GUERRA

Sem citar Venezuela, Trump diz que fará ações terrestres contra cartéis

O presidente dos EUA não deu detalhes sobre como será a operação, mas descartou pedir autorização do Congresso

Sem citar Venezuela, Trump diz que fará ações terrestres contra cartéis.Créditos: Kamil Krzaczynski e Federico PARRA / AFP
Escrito en GLOBAL el

O presidente dos EUA, Donald Trump, revelou nesta quinta-feira (23), durante coletiva de imprensa na Casa Branca, que pretende realizar operações terrestres contra os cartéis de drogas na América Latina.

Trump não citou o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, mas nas últimas semanas uma série de ações foram registradas na costa venezuelana. O presidente norte-americano acusa Maduro de ter ligações com o narcotráfico.

Além disso, Trump afirmou que não pretende pedir uma declaração formal de guerra contra os cartéis e que, portanto, não vai requisitar autorização ao Congresso para algumas medidas.

“Bem, não acho que vamos necessariamente pedir uma declaração de guerra. Acho que vamos apenas matar as pessoas que estão trazendo drogas para o nosso país. Certo? Vamos matá-las”, disse Trump.

Em outro momento da coletiva, Trump afirmou que a ofensiva dos EUA no mar empurrará os traficantes para a terra e que, nesse caso, ações terrestres serão realizadas — e que, neste cenário, deverá informar o Congresso.

“Vamos atingi-los muito forte quando eles vierem por terra. E provavelmente iremos ao Congresso e explicaremos exatamente o que estamos fazendo, quando chegarmos por terra”, declarou o presidente dos EUA.

Em escalada autoritária, EUA explodem barco no Pacífico pela 1ª vez
 

Pela primeira vez desde o início de sua ofensiva “contra o narcotráfico”, o governo dos EUA estendeu seus bombardeios a alvos no Oceano Pacífico, destruindo uma embarcação que navegava próximo à costa sul-americana. O incidente ocorreu na noite de terça-feira (21) e foi oficialmente confirmado pelo secretário de Guerra, Pete Hegseth, nesta quarta-feira (22).

De acordo com Hegseth, o ataque resultou na morte de duas pessoas a bordo. “Havia dois narcoterroristas a bordo no momento do ataque, que foi realizado em águas internacionais. Ambos os terroristas foram mortos e nenhuma força norte-americana foi ferida nesse ataque”, declarou o secretário em postagem em rede social. A localização precisa da operação não foi revelada pelas autoridades norte-americanas.

Essa ação marca uma expansão preocupante da estratégia adotada pelo presidente Donald Trump, que até o momento se limitava a ataques no Caribe. Em pouco mais de um mês, a operação já registrou pelo menos sete bombardeios naquela região, elevando as tensões diplomáticas com países vizinhos como Venezuela e Colômbia. No total, os incidentes no Caribe deixaram ao menos 32 mortos, sem que o governo fornecesse detalhes sobre as quantidades de drogas apreendidas ou as provas concretas de envolvimento das embarcações no tráfico.

Especialistas em direito internacional apontam que tais intervenções em alto-mar, sem coordenação prévia com nações soberanas, configuram ações absolutamente ilegais e arbitrárias. Nenhum país, por mais poderosa que seja sua marinha, possui autoridade para lançar mísseis letais em águas internacionais sem o aval de instâncias multilaterais, o que compromete o equilíbrio das relações globais e ignora tratados marítimos estabelecidos há décadas.

A presença militar norte-americana na área foi intensificada recentemente, com o envio de destróieres equipados com mísseis guiados, caças F-35, um submarino nuclear e cerca de 6,5 mil tropas ao Caribe. Questionamentos crescem sobre a escolha das Forças Armadas para essas missões, em vez da Guarda Costeira, agência tradicionalmente responsável pela fiscalização marítima. Analistas também cobram por que opções não letais, como interceptações rotineiras, não foram priorizadas antes de recorrer à força extrema.

Um exemplo recente ilustra as inconsistências: na semana passada, dois suspeitos de tráfico sobreviveram a um bombardeio no Caribe, foram resgatados por um navio de guerra dos EUA e repatriados para Colômbia e Equador. Em contraste, a Guarda Costeira, por meio da Operação Víbora lançada em agosto, no Pacífico, conseguiu apreender mais de 45 toneladas de cocaína até 15 de outubro – tudo sem disparar um único tiro.

Diante dessa escalada, observadores internacionais alertam para os riscos de uma doutrina que prioriza a destruição imediata sobre a cooperação regional, transformando o combate ao crime organizado em pretexto para projeções de poder unilateral.

Veja o vídeo do ataque ao barco:

Venezuela oferece apoio à Colômbia em caso de guerra com EUA

Prevendo que será o próximo sancionado pelos Estados Unidos como "narcotraficante", o presidente da Colômbia Gustavo Petro denunciou a presença naval de Washington no Caribe, que já causou a morte de ao menos 27 pessoas.

Ele atribuiu a um senador dos Estados Unidos, Bernie Moreno, nascido na Colômbia, a campanha que os EUA movem contra seu país.

Foi por causa das críticas de Petro que Donald Trump se referiu a ele recentemente como "traficante".

"No desastre de política antinarcóticos que matou 27 pessoas no Caribe, toda gente pobre que, levando ou não levando cocaína, foi assassinada por mísseis, ganhou ares de ameaça a invasão militar da Colômbia e da Venezuela, o que vai me trazer sanções pessoais, como se eu fosse o chefe do narcotráfico no mundo, quando apenas tenho uma casa pela qual ainda devo ao banco, que vale menos da metade de uma sala de um dos apartamentos dos edifícios que são propriedade de Trump", escreveu Petro em uma longa postagem.

O secretário de Defesa dos EUA, Peter Hegseth, tem divulgado com destaque os ataques aéreos contra barcos, sem apresentar provas de que de fato serviam ao narcotráfico.

Um repórter da emissora pública dos EUA, PBS, foi a Trinidad e Tobago entrevistar pescadores. Um dos entrevistados, Renute Roberts, diz que ouve o barulho de drones durante a pesca noturna e rapidamente volta para casa. De acordo com os relatos ouvidos pelo repórter:

Eles sabem como são os barcos de drogas. E ele diz que alguns dos vídeos divulgados pelos EUA sobre os ataques não se parecem com barcos de drogas. Ele diz que esses barcos não transportam mais de três pessoas. Eles têm motores maiores. E ele diz que o que o assusta é que às vezes eles fazem viagens com remédios, alimentos e produtos de higiene para a Venezuela. E quando você embala tudo isso, os pacotes podem parecer drogas.

Protesto nas ruas

Petro convocou os colombianos para uma grande manifestação na sexta-feira, 24, na Praça Bolívar, em Bogotá, em defesa da soberania da Colômbia.

Ele sugeriu que os verdadeiros narcotraficantes estão instalados na Flórida há 25 anos e se juntaram a Trump na campanha de ataques ao governo atual.

Desde Caracas, o chefe das Forças Armadas, general Vladimir Padrino López, disse que a Colômbia pode contar com apoio militar da Venezuela em caso de conflito.

Padrino chamou de "rude, bizarra e sem sentido" a suposta estratégia estadunidense de combater o narcotráfico explodindo barcos no Caribe.

"Quem não se ajoelha ou abaixa a cabeça corre o risco de ser marcado como narcotraficante", afirmou o general, que na mesma linha de Petro disse que os EUA querem controle dos recursos naturais da região.

Venezuela e Colômbia possuem as maiores reservas de petróleo próximas dos Estados Unidos.

Nicolás Maduro é acusado por Washington de liderar um certo Cartel dos Sóis, que teria se associado às colombianas FARC para traficar cocaína. Uma recompensa de U$ 50 milhões é oferecida por ele.

Em recente entrevista à Russia Today, Petro disse que a guerra contra as drogas dos EUA é uma farsa:

Eles [os EUA] respeitam o capital dos traficantes. Permitem que eles possuam propriedades nos EUA. Eles nunca foram atrás do capital transnacional dos narcos.

Rubio e o tráfico

Curiosamente, quem hoje lidera a política linha dura contra Maduro e Petro é Marco Rubio, cujo cunhado foi preso por tráfico de drogas.

Antes da posse de Donald Trump em seu primeiro mandato, o Washington Post fez uma série de reportagens sobre Orlando Cicilia. Nos anos 70 e 80 do século passado, Cicilia, casado com a irmã do hoje secretário de Estado, traficava diretamente da casa da família na Flórida, que era frequentada pelo jovem Rubio.

Cicilia eventualmente foi preso e cumpriu quase 12 anos de uma pena de 35. Ao sair, ele decidiu trabalhar no mercado imobiliário, mas encontrou dificuldades para obter a certificação. Recorreu ao então líder dos republicanos no equivalente à Assembleia Legislativa da Flórida, Marco Rubio, que escreveu uma carta de recomendação para Cicilio sem revelar que tinham ligações familiares.

Reporte Error
Comunicar erro Encontrou um erro na matéria? Ajude-nos a melhorar