DIREITOS TRANS

Conselho Federal de Medicina muda regra para transição de gênero

Resolução do CFM, dominado por bolsonaristas, dificulta processo transexualizador

2ª edição da Marcha Transmasculina de São Paulo.Manifestantes defendem direitos da população trans na Avenida Paulista em 30/3/2025Créditos: Ato Press/Folhapress
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Após anos de luta do movimento de pessoas travestis, transexuais e transgêneros, o Sistema Único de Saúde instituiu, em 2008, no segundo governo Lula, o processo transexualizador, com o objetivo de oferecer atendimento integral à população trans, incluindo acompanhamento psicológico, terapia hormonal e cirurgias de readequação ou redesignação de gênero. 

Em alguns estados e municípios essa política foi avançando com a criação de ambulatórios trans e também políticas públicas de assistência integral e empregabilidade como o Transcidadania, criado em 2014, no município de São Paulo pelo ex-prefeito Fernando Haddad.

Embora a maioria dos serviços se encontrem no Sudeste, principalmente no eixo RJ-São Paulo, o processo transexualizador veio se consolidando nacionalmente como uma política importante para o segmento populacional de travestis, mulheres transexuais, homens trans e transgêneros, considerado o mais vulnerável da população LGBT.

Ameaça de retrocesso

Apesar dos avanços recentes na  luta pela despatologização das identidades trans e reconhecimento de direitos, como foi o caso da decisão do STF que afirmou a constitucionalidade da mudança de gênero, do nome civil e demais procedimentos reivindicados pela população trans, nos últimos anos, com a ascensão do neofascismo e do conservadorismo há ameaças cotidianas de retrocessos vindas de parlamentares de extrema direita e até mesmo de outros setores, como é o caso do Conselho Federal de Medicina (CFM).

Em resolução aprovada por unanimidade na última terça-feira, 8, o Conselho quer impedir médicos de receitar a jovens que entraram na puberdade os chamados bloqueadores de hormônios, voltados a “retardar o aparecimento de traços físicos desconformes ao gênero”.

O novo texto aumenta de 16 para 18 anos a idade mínima para o início da terapia de hormonização em pessoas trans e de 18 para 21 anos o piso para a realização dos diversos  procedimentos cirúrgicos relativos à redesignação de gênero, como a mastectomia em homens trans, por exemplo. 

A nova diretriz  retarda todo o processo de transição, o que tem efeitos permanentes extremamente negativos, tanto físicos como psicológicos para os adolescentes e jovens trans.

Reações contrárias

Instado pelo posicionamento de entidades de promoção dos direitos LGBT como  uma denúncia da Associação Mães pela Diversidade e de nota técnica da Associação Nacional de Travestis e Transexuais, a Antra, o Ministério Público deu 15 dias de prazo para o Conselho Federal de Medicina se posicionar e dar mais esclarecimentos e justificativas para a decisão.

O movimento questiona a legalidade da norma e avalia que ela representa um “iminente risco à saúde física e mental de crianças, adolescentes e jovens trans”, em “evidente transfobia institucional que nega a identidade de gênero e impõe situações de vulnerabilização e violências”.

A normativa do CFM vem na direção oposta às decisões da Justiça, principalmente do Supremo Tribunal  Federal que, nos últimos anos, têm reconhecido uma série de direitos das pessoas trans, como a equiparação da homofobia e transfobia ao crime de racismo, o direito à diversidade sexual e de gênero na educação, a proteção da Lei Maria da Penha a casais LGBT; o direito de  presas transexuais e travestis com identidade de gênero feminino  optar por cumprir penas em estabelecimento prisional feminino ou masculino, entre outros.

Nesse sentido, tudo indica que a resolução transfóbica do Conselho Federal de Medicina deve ser derrubada. 

O CFM tem sido qualificado nos últimos anos como aparelhado pelo bolsonarismo, com uma série de posições polêmicas e até mesmo anti-científicas. Na pandemia de Covid-19, por exemplo, o órgão médico autorizou o uso de cloroquina, em posição repudiada pela comunidade científica no Brasil e no mundo.

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