Venezuela: “Um golpe contínuo”

“Os inimigos externos do chavismo e a oposição interna ainda seguem sem decifrar o caminho para derrubar violentamente o governo, tampouco através de vias eleitorais”, diz o jornalista venezuelano Ernesto J. Navarro

Foto: Telesur/Governo da Venezuela
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Por Ernesto J. Navarro* e tradução de Vinicius Sartorato** 1º de maio de 2019 era o dia definitivo. Isso foi anunciado pela oposição venezuelana. “Convocamos todas as pessoas para a maior marcha da história da Venezuela”, escreveu o deputado Juan Guiadó em sua conta no Twitter, de acordo com relatos da mídia local. Mas isso não aconteceu. Na véspera da marcha (30 de abril), Guaidó madrugou, postando um vídeo em redes sociais com seu chefe político, Leopoldo Lopez (que havia fugido de sua prisão domiciliar) e um punhado de soldados. A mensagem gravada clamava uma revolta popular contra as Forças Armadas Nacionais Bolivarianas para mudar drasticamente o governo de Nicolás Maduro. Mas isso também não aconteceu. As autoridades qualificaram o chamado de Guaidó e seu “Exército de Brancaleone” como uma tentativa de golpe de Estado. Então, Jorge Rodriguez, o ministro de Comunicação e Informação, informou ao país que “estamos enfrentando um pequeno grupo de tropas traidoras que foram posicionadas para promover um golpe contra a Constituição e Paz da República”. Imediatamente depois, ele convocou o povo a ficar em alerta máximo, juntamente com as Forças Armadas Nacionais Bolivarianas, para derrotar a tentativa de golpe e preservar a paz. Para Caracas, não há dúvida, essa seria outra das ações contra o governo que se classifica como um “golpe contínuo”. Existe um “golpe contínuo”? Os defensores do governo bolivariano asseguram que, desde o golpe de Estado contra Hugo Chávez (abril de 2002), a oposição não desistiu de tirá-los violentamente do poder, sendo o mesmo golpe em vários aspectos. Após as tentativas de 2002 e 2003, guarimbas (protestos violentos) e até mesmo uma tentativa de assassinato contra Maduro, “a continuação do golpe na Venezuela veio (agora) na forma de uma guerra econômica”, diz a Telesur. “O objetivo, mais uma vez, era desestabilizar o país com um ataque ao bolso do venezuelano”, acrescenta o texto da rede de televisão. Para o acadêmico Luis Salas, não há dúvida sobre a existência de um golpe contínuo ou continuado, que tomou o caminho econômico. Salas, que é um pesquisador associado do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (CLACSO), disse que após o “choque” que significou a morte do comandante Hugo Chávez, uma série de ataques especulativos foram feitos contra a economia venezuelana, o que gerou a situação crise atual. No entanto, como um golpe programático. Mesmo que eles não consigam derrubar o governo, forçam a mudar o programa de alguma forma. “É cada vez mais claro que as tentativas de golpe contra Chávez foram destinadas a mudar a agenda do governo e não para removê-lo do poder. Agora, basta saber se um programa vai impedir um golpe clássico”, pergunta Luis Salas. Um golpe clássico? O jornalista argentino e correspondente Marcos Salgado ressalta que, sem querer exercer truque é fácil ver que a oposição, em quase vinte anos, não conseguiu gerar uma ruptura das Forças Armadas, por isso não ocorreu um golpe clássico na Venezuela. Erro constante Os inimigos externos do chavismo e a oposição interna ainda seguem sem decifrar o caminho para derrubar violentamente o governo, tampouco através de vias eleitorais. Durante a transmissão de seu programa, o jornalista Pedro Brieger, diretor do site Nodal, comentou a validade do movimento político promovido por Hugo Chávez. “O chavismo é um movimento popular que, apesar de todas as dificuldades, ainda tem uma gigantesca capacidade de mobilização, e que a oposição nega, não quer vê-lo, cobre seus olhos”. Marcos Salgado, que foi correspondente em vários países da América Latina, tem uma avaliação semelhante. “Há um elemento que não poderia deixar de lado e é um grande erro da oposição venezuelana: ignorar e menosprezar o chavismo, pois acreditam que não há força que apoie Nicolas Maduro. Além disso, o chavismo vai além do governo”. Falando sobre a atual crise econômica da Venezuela e as suas repercussões políticas, Salgado argumenta que “a oposição não tem conhecimento da existência de Chávez como uma força política e social”, e por isso, eles acreditam que um golpe de Estado, poderia funcionar. “Eles ainda acreditam na história de que Maduro não tem nenhum tipo de apoio e isso também não é verdade”, diz Salgado.. *Ernesto J. Navarro (@ernestojnavarro) é um jornalista venezuelano residente em Caracas. Ganhador do Prêmio Nacional de Jornalismo Simón Bolívar 2015. **Vinicius Sartorato (@vinisartorato) é jornalista e sociólogo. Mestre em Políticas de Trabalho e Globalização pela Universidade de Kassel (Alemanha) e colunista da Fórum.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.

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