Ativistas comemoram condenação de Fujimori

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Organizações de direitos humanos aplaudiram a condenação a 25 anos de prisão do ex-presidente peruano Alberto Fujimori (1990-2000) por crimes de homicídio, tortura e seqüestro agravado.

“Após anos evitando a justiça, Fujimori finalmente foi responsabilizado por alguns de seus crimes”, disse a pesquisadora para as Américas da organização Human Rights Watch (HRW), Maria McFarland, que esteve presente quando a Sala Penal Especial do Supremo Tribunal de Justiça do Peru anunciou a sentença.

“Com este veredito, e seu desempenho exemplar durante o julgamento, o tribunal peruano mostrou ao mundo que nem mesmo ex-chefes de Estado podem esperar fugir dos graves”, acrescentou McFarland. Ao fim do julgamento de 15 meses, os juizes consideraram Fujimori culpado de ter ordenado dois grandes massacres: a execução de 14 adultos e uma criança de 8 anos em Barrios Altos, região de Lima, no dia 3 de novembro de 1991, e o sequestro, desaparecimento e assassinato de nove estudantes e um professor da Universidade de La Cantuta em 18 de julho de 1992. Também foi considerado culpado pelos sequestros do jornalista Gustavo Gorriti e do empresário Samuel Dyer, em 1992.

Os assassinatos foram cometidos por um esquadrão da morte do Serviço de Inteligência do Exército (SIE) conhecido como Grupo Colina, que teria a supervisão do mais próximo colaborador de Fujimori, Vladimiro Montesinos. “Foi feita justiça no Peru”, disse Javier Zuniga, assessor especial da Anistia Internacional que acompanhou de perto o julgamento em Lima. “Este é um dia histórico. Nem todos os dias vemos um ex-chefe de Estado sendo condenado por violações dos direitos humanos como tortura, sequestro e desaparecimento forçado. Esperamos que este seja o primeiro de muitos julgamentos tanto na América Latina quanto em todo o mundo”, acrescentou.

Acusado de violações dos direitos humanos e atos de corrupção, Fujimori apresentou sua renúncia em 2000 através de fax que enviou de Brunei a Lima ara em seguida solicitar asilo ao Japão, lar de seus pais, aproveitando sua dupla nacionalidade. Em 2005, apresentou-se inesperadamente em Santiago do Chile com a esperança de voltar ao seu país e converter-se novamente em presidente, mas foi preso e extraditado ao Peru em 2007. A sentença de ontem confirmou investigações independentes da HRW e da Anistia que apontavam Fujimori como responsável pelas atrocidades cometidas pelo Grupo Colina.

Um informe de 2005 da HRW, intitulado “Causa provável: evidência implicando Fujimori”, detalhava provas substanciais então disponíveis que vinculavam o ex-presidente com o esquadrão da SIE e suas atividades. A evidência incluía uma extensa documentação oficial e testemunhos mostrando que o Grupo Colina não era uma operação clandestina, mas que existia como uma estrutura formal militar. Seus membros receberam recursos e apoio logístico dos mais altos níveis do Exército e do SIE, que estavam sob completo controle de Fujimori.

A Anistia, que acompanhou de perto o julgamento de Fujimori através de observadores locais e internacionais, disse que o ex-mandatário cometeu graves violações dos direitos humanos e internacional (como tortura, assassinatos e desaparecimentos forçados), o que, devido à sua natureza propagada e sistemática, constituíam crimes contra a humanidade. Em setembro de 2008, Kate Doyle, analista adjunta do instituto não-governamental norte-americano Arquivo de Segurança Nacional, deu um testemunho como especialista no julgamento, referindo-se à natureza dos 21 documentos dos Estados Unidos que foram apresentados no tribunal pela promotoria.

Doyle disse que esses documentos refletem as conclusões da embaixada dos Estados Unidos de que Fujimori esteve envolvido em uma “estratégia encoberta de lutar agressivamente contra a subversão através de operações terroristas, desprezando os direitos humanos e as leis”. O Arquivo divulgou ontem textos norte-americanos desclassificados que foram apresentados como evidência no tribunal. Eles contêm informação de inteligência obtida por funcionários norte-americanos de fontes peruanas sobre a criação secreta de “equipes de assassinato” como parte das operações contra-terroristas de Fujimori, sobre o papel das forças de segurança nas violações dos direitos humanos e sobre a participação do então presidente nos esforços para proteger os militares de uma investigação.

Um documento de agosto de 1990 detalha como, “somente semanas após a eleição de Fujimori”, um funcionário do Serviço de Inteligência Nacional (SIN) informou a membros da embaixada norte-americana sobre um plano encoberto, ao que parece “idealizado pelo assessor presidencial Vladimiro Montesinos’, para realizar assassinatos extra-judiciais de suspeitos de terrorismo. “O treinamento dessas novas equipes de assassinato já está em andamento”, informou a fonte. Também indicou que o plano tinha a “aprovação tácita do presidente Fujimori”. O SIN foi uma agência de inteligência desativada depois que seu chefe de fato, Montesinos, foi descoberto pagando suborno a figuras políticas.

Fujimori foi o primeiro presidente eleito democraticamente na América Latina a ser julgado em seu próprio país por violações dos direitos humanos. “A sentença é importante não apenas em si, mas por demonstrar o papel fundamental que um tribunal independente pode ter para tratar passados abusos e destacar o império da lei”, disse McFarland, da HRW. “A Anistia descobriu que ates de 1990 as violações dos direitos humanos já estavam espalhadas no Peru, e aproveitou o veredito de ontem para pedir uma investigação mais ampla e justiça.

“Agora é vital que todos esses responsáveis por violações dos direitos humanos cometidas no Peru, inclusive antes do governo de Alberto Fujimori, sejam levados aos tribunais”, disse Zuniga. “Os desaparecimentos forçados, a tortura e as violações são crimes que não prescreve quando cometidos de forma propagada, como ocorreu” nesse país, acrescentou. Fujimori, condenado a 25 anos de prisão, já cumpre pena de seis anos de detenção por ter sido considerado culpado em 2007 de ordenar a invasão ilegal de uma casa da mulher separada de Montesinos. Fujimori também será acusado de praticar escutas telefônicas contra figuras da oposição e de ter entregue a Montesinos US$ 15 milhões do governo, entre outras acusações.

Mas o ex-presidente não carece de partidários. Muitos o elogiam por ter freado a inflação e sufocado a insurgência do grupo maoísta Sendero Luminoso durante a “guerra suja” peruana. Seus seguidores contam com 13 cadeiras no Congresso, de 120 membros, e sua filha, a legisladora Keiko Fujimori, é considerada uma das principais candidatas a suceder o atual presidente, Alan García, nas eleições de 2011. E já adiantou que se chegar ao poder indultará seu pai.

Em sua defesa Fujimori disse ao tribunal: “Estive no inferno que instalou o terrorismo e tive de governar desde o inferno”. Acusou Montesinos pelos excessos da contra-insurgência e perguntou por que seus antecessores não foram julgados por violações dos direitos humanos. Espera-se que apele da decisão, mas ativistas acreditam que esta prevalecerá. “Gostaríamos de acreditar que o tribunal continuará mostrando a mesma transparência e imparcialidade que demonstrou durante o julgamento”, disse McFarland. IPS/Envolverde