar americano. Ironicamente, isso aumentaria o preço das importações (o objetivo da política tarifária de Trump), mas também poderia levar à inflação", aponta o professor.

"No pior cenário, se os países coordenassem suas vendas de dólares americanos e Treasuries, uma corrida ao dólar americano teria grandes implicações para os EUA e o mundo. Isso levaria a maiores custos de dívida nos Estados Unidos e à necessidade de reduzir seu déficit comercial", diz ele.

Assim, a política 'America First' de Trump "pode levar ao seu rebaixamento de ser a única moeda mundial", aponta McMillan. 

 

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