JORNALISMO

Trajetória do “Movimento”, marco da imprensa alternativa, é lembrada em evento na USP

Publicação fez história nos anos 1970 na luta contra ditadura militar e pela redemocratização do país

Equipe do Movimento.Créditos: Reprodução
Escrito en MÍDIA el

A trajetória do jornal “Movimento”, que fez história na imprensa alternativa brasileira de 1975 a 1981, período em que circulou, será lembrada nesta sexta-feira (10), às 15 horas, em evento comemorativo no Centro MariaAntonia da Universidade de São Paulo (USP).

O encontro contará com as presenças de ex-integrantes do jornal, que debaterão o papel da publicação no enfrentamento ao regime militar e seu pioneirismo na luta pela redemocratização do Brasil, a partir da segunda metade dos anos 1970.

Reprodução

Há 50 anos, um grupo de jornalistas fundou o veículo que tinha como característica principal o combate à ditadura militar em vigor no Brasil. Porém, além de lutarem pela democracia, eles a praticavam em seu ofício.

Sem patrões e financiado coletivamente, o “Movimento” reuniu em sua equipe intelectuais e militantes de esquerda, se tornando uma das publicações mais importantes da imprensa alternativa nos “anos de chumbo”.

O primeiro número do “Movimento” saiu no dia 7 de julho de 1975. Era no formato tabloide, tinha 28 páginas e custava 5 cruzeiros. Na capa da edição de estreia, uma reportagem do então repórter policial Aguinaldo Silva, o mesmo que se tornaria no futuro autor de sucesso de novelas na Globo. Raimundo Pereira estava no comando.

“A ideia de um jornal sem patrão era antiga. Tínhamos um grupo de jornalistas em São Paulo com essa ideia e não conseguíamos viabilizar. Um jornal, mesmo semanal, exigia muitos recursos e infraestrutura”, explicou, ao Jornal da USP, Tonico Ferreira, um dos integrantes do “Movimento”.

A sede do semanário ficava no bairro Pinheiros, em um sobrado na Rua Doutor Virgílio de Carvalho Pinto, na capital paulista. Possuía, ainda, sucursais no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Salvador e Campinas, além de correspondentes em Belém, Curitiba, Londrina, Porto Alegre e Recife. A tentativa era tomar decisões de maneira coletiva, o que resultava em assembleias e frequentes brigas.

Nomes de peso da intelectualidade nacional participaram do “Movimento”, como Chico Buarque e Orlando Villas-Bôas no conselho editorial; Eduardo Suplicy, Fernando Henrique Cardoso, Francisco Weffort e Paul Singer, como colaboradores; Gianfrancesco Guarnieri, Jean-Claude Bernardet, Paulo Emílio Salles Gomes, Plínio Marcos e Ruy Guerra, na seção de Cultura.

Para sustentar o desafio, o financiamento vinha de recursos obtidos pelos próprios jornalistas e pela Edição S.A., sociedade anônima criada para manter o “Movimento”, cujo diretor responsável era Tonico.

O jornal enfrentava problemas com a censura. “O general Geisel e o ministro da Justiça, Armando Falcão, tiveram acesso ao número zero de ‘Movimento’, com toda a sua proposta editorial, e avaliaram que aquele jornal era um inimigo perigoso”, explicou Carlos Azevedo, mais um dos integrantes do time. “Geisel, então, determinou que desde o número 1 ele teria uma censura prévia duríssima. Eles queriam destruir o jornal”.

Resultado, em sua segunda edição, foram 14 matérias vetadas completamente e outras 12 alvo de censura parcial. A edição de número 15 foi totalmente apreendida. Até o término da censura prévia, em 1978, cerca de 3 mil artigos e outras 3 mil ilustrações foram cortadas do “Movimento”.

Entre suas coberturas principais, o jornal acompanhou de perto as greves do ABC paulista e o ressurgimento do movimento operário, no final dos anos 1970. Na edição de 14 de maio de 1979, por exemplo, a capa foi com o então líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva.

Capítulos finais

Entretanto, a própria redemocratização, tão defendida pelo semanário, acabou por ser decisiva para o fim do “Movimento”. Com a liberação de novos partidos políticos, além do MDB e do Arena, a frente representada pela publicação entrou em crise. Cada grupo queria ter o próprio canal para veicular suas posições e apresentar projetos para o país. “Movimento” perdeu leitores e colaboradores.

“A frente vai se ampliando e isso muda a situação. O jornal que era fruto e origem de uma frente se desfaz. Ela vai adotando outras formas, e o 'Movimento' perde sua condição de sobrevivência. De um lado, o terrorismo, de outro, o avanço da conjuntura política”, analisou Azevedo.

“Quando a ditadura estava mais forte, a esquerda se unia. A partir de um certo momento, houve um processo de divisão entre a esquerda”, avaliou Tonico Ferreira.

Após 334 edições, “Movimento” encerrou sua história em 1981. Porém, deixou um legado de combate aos militares por meio das palavras e das ideias.

Serviço

O evento comemorativo dos 50 anos de fundação do jornal “Movimento” será nesta sexta-feira (10), às 15 horas, no Centro MariAntonia da USP, à Rua Maria Antonia, nº 294, Vila Buarque, em São Paulo, próximo às estações Santa Cecília e Higienópolis-Mackenzie do metrô. Entrada grátis. Não é preciso fazer inscrição.

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