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Mato Grosso: Jornalistas perseguidos pelo governador Mauro Mendes entram com Habeas Corpus na Justiça

Alexandre Aprá e Enock Cavalcanti tentam encerrar inquérito do qual são alvo; Enock deu seu depoimento sobre o caso à Fórum

O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes.Créditos: Geraldo Magela/Agência Senado
Escrito en MÍDIA el

Os jornalistas Enock Cavalcanti e Alexandre Aprá - que denunciam perseguição por parte de Mauro Mendes (União Brasil), o governador de Mato Grosso, após serem alvos de busca e apreensão em 6 de fevereiro - entraram com um pedido de Habeas Corpus na última segunda-feira (19) a fim de de encerrar os inquéritos.

De acordo com depoimentos dos jornalistas, o governador estaria se utilizando da estrutura da Polícia Civil para perseguir os profissionais e, no âmbito da apreensão de celulares e notebooks, colocou em risco o sigilo das suas fontes. Em depoimento dado à Fórum, Alexandre Aprá qualificou a conduta como “perseguição ao exercício da profissão”.

A liminar protocolada pelos jornalistas no Tribunal de Justiça do Mato Grosso pede basicamente a suspensão dos inquéritos que miram os profissionais e um Habeas Corpus preventivo que garanta a não persecução dos mesmos.

Ao longo do seu depoimento, publicado na semana passada, Aprá narra como reportagens que em 2021 apontavam favorecimentos em licitações a aliados atraíram a ira do governador para si. Ele chegou a ser monitorado por um “detetive particular” contratado para incriminá-lo com drogas e/ou pedofilia. Mais tarde esse mesmo detetive teria se arrependido de aceitar o serviço e lhe contou tudo. Mas acabou dispensado pela Justiça local após pagar multa.

O jornalista Alexandre Aprá. Arquivo pessoal

Enock Cavalcanti, em depoimento exclusivo à Fórum, detalha a sua história. A perseguição contra ele começou em outubro do ano passado, quando o jornalista publicou um artigo de opinião em sua coluna no site Isso é Notícia, de Alexandre Aprá, em que trazia informações a respeito de uma apuração do site Repórter Brasil. Nelas, o desembargador Orlando Perri, um dos mais antigos do tribunal mato-grossense, referência do Judiciário local e responsável por denúncia que em 2010 afastou 10 juízes por corrupção no Conselho Nacional de Justiça, estaria atuando de forma dúbia, entre magistrado e empresário, investindo na mineração e "faturando com a extração de ouro".

Ele diz que o governador Mauro Mendes e seus filhos "também faturam com ouro", o que fez com que o artigo entrasse no radar. No entanto, as acusações ao desembargador aqui descritas não foram uma apuração de Cavalcanti, mas do site Repórter Brasil, amplamente conhecido pela sua credibilidade em termos de reportagem. Ele apenas repercutiu as informações e fez questionamentos a partir das mesmas.

“Eu pedia ao Perri que desse explicações urgentes. Ele era um magistrado que tínhamos muita consideração, por todo o seu passado. Como que ele aparecia agora envolvido com um senhor chamado Ney Garimpeiro, que é uma espécie de ‘rei do garimpo’ por aqui e presença constante no noticiário policial? Um sujeito que vez ou outra está trocando tiro por aí, por um ouro que sai de Mato Grosso por baixo dos panos, sem controle ou impostos”, explicou Cavalcanti.

Enock Cavalcanti em vídeo gravado diante da delegacia.Créditos: Reprodução /Redes Sociais

Aos 71 anos, Enock conta que antes da promulgação da Constituição de 1988 trabalhava no Rio de Janeiro e, durante o regime civil-militar iniciado em 1964, topou com situações de censura e repressão, sobretudo quando noticiava prisões e mortes de militantes de esquerda. Ele vê como natural uma reação das autoridades denunciadas pelo jornalismo, mas pondera que em tempos democráticos é inadmissível que essa reação se dê por meio do uso do aparato público, entre eles as polícias e os tribunais.

“A gente faz um jornalismo questionador, investigativo, então é natural acabar se envolvendo nesse tipo de situação. É esperado que eles reajam, mas é chato quando se manipula e se usa a estrutura da polícia para isso. Se o desembargador não gostou do meu artigo, ele buscar esclarecimento, exercer seu direito de resposta e responder no debate. Existem vários caminhos democráticos”, pontuou.

Para o jornalista, a estrutura do Estado estaria sendo usada para garantir os interesses do grupo econômico do governador Mauro Mendes, caracterizado por ele como uma “cabeça bolsonarista”, um político e empresário apoiador do ex-presidente inelegível num Mato Grosso onde abundam denúncias de que patrões locais teria financiado o 8 de janeiro. Resta esperar para ver como a Justiça avaliará o pedido de Habeas Corpus.

"Não tem uma manifestação do Ministério Público em defesa dos jornalistas, uma coisa mais retumbante, mais sonora, mais expressiva. O Mauro Mendes, a exemplo do que o Bolsonaro fez no plano nacional, faz uma espécie de 'Abin Paralela' na Polícia Civil de Mato Grosso, botando seus interesses e usando a corporação pra vir entrar de minha casa com o respaldo de um mandato judicial", finalizou.

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