Secretário de educação do estado de SP desconhece realidade dos alunos LGBT, diz Erika Hilton

Em 2019, o governador de São Paulo, João Doria, mandou recolher material sobre diversidade sexual e afirmou não apoiar “apologia à ideologia de gênero”; estudante trans agredida está com medo e não quer voltar pra escola

Erika Hilton é destaque na revista Times/ Foto: Divulgação
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Em 2019, o governador de São Paulo, João Doria, mandou recolher material sobre diversidade sexual e afirmou não apoiar “apologia à ideologia de gênero”; estudante trans agredida está com medo e não quer voltar pra escola

Em setembro de 2019, em seu primeiro ano como governador do estado de São Paulo, João Doria mandou recolher um livro que tratava das diversidades de gênero e sexualidade destinado aos estudantes da 8ª série. À época, afirmou ser contra a "apologia à ideologia de gênero".

"Fomos alertados de um erro inaceitável no material escolar dos alunos do 8º ano da rede estadual. Solicitei ao Secretário de Educação o imediato recolhimento do material e apuração dos responsáveis. Não concordamos e nem aceitamos apologia à ideologia de gênero", declarou Doria.

https://twitter.com/jdoriajr/status/1168866707349364736

O material em questão era uma apostila que explicava os conceitos de sexo biológico, identidade de gênero e orientação sexual, ou seja, tratava de um tema caro aos adolescentes: as diferenças sexuais e como lidar com ela.

A recusa em abordar a questão de gênero e sexualidade nas escolas produz consequências diárias, uma delas ganhou as redes nesta quinta-feira (10), quando uma estudante trans da Escola Estadual Galdino Pinheiro, em Mogi das Cruzes foi cercada por colegas e agredida com socos e chutes.

Segundo a estudante, as violências transfóbicas eram diárias e nada era feito, por parte da escola, para cessar com elas. Após sofrer as agressões, a estudante não quer mais sair de casa e afirma não querer voltar "nunca mais" à escola.

Educando para a diversidade

À Fórum, a vereadora Erika Hilton (PSOL-SP) defende uma abordagem sistemática e estrutural das questões referentes às sexualidades e identidades de gênero nas escolas.

"As medidas que podem ser tomadas para evitar esse tipo de violência absurda e assustadora dentro do ambiente escolar é sem sombra de dúvida nenhuma a sensibilização dos alunos, dos professores, de todo o corpo escolar para que entenda, compreenda e saiba lidar com as questões de gênero e de sexualidade", diz Hilton.

A deputada estadual Erica Malunguinho (PSOL-SP), que irá se encontrar com a diretora da escola na semana que vem, afirma que o caso não pode ser tratado como "mais um".

"A violência que tomou corredores de uma escola estadual contra uma estudante trans é sintomática de nossa conjuntura atual. A escola, por ser nosso espaço essencial de formação, não pode, em instância alguma, ser celeiro de intolerância, mas sim de construção de cidadanias. Não podemos permitir que travestis e transexuais, nem quaisquer outras formas de vida e expressão, sejam violentadas fisicamente e psicologicamente em nossas escolas".

Presidenta da APEOESP (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) e deputada estadual, Bebel (PT-SP) revela que a sindicato possuía um programa de combate à violência nas escolas, mas que foi descontinuado pelo governo Doria.

"Evidencia-se, além da transfobia dos agressores, a falta de uma política de prevenção à violência nas escolas e de um trabalho de educação realmente civilizatória. Lamentavelmente a Secretaria Estadual da Educação esvaziou e descontinuou o programa de mediação escolar, que a APEOESP contribuiu para formular há mais de dez anos, pelo qual professores com a devida orientação realizavam um trabalho de conscientização e dissuasão de possíveis conflitos nas escolas", diz Bebel.

Deputada estadual paulista Professora Bebel (Assembleia Legislativa de São Paulo)

"Caso isolado"

Em nota enviada a Fórum, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) declarou "repudiar qualquer forma de violência", mas destacou o fato de se tratar de "um caso isolado". A vereadora Erika Hilton rebate tal hipótese é enfática ao dizer que não se trata de um caso isolado e afirma que, como estudante da rede pública de ensino de São Paulo vivenciou violências transfóbicas.

"Isso não é um caso isolado, isso é reflexo de toda a sociedade e de como o ambiente escolar também é de certa maneira pela manutenção da LGBTfobia. Dizer que isso é um caso isolado mostra o desconhecimento do secretário sobre qual é a realidade de alunos, alunas e alunes LGBT dentro das escolas públicas do estado de São Paulo", critica Hilton.

Por sua vez, Malunguinho afirma que é chegado o momento de "represar e tratar a corrente de ódio que toma o país. É preciso se atentar às crescentes células ligadas a pautas neofascistas / nazistas e a discursos de intolerância, minimizando a escravidão e a violência contra a mulher, que têm se espalhado de forma muito veloz".

Deputada estadual Erica Malunguinho/ Foto: Mídia Ninja

"É preciso envolver os jovens nesse debate a ponto de conscientizar e desconstruir todo esse mau que a sociedade construiu ao longo do tempo acerca dos corpos LGBT. Isso não é uma tarefa fácil, isso é uma tarefa muito difícil, que demanda uma interdisciplinaridade, mas este é o caminho, o caminho da sensibilização, o caminho da educação, o caminho de programas escolares que traga esse debate para dentro do ambiente escolar e descontrua o ódio, as discriminações e naturalize a presença de LGBTs no âmbito escolar", finaliza Erika Hilton.