Ativistas do mundo todo assinam manifesto contra o marco temporal

O Supremo Tribunal Federal inicia hoje votação do texto que pode acabar com as demarcações indígenas no Brasil depois da Constituição de 1988

Foto: Por meio de faixas, indígenas pedem justiça contra o marco temporal I Via Apib
Escrito en MOVIMENTOS el

Mais de 700 ativistas assinam uma carta global chamando a atenção para a questão do marco temporal, que terá a sua votação iniciada nesta quarta-feira (1º) pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O texto que compõe a carta também tem o objetivo de alertar organismos internacionais para as políticas do governo Bolsonaro em relação aos indígenas, a qual os ativistas classificam como "ecocida".

Além disso, o objetivo é questionar espaços como a União Europeia e outros que vierem a realizar tratados com o governo do Brasil.

O que é o marco temporal?

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma a discussão e votação sobre o marco temporal que, caso aceito pela Corte, será uma nova tragédia sobre os povos originários do Brasil.

A sessão desta quarta (1º) do STF será destinada às sustentações orais, que serão 39.

Na quinta-feira (2) o ministro e relator da matéria, Edson Fachin, deve apresentar o seu voto e, de acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), existe a expectativa de que o ministro Kássio Nunes Marques peça vista do processo.

Com isso, a Câmara dos Deputados deve colocar em votação o PL 490/07, que foi aprovado pela CCJ em junho e que institui o marco temporal.

O adiamento da votação na semana passada e o provável pedido de vistas pelo ministro Kassio Nunes não se dão ao acaso, mas sim como parte de uma estratégia da bancada ruralista.

A bancada ruralista, que conta com 280 membros e é uma das mais influentes no Congresso, tem certeza de que, se levar ao plenário, obtém a aprovação do PL 490.

À Fórum a Apib confirmou a estratégia e afirmou que o objetivo da Câmara é “atropelar o processo”.

Confira abaixo a Carta Global contra o Marco Temporal (assine aqui)

“Você sabe o que está acontecendo no Brasil neste momento?

O governo Bolsonaro e seus aliados promovem um genocídio e um ecocídio já denunciado ao Tribunal Internacional de Haia.

Apesar das fronteiras nacionais que nos separam, dos privilégios de alguns, que têm sido incrementados por processos históricos, desumanos e predatórios como o colonialismo, somos todos e todas cidadãos e cidadãs globais e nos entendemos como seres humanos que habitam o mesmo planeta.

As consequências da destruição do planeta não são problema de alguns: dos desfavorecidos na lógica e perversões do capital. Essas consequências, quaisquer que sejam, atingirão a todos nós, bem como às nossas gerações futuras. Nunca isso foi tão claro como hoje, quando a crise climática global provoca secas, inundações, furacões, incêndios e consequentemente movimentos migratórios, guerras, fome e falta de água. Esta não é uma previsão fatalista ou apocalíptica, é algo que já está batendo à nossa porta, estejamos no norte ou no sul.

Vivemos claramente uma emergência global e nos aproximamos perigosamente do ponto de não retorno, como nos alertam os cientistas. Por este motivo, todos nós arcaremos com as consequências da destruição de regiões inteiras de diferentes biomas, para entregá-las ao agronegócio, ao extrativismo predatório e à mineração, atividades estas, também financiadas por grandes corporações do norte global.

A política anti-indígenista e anti-ambientalista exercidas em governos como o do Brasil atualmente, visam justamente expropriar os povos originários, que estão em resistência há mais de 500 anos, protegendo grande parte da biodiversidade do planeta. Esta política é um ataque direto à todas as formas de vida, inclusive a nossa, por isto não podemos nos silenciar mais!

Estamos aqui para fazer um alerta a respeito das decisões a serem tomadas pelo Supremo Tribunal Federal e o Congresso do Brasil, pois elas afetarão não só o direito à vida e ao território dos povos indígenas brasileiros, como também impactarão o nosso próprio futuro. Como cidadãos e cidadãs globais, exigimos nosso direito à vida e ao futuro para as próximas gerações.

Esta é uma carta global de solidariedade, não só para com as populações indígenas, que protegem 82% da biodiversidade mundial, mas também para com as crianças e jovens deste planeta. Não importa onde nasçam, herdarão nossa casa comum e com ela as consequências das decisões que agora estão sendo tomadas numa sala do Judiciário no Brasil, onde será votado o chamado "Marco Temporal" e posteriormente no Congresso com os projetos de lei em andamento, no Parlamento Europeu, ou em qualquer lugar onde se trate de uma matéria a ser negociada com um governo que, como o brasileiro, promove abertamente a destruição da vida - a necropolítica.

De acordo com o chamado "Marco Temporal“, o direito dos povos indígenas às terras ancestrais, estaria restrito a uma determinada data (5 de outubro de 1988), desconsiderando o fato de serem estas as populações originárias do continente, ignorando também o histórico de expulsões forçadas desde a invasão européia.

Trata-se de uma decisão que nos próximos dias caberá aos magistrados brasileiros, pressionados por interesses políticos e do capital, e que poderá restringir o direito constitucional dos povos indígenas ao seu território de origem. Uma decisão que vai abrir as portas para mais desapropriacões e violência, como também inevitavelmente para a destruição de 11 milhões de hectares de biomas que contribuem para que o ar que respiramos globalmente, continue sendo respirável. Sem acesso à terra, comunidades indígenas e tradicionais podem ser exterminadas, já que sua existência está intrinsecamente ligada à ela. É por isso que desde onde estamos dizemos "Não ao Marco Temporal!"

Desde muitas partes do mundo, acompanhamos com gratidão a luta dos povos indígenas, os verdadeiros defensores do planeta, porque lutando por seu direito à vida e à terra, eles também lutam pela nossa sobrevivência!”.