CHINA EM FOCO

Muros e barreiras de Trump isolam os EUA e fortalecem a China

Segundo revista britânica The Economist, guerra comercial lançada por Washington não conseguiu conter a máquina exportadora chinesa, que se diversificou e se reinventou

Muros e barreiras de Trump isolam os EUA e fortalecem a China.Segundo revista britânica The Economist, guerra comercial lançada por Washington não conseguiu conter a máquina exportadora chinesa, que se diversificou e se reinventouCréditos: Xinhua
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Desde que Donald Trump retornou à Casa Branca, a China se tornou o principal alvo da nova rodada de tarifas impostas por Washington, que inclui sobretaxas ligadas ao fentanil e pressões sobre parceiros internacionais para bloquear insumos chineses. Apesar da ofensiva, Pequim manteve sua máquina exportadora em funcionamento ao apostar em diversificação de mercados e adaptação das cadeias produtivas.

O diagnóstico é da revista britânica The Economist — considerada a “bíblia” do liberalismo econômico — em artigo publicado no último dia 9. A publicação mostra que, embora as exportações para os Estados Unidos tenham recuado 25% entre junho e agosto de 2025, o comércio total da China cresceu 6% no mesmo período.

Esse crescimento foi puxado sobretudo por novos destinos: as vendas para a África aumentaram um terço, para a ASEAN subiram 20% e para a União Europeia quase 10%. Hoje, o bloco europeu já absorve mais de 60% de mercadorias chinesas a mais do que os Estados Unidos.

Pequim reafirma compromisso com abertura e rejeita protecionismo

Durante coletiva de imprensa do Ministério das Relações Exteriores da China realizada nesta quarta-feira (17), o porta-voz Lin Jian reforçou a análise publicada pela The Economist e sublinhou que, mesmo diante de um ambiente externo complexo e instável, o comércio exterior chinês manteve crescimento estável, sustentado por maior resiliência e vitalidade.

Segundo ele, nos primeiros oito meses de 2025, o comércio total de bens da China registrou alta de 3,5% em relação ao ano anterior. Nesse período, a ASEAN e a União Europeia se consolidaram como os dois principais parceiros comerciais de Pequim. Já as transações com países da Nova Rota da Seda avançaram 5,4%.

“Construir muros e barreiras acabará por aprisionar a si mesmo. Removê-los e abrir caminhos leva ao ganha-ganha”, resumiu Lin Jian.

O porta-voz ressaltou ainda que a guerra tarifária e a guerra comercial não alteram as vantagens comparativas conquistadas pelo setor manufatureiro chinês, tampouco afetam a popularidade global dos produtos chineses de alta qualidade ou revertem a tendência internacional de apoiar a liberalização e a facilitação do comércio.

“Junto com o mundo, a China permanecerá comprometida com o desenvolvimento aberto, promoverá uma economia mundial aberta, rejeitará todas as formas de protecionismo e compartilhará oportunidades e prosperidade por meio de uma abertura de alto padrão”, concluiu.

Trump mira a China, Xi amplia alianças

Desde que voltou à presidência dos Estados Unidos, Trump elegeu a China como seu principal alvo. Em discursos, ele acusa o país asiático de “enganar” os estadunidenses e até criou novos apelidos para atacá-lo, como “a China mais profunda e sombria”.

Essas falas vieram acompanhadas de medidas práticas, como a elevação de tarifas sobre produtos chineses. Além disso, pressionou a União Europeia a reduzir o uso de metais vindos da China em suas indústrias. Embora muitas ações de sua política externa pareçam desconexas, a tentativa de isolar Pequim segue um raciocínio claro.

Do outro lado, o presidente chinês, Xi Jinping, respondeu com tarifas próprias e passou a estreitar relações com outras regiões do mundo, como União Europeia, Índia, Malásia e Vietnã. O gesto mais simbólico aconteceu em 1º de setembro, durante uma reunião da Organização de Cooperação de Xangai, quando Xi apresentou a China como uma alternativa à liderança americana e pediu aos países que rejeitassem a “mentalidade da Guerra Fria” e a intimidação internacional.

Dados mostram efeito limitado das tarifas

Poucos meses após o “Dia da Libertação” proclamado por Trump, os dados da alfândega chinesa, divulgados em 8 de setembro, mostram que, apesar da queda de 25% nas exportações para os EUA, o comércio chinês como um todo se expandiu. Entre junho e agosto, os embarques subiram 6% em relação ao ano anterior, com destaque para a África, ASEAN e Europa.

Grande parte desse dinamismo vem da Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI), que bateu recorde no primeiro semestre de 2025, com mais de US$ 120 bilhões em novos contratos e investimentos — metade deles na África. Esse impulso favoreceu países como Nigéria, que viu as importações da China crescerem mais de 50% em três meses, puxadas por obras ferroviárias e de energia. Egito, Quênia e África do Sul também ampliaram vínculos financeiros com Pequim, incluindo novos acordos de swap cambial.

Ao mesmo tempo, a China reforça seu papel nas cadeias regionais de suprimentos. Entre junho e agosto, as exportações para Tailândia e Vietnã cresceram 25%, com forte avanço em eletrônicos e máquinas. Além de antecipar tarifas, Pequim transfere parte da produção para dentro da ASEAN — Indonésia, Malásia e Vietnã — a fim de atender às regras de origem e manter suas empresas no centro do comércio global.

A exceção está no México, onde as importações de produtos chineses caíram 6% entre maio e julho. Em 4 de setembro, a presidente Claudia Sheinbaum anunciou novas tarifas sobre carros, têxteis e plásticos vindos da China, numa tentativa de proteger a indústria local e atender às pressões de Trump por uma “Fortaleza América do Norte”.

A história, porém, oferece um alerta. No século XV, a dinastia Ming ergueu a Grande Muralha e restringiu o comércio exterior, o que enfraqueceu o país e acelerou seu declínio. Ao repetir essa lógica de isolamento, os Estados Unidos correm o risco de reproduzir o mesmo erro — como os dados comerciais já sugerem. 

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