Um vídeo extremamente problemático, para não dizer violento e preconceituoso, tem causado revolta nas redes sociais. Nele, um pastor submete uma adolescente bem jovem a uma sessão de “cura gay” com ares de exorcismo em frente a uma plateia numerosa e com a anuência dos pais.
O pastor em questão é Luiz de Jesus, da Igreja Evangélica Catedral da Família, em Palmas-TO e seus vídeos num perfil de uma rede social são uma mistura de exorcismo e adivinhações (que vão chamar de “revelações poderosas”) que beiram o charlatanismo. Os vídeos trazem temas recorrentes e giram em torno de ataques às religiões de matrizes africanas, questões de moralismo sexual e de gênero e “revelações” de detalhes da vida pessoal dos ouvintes.
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No vídeo que viralizou, de uma violência cruel contra a adolescente traz “profecias” do tipo: “um demônio soprou assim e disse: muda teu sexo” e o líder continua, aos berros: “Jesus gritou na minha alma: vai casar com homem, vai ter filhos, a partir de hoje vai se vestir igual mulher (???), porque Jesus arranca o demônio lá de dentro agora”. A cena choca pelo estado totalmente frágil e impotente da menina, que só faz chorar, cercada pelos pais que parecem concordar e autorizar toda a violência imposta pelo pastor.
A Fórum conversou com Keila Guedes Silva Santos, autora do livro "Pessoas LGBTQIAP+ e o direito a Deus", Bacharel em Direito, Especialista em Direito Homoafetivo e Gênero. Keila, que já esteve no programa Papo de Fé, da TV Fórum falando sobre o assunto, assistiu ao vídeo e comentou, indignada, sobre o abuso espiritual cometido contra a adolescente.
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"Infelizmente o que vemos nesse vídeo é o retrato do que ainda acontece em muitas igrejas com crianças, adolescentes e jovens que verbalizam a possibilidade de se perceberem homossexual ou transgênero. Uma verdadeira tortura mental. O Espírito de Deus é suave, não é violento. (...) O que esses pastores realizam não é bíblico. O mais triste é ver a postura de pais que muitas vezes nunca estudaram a Bíblia e apenas seguem à risca o que a liderança de uma determinada igreja diz, sem questionar, entregando seus filhos ao sofrimento e tortura psicológica ao invés de protegê-los.”
Realmente, no vídeo, uma coisa chama a atenção: o pai da menina diz que já estava aceitando a condição e chega a declarar abertamente que “não teria preconceito e já estava no processo de aceitação”, mas diante do pastor muda de ideia e submete a filha ao espetáculo de horror, vendo a filha ser “obrigada” a declarar em público que sua vida estava sendo mudada e que “eu sou mulher”.
Keila continua: “O pai chega a dizer que iria acolher sua filha, mas ao ouvir o pastor falar a respeito da identidade de gênero da adolescente, induzindo ao pensamento que o “demônio” tinha o intuito de “mudar o sexo” da jovem, mudou de opinião. A manipulação é tamanha que coloca em risco a saúde mental de uma adolescente (...) O que o fundamentalismo religioso prega hoje em nome do Deus da Bíblia é um ensino reproduzido por quem nem sabe a origem dele. A Bíblia nunca condenou a orientação sexual homossexual.”
A especialista ainda nos lembra que “a história nos conta inúmeros momentos em que as Escrituras foram aplicadas para excluir quem Deus nunca excluiu. O que pessoas LGBTQIAP+ vivem hoje foi vivido no passado pelas pessoas Negras, sendo a Bíblia utilizada para dar fundamento a um dos episódios mais horrendos da história: a escravidão do povo africano. Isso sem aprofundar no fato de que a Bíblia também foi utilizada para fundamentar o Holocausto vivido pelos judeus na Alemanha Nazista de Adolf Hitler.”
Keila Guedes, que criou o perfil @direitoadeus no instagram, conclui para a Fórum deixando uma pergunta no ar: “No frigir dos ovos, qualquer semelhança com os índices de tortura em “terapias de cura gay”, assassinatos, suicídios, marginalização, perpetrados hoje no mundo contra pessoas LGBTQIAP+ será mera coincidência ou a continuação de um projeto de domínio e exclusão criado tão pelos homens?”
Assista ao vídeo