Professor que se vestiu de KKK se desculpa em carta: "era da divulgação da nossa peça teatral"

"Peço aqui desculpas sinceras pelo choque causado, mas reitero que a intenção era a divulgação da nossa peça teatral. Porque de fato a simples visão da indumentária desses racistas facínoras, a quem eu repudio, é digna de asco", diz o professor Luiz Antônio Bortollo

Ato antirracista em frente à Escola Estadual Amaral Wagner, em Santo André (Foto: Facebook/Monica Seixas)
Escrito en MOVIMENTOS el

O professor de História Luiz Antônio Bortollo, que aparece vestido com roupa da Ku Klux Klan andando pela Escola Estadual Amaral Wagner, em Santo André (SP), divulgou nota "à comunidade escolar, ao povo de Santo André e aos meios de comunicação" se desculpando pelo ato e justificando que ficou apenas poucos minutos com o traje para divulgar uma peça teatral de denuncia do racismo, no mês da consciência negra, em que existem personagens vestidos de Klan".

Segundo ele, tudo não passou de um "mal entendido criado a partir de uma filmagem feita em festa de final de ano na escola, postada nas redes sociais".

"A verdade dos fatos é o seguinte: desde 2017, ainda na Escola Oscavo de Paula, monto uma peça teatral de denuncia do racismo, no mês da consciência negra, em que existem personagens vestidos de Klan. Nesse ano, na Escola Amaral Wagner, pretendia fazer o mesmo, com o conhecimento e autorização verbal da direção escolar. Mas não foi possível por conta da pandemia, razão pela qual a peça deveria ser filmada. No dia 8 de dezembro, na festa de final de ano da escola, professores e alunos foram convidados a vir fantasiados. Nesse momento, no desejo de me alinhar aos alunos, já fantasiados, peguei a veste da KK Klan que estava em meu armário e a vesti, para divulgar a nossa peça teatral, que seria agora encenada e apenas filmada, e distribuída a todas as classes, por causa da pandemia, mas depois, seria apresentada na semana do 13 de maio, por ocasião da libertação formal dos escravos", explica o professor antes de se desculpar.

"Peço aqui desculpas sinceras pelo choque causado, mas reitero que a intenção era a divulgação da nossa peça teatral. Porque de fato a simples visão da indumentária desses racistas facínoras, a quem eu repudio, é digna de asco", emenda - leia a nota na íntegra ao final da reportagem.

Também em nota, o diretor da escola, professor Wagner Luiz Bonifácio dos Santos, afirmou que o professor foi chamado à direção "e reconheceu que sua ação foi infeliz".

"Dias depois, de forma espontânea, o mesmo enviou uma carta à Direção da Escola com um pedido formal de retratação, pedindo desculpa a toda a comunidade por seu ato impensado", diz o texto (íntegra abaixo).

Especialista em Direitos Humanos e Segurança Pública pela PUC-SP, Ariel de Castro Alves, que é presidente do grupo Tortura Nunca Mais, afirmou à Fórum que a retratação pode por um ponto final ao caso.

"O professor se retratando e explicando que ele teve a intenção de denunciar e combater o racismo, por meio da expressão artística, usando aquelas vestimentas, pode se livrar de punições administrativas e criminais", disse o jurista.

"Se ele tivesse a intenção de promover o racismo e fazer apologia a atuação da Ku Klux Klan, ele poderia responder por incitação ao racismo, prevista na lei de crimes de racismo e por apologia a violência, do código penal. Porém, como não teve essa intenção, pode se isentar de punições", emendou Castro Alves.

Leia a íntegra da carta divulgada pelo professor Luiz Antônio Bortollo.

NOTA À COMUNIDADE ESCOLAR, AO POVO DE SANTO ANDRÉ, E AOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO

Eu, LUIZ ANTONIO BORTOLLO, professor de História da Rede Estadual de Ensino, docente na Escola Estadual Amaral Wagner em Santo André - SP, e profundamente antiracista, venho esclarecer um grande mal entendido criado a partir de uma filmagem feita em festa de final de ano na escola, postada nas redes sociais. Nesta filmagem, apareço vestido com roupas da famigerada Ku Klux Kan, grupo racista e supremacista branco dos EUA.

Isso foi denunciado erroneamente nas redes sociais como se eu estivesse fazendo apologia do racismo, e por conta disso venho sendo execrado nas redes sociais e nos meios de comunicação.

Mas a verdade dos fatos é o seguinte: desde 2017, ainda na Escola Oscavo de Paula, monto uma peça teatral de denuncia do racismo, no mês da consciência negra, em que existem personagens vestidos de Klan.

Nesse ano, na Escola Amaral Wagner, pretendia fazer o mesmo, com o conhecimento e autorização verbal da direção escolar.

Mas não foi possível por conta da pandemia, razão pela qual a peça deveria ser filmada.

No dia 8 de dezembro, na festa de final de ano da escola, professores e alunos foram convidados a vir fantasiados. Nesse momento, no desejo de me alinhar aos alunos, já fantasiados, peguei a veste da KK Klan que estava em meu armário e a vesti, para divulgar a nossa peça teatral, que seria agora encenada e apenas filmada, e distribuída a todas as classes, por causa da pandemia, mas depois, seria apresentada na semana do 13 de maio, por ocasião da libertação formal dos escravos.

Muitos dos meus alunos entenderam perfeitamente o que aconteceu.

Neste momento, fui filmado por celular e essa filmagem gerou a denúncia contra mim, por pessoas que desconheciam o contexto. Fiquei pouquíssimo tempo vestido com tais vestes, porque de fato não faria sentido permanecer com elas mais tempo.

Peço aqui desculpas sinceras pelo choque causado, mas reitero que a intenção era a divulgação da nossa peça teatral. Porque de fato a simples visão da indumentária desses racistas facínoras, a quem eu repudio, é digna de asco.

Mas o fato é totalmente diferente do que vem sendo divulgado contra mim, seja nas redes sociais, seja nos meios de comunicação.

E aproveito para reafirmar meu firme propósito de continuar fazendo de minha atividade como professor um instrumento de desenvolvimento de consciências críticas, de pessoas que possam combater com firmeza, entre outras pragas, o racismo estrutural que infelizmente ainda se faz presente em nossa sociedade.

Santo André, 22 de dezembro de 2021

Luiz Antônio Bortollo

Leia a íntegra da nota divulgada pela direção da escola