Em 1961, três meses após o início do julgamento do criminoso de guerra nazista Adolf Eichmann, o psicólogo Stanley Milgram iniciou na Universidade de Yale um dos experimentos mais controversos e emblemáticos da psicologia social.
Seu objetivo era investigar até que ponto pessoas comuns seriam capazes de infligir dor a outras sob ordens de uma figura de autoridade.
Te podría interesar
Os resultados, publicados em 1963 no Journal of Abnormal and Social Psychology, chocaram o mundo: 65% dos participantes (dois terços) obedeceram até o fim, aplicando choques elétricos de 450 volts — nível classificado como "choque grave" — em um "aluno" que supostamente gritava de dor.
Contexto histórico: da barbárie ao laboratório
Milgram buscava entender como indivíduos aparentemente normais, como os alemães durante o Holocausto, poderiam cometer atrocidades sob ordens superiores.
Te podría interesar
Em suas palavras, o experimento foi projetado para testar quanta dor um cidadão comum estaria disposto a infligir a outra pessoa somente por um simples cientista ter dado a ordem.
A motivação era clara: após a Segunda Guerra Mundial, a sociedade questionava como o regime nazista conseguiu mobilizar tantos cúmplices para crimes contra a humanidade, como o Holocausto.
O experimento ganhou relevância não apenas acadêmica — rendendo a Milgram um prêmio da American Association for the Advancement of Science em 1964 —, mas também midiática, especialmente por coincidir com o julgamento de Eichmann, cuja defesa alegava que ele apenas cumpria ordens.
Como era o experimento de Milgram?
Recrutados através de um anúncio, 40 homens entre 20 e 50 anos, de diversas profissões, receberam US$ 4,50 (algo como 50 dólares na cotação atual) para participar de um suposto "estudo sobre memória". Na realidade, eram parte de uma encenação cuidadosamente planejada.
Em uma sala, o participante assumia o papel de "professor", enquanto um ator — apresentado como outro voluntário — interpretava o "aluno".
Após um sorteio manipulado, o aluno era amarrado a uma cadeira com eletrodos. O professor tinha a tarefa de testar sua memória: a cada erro, deveria administrar um choque elétrico, aumentando a voltagem gradualmente (de 15 a 450 volts). O gerador de choques exibia labels como "choque leve" (15V) até "perigo: choque severo" (450V).
Na sala ao lado, o aluno (o ator) gritava de dor conforme a voltagem subia. Aos 150 volts, pedia para sair; aos 300V, deixava de responder. Se o professor hesitasse, um "pesquisador" (outro ator, de jaleco branco) intervinha com frases padronizadas:
- Estímulo 1: Por favor, continue.
- Estímulo 2: O experimento requer que você continue.
- Estímulo 3: É absolutamente essencial que você continue.
- Estímulo 4: Você não tem outra escolha a não ser continuar.
O experimento só era interrompido se o participante se recusasse após a quarta ordem.
Os resultados
Milgram esperava que poucos chegassem aos níveis mais altos. Surpreendentemente, 65% dos participantes administraram choques de 450V, mesmo ouvindo os gritos — ou o silêncio — do aluno.
Todos continuaram até 300V.
"Eu diria, com base na observação de mil pessoas no experimento e na minha própria intuição moldada e informada por esses experimentos, que se um sistema de campos de concentração fosse criado nos Estados Unidos, do tipo que vimos na Alemanha nazista, haveria funcionários suficientes para esses campos em qualquer cidade americana de médio porte", afirmou Stanley em entrevista em 1979.
"A psicologia social deste século revela uma lição importante: muitas vezes, não é tanto o tipo de pessoa que um homem é, mas o tipo de situação em que ele se encontra, que determina como ele agirá", explicou Milgram no livro 'Obediência à Autoridade: Uma visão Experimental', de 1974.
Apesar do impacto do estudo, críticos apontam falhas metodológicas. Orne & Holland (1968) questionaram o realismo experimental, argumentando que os participantes não acreditavam que os choques fossem reais.
Pesquisas posteriores confirmaram que alguns voluntários desconfiaram da montagem, especialmente porque o aluno não apresentava feridas.
Seu livro tornou-se referência, mas o experimento jamais foi replicado em sua forma original devido a questões éticas. Hoje, comitês de ética em pesquisa exigem consentimento pleno e proteção contra danos psicológicos — um debate ainda incipiente nos anos 1960.