COMO UMA PRAGA

Infestação de peixe-leão assusta o país após pescador ter 2 paradas cardíacas no CE

Presença do animal, originário dos oceanos Índico e Pacífico, e que não deveria estar presente em nossos mares, já é notada há algum tempo, mas agora parece ter saído do controle. Saiba como ele veio parar aqui e veja os perigos

O perigoso peixe-leão.Créditos: WNG.org/Reprodução
Escrito en MEIO AMBIENTE el

Há uns bons anos que biólogos especialistas vêm alertando sobre o aparecimento de peixes-leão nos mares brasileiros. Existem matérias jornalísticas e reportagens desde 2014 que mostram o problema que se tornou a proliferação dessa espécie em nossa costa, já que o animal é altamente peçonhento e acaba por destruir a fauna aquática local, além de trazer riscos sérios para os seres humanos. Ele é nativo dos oceanos Índico e Pacífico e possivelmente foi introduzido no Atlântico por imprudência ou acidentalmente.

Muito se falou até agora do peixe-leão no paradisíaco arquipélago de Fernando de Noronha, onde mergulhadores vão até as profundezas do oceano para literalmente caçar o animal com lanças metálicas. No entanto, a infestação parece ter aumentado de intensidade e o problema já está na costa.

Um pescador que vive na Praia de Bitupitá, no município de Barroquinhas, no litoral do Ceará, pisou num peixe-leão na última quinta-feira (21), no primeiro caso de acidente com o animal na costa do Brasil, em ambiente aberto. Ele apresentou gravíssimos sintomas por conta do veneno do bicho, como febre, dores muito fortes, convulsões e duas paradas cardíacas. Francisco Mauro da Costa Albuquerque, de 24 anos, estava caminhando num curral de pesca e provavelmente pisou na espécie venenosa.

O rapaz precisou ficar internado alguns dias e mesmo depois de melhorar e ter alta, precisou voltar ao hospital nesta terça-feira (26) por sentir dores no peito e ficar muito agitado, não conseguindo dormir durante toda a noite. Estudiosos afirmam que o caso dele precisa ser melhor analisado, já que paradas cardíacas não costumam acontecer em quem tem contato com o peixe. Casos de morte também seriam raríssimos.

Para compreender melhor como o peixe-leão veio parar na costa brasileira, a reportagem da Fórum ouviu o biólogo Roberto Vieira dos Santos Junior, que trabalha com peixes há 22 anos e é proprietário de uma das mais respeitadas lojas de aquarismo do Brasil.

“O peixe-leão, aqui no Oceano Atlântico, é uma espécie invasora. As espécies invasoras são aquelas que notoriamente não são nativas de uma determinada região. Espécies que por algum motivo foram introduzidas no ambiente, seja acidentalmente, assim como por meio de água de lastro, ou até mesmo intencionalmente, para fornecer um alimento, assim como por escape de criação”, explicou o biólogo.

Sobre essa infestação, especificamente, Vieira diz que algumas hipóteses são rastreadas há anos, mas não é possível afirmar de fato, com toda certeza, o que ocorreu para o peixe-leão ter surgido no Oceano Atlântico.

“No caso do peixe-leão, ele foi introduzido no Mar do Caribe. Há alguns estudos e hipóteses sendo analisadas, como por exemplo um furacão que ocorreu na Flórida, nos EUA, onde vários aquários à beira-mar tiveram seus animais escapados. Uma outra linha de investigação aponta para um local de criação e comercialização clandestina desses peixes, que ao sofrer uma blitz de fiscalização resolveram soltar os animais no mar, também nos EUA”, conta o especialista.

O caminho até as praias brasileiras não foi fácil e é muito longo. O biólogo esclarece que houve até quem não acreditasse que o animal poderia chegar às águas mais ao sul, já que existiam obstáculos naturais que poderiam impedir esse avanço. Só que o peixe-leão os venceu.

“O que se sabe é que, a partir daí, há uma invasão em massa da espécie no Caribe. Na sequência, o peixe-leão foi notado no litoral da Colômbia e então ele foi descendo até chegar ao Brasil. Aqui no país havia uma barreira biológica, que nós não sabíamos se o animal conseguiria transpor, que é a manta de água doce que o Rio Amazonas lá em sua foz. Naquela região do mapa, onde o rio desagua no mar geográfico, ele ainda vai muitos quilômetros adentro até a água ficar salgada. Essa é a manta, já que a água doce é menos densa que a salgada, o que faz com que ela fique acima da água salgada. Isso não evitou a passagem do peixe-leão. O que se acredita é que ele tenha conseguido passar por baixo, nas áreas mais profundas, onde a água é salgada”, explana Vieira.

Mas se engana quem acha que o peixe-leão é um caso único ou raro de espécie invasora. Outras espécies já andaram causando problema mundo afora por ação do homem.

“Esse não é um problema só do Brasil. No mundo todo há sérios problemas com a introdução de várias espécies, e não falamos só do peixe-leão. O que sabemos é que a forma mais comum desse tipo de invasão é por escape de criação, por uma falta de manejo. A rã-touro e a xenopus são dois anfíbios que são usados por seres humanos. No caos da xenopus, para estudo laboratorial, é aquele com a qual se faziam testes de gravidez. Já a rã-touro é comestível, usada como alimento mesmo. O que ocorre é que as duas espécies conseguem abrigar um fungo na pele que não as afeta em nada, mas outras espécies de anfíbios morrem ao entrar em contato com elas e de forma absurdamente rápida. Com isso, em locais como florestas tropicais, como as da América Central, onde há muitas espécies de anfíbios, elas passam a ser dizimadas pela presença desse fungo que se instala nas espécies invasoras. Outro exemplo é a tilápia do Nilo, que foi introduzida no Brasil para povoar reservatórios, para serem usados como alimentos ou em pesca esportiva. Porém, ele é um peixe que escapa muito facilmente do criatório e se adapta até em ambientes de água salobra, embora ele seja de água doce. A tilápia chega até a entrar mar adentro”, concluiu.