Boicote à Marielle mostra embaixada da França a serviço do projeto de Bolsonaro

Segundo presidente do PSOL, Juliano Medeiros, embaixada deveria estar protegida de questões políticas. Além de se recusar a ir evento que teria homenagem à vereadora, embaixador Luis Fernando Serra já havia causado polêmica ao enviar carta ao jornal Le Monde para defender o presidente e atacar governadores

Jardim Marielle Franco junto à Gare de l’Est, uma das principais estações de trem da capital francesa (Foto: Reprodução)
Escrito en POLÍTICA el

Documentos e mensagens revelam que o embaixador do Brasil na França, Luis Fernando Serra, cancelou sua participação em eventos que homenageariam a vereadora Marielle Franco, em Paris. Segundo matéria do jornalista Jamil Chade, os telegramas vieram à tona após um pedido de informações da bancada do PSOL que desconfiava da existência de orientações do governo brasileiro para que a embaixada boicotasse o tema. As mensagens revelam que o embaixador segue à risca as ações de Jair Bolsonaro quando o assunto é a execução de Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes.  

Em agosto de 2019, Serra participaria do Congresso da Associação de Brasilianistas na Europa com 540 professores e pesquisadores do Brasil que residem no continente. Em telegrama interno enviado ao Itamaraty, em Brasília, ele disse que tomou a iniciativa de cancelar sua participação quando soube que haveria a homenagem à vereadora brutalmente assassinada.

O embaixador também citou que no mesmo evento a prefeita de Paris, Ana Hidalgo (Partido Socialista), divulgaria o endereço do jardim com o nome da vereadora que seria inaugurado em 22 de setembro. Em outro telegrama, Serra informou que a embaixada do Brasil não foi convidada para a inauguração do Jardim Marielle Franco na capital francesa.

Houve ainda um outro “incidente” envolvendo o embaixador e a memória de Marielle. A senadora francesa Laurence Cohen, do Partido Comunista e presidente do grupo interparlamentar de amizade França-Brasil, questionou o governo Bolsonaro sobre as investigações. Serra, de acordo com o jornalista Jamil Chade, “respondeu agressivamente à legisladora francesa, afirmando que era com ‘profunda consternação’ que observava ‘que o assassinato de Celso Daniel e o ataque à vida de Bolsonaro não tiveram o mesmo eco na França que o assassinato de Marielle, que foi até objeto de uma mobilização da Assembleia Nacional’”.

Em março de 2018, quando o crime ocorreu, Bolsonaro foi o único pré-candidato que não se manifestou. Cerca de um mês depois do assassinato, em abril, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro homenageou Marielle Franco com a Medalha Tiradentes. O único voto contrário foi do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, sendo que anos antes, em 2005, ele havia condecorado o ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega com a medalha. Adriano era apontado como chefe da milícia Escritório do Crime, que faz assassinatos por encomenda, e suspeito de envolvimento no caso Marielle. Ele foi morto em operação policial na Bahia, em fevereiro.

Para o presidente do PSOL, Juliano Medeiros, esse boicote do embaixador não surpreende. “Mais de dois anos do crime, não há nenhuma condenação só prisão de suspeitos. E nós ainda não sabemos quem são os mandantes e qual é a motivação do crime. Quando aconteceu o assassinato a família Bolsonaro não se manifestou solidariamente, pior do que isso fizeram parte de uma rede de difamação para disseminar fake news, tentando associar Marielle ao narcotráfico.”

“São estruturas de Estado, como a embaixada, que deveriam ser de Estado e deveriam estar protegidas das questões políticas, mas têm operado como parte de um projeto político conservador reacionário no Brasil”, disse em entrevista ao programa Fórum Onze e Meia deste sábado (18).  

Polêmica do embaixador com jornal Le Monde

Em maio deste ano, Luis Fernando Serra causou polêmica ao enviar uma carta ao jornal Le Monde para defender o presidente Jair Bolsonaro. O periódico francês publicou um editorial onde criticava a gestão do presidente diante da pandemia do coronavírus, com sua política negacionista. Segundo o editorial, Bolsonaro provocava “caos na saúde e semeava a morte”, ao dizer que a Covid-19 era uma gripezinha, que as pessoas iam morrer mesmo, que ele não era coveiro e defender o fim do isolamento.

Na carta, Serra dizia que o editorial era “profundamente ofensivo” para o Brasil e para “biografia” do presidente. E ainda atacava os governadores. “A politização da pandemia foi liderada pelos governadores opostos ao presidente brasileiro e que viram no estrito confinamento, às vezes brutalmente imposto, a oportunidade de derrubar os excelentes indicadores econômicos apresentados pelo governo em 2019”, disse em texto, elogiado por bolsonaristas do Brasil, como a deputada Bia Kicis (PSL-DF), fiel escudeira do presidente.  

https://twitter.com/Biakicis/status/1265431295271800834