Caixa se recusa a devolver auxílio emergencial sacado por golpista

Professor contou à Fórum que, quando benefício foi transferido para conta digital, valor foi usado para pagar boletos antes que ele soubesse que tinha recebido parcelas; banco diz que está agindo para combater fraudes

Tela inicial do aplicativo Caixa Tem (Foto Divulgação)
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Como milhões de brasileiros que tiveram a renda afetada ou zerada pelos efeitos pandemia do novo coronavírus, o professor de música Aguinaldo Martinucci, 50 anos, morador de Trancoso (BA) se inscreveu para receber o auxílio emergencial.

Depois de ter duas parcelas depositadas no Banco do Brasil, ele contou à Fórum que ficou dois meses sem ganhar nada porque houve uma mudança de calendário para quem não recebia na Caixa. O valor, disse, estava sendo usado para pagar o aluguel e sua alimentação.

Em setembro, quando deveria voltar a receber, descobriu que a quantia estava retida em uma conta digital aberta na Caixa que ele desconhecia. Baixou o aplicativo Caixa Tem. E descobriu que a conta, que até então nem sabia que existia, estava apenas com R$ 0,49. Puxou o extrato e viu que as parcelas tinham sido depositadas, mas o dinheiro fora usado para pagar dois boletos.

“Óbvio que algo estava errado”, disse ele à Fórum. “Nunca fiz compra alguma e nem mesmo possuía ou sabia da necessidade de ter o aplicativo da Caixa”, afirmou. Precisou ir a uma agência da Caixa, mas a mais próxima era em Porto Seguro - a um ônibus e uma balsa de distância. Martinucci, que até então se mantinha isolado para não contrair o coronavírus, teve que enfrentar o medo de aglomeração e ir ao posto de atendimento.  

Contestação

Na agência, depois de seis horas de fila, a atendente descobriu que os dois boletos eram referentes a compras feitas por uma mesma pessoa, que ele diz não conhecer, e que o professor deveria preencher um formulário de contestação. A resposta viria em 20 dias. E quando veio, foi negativa. “Desesperador”, disse ele.

Martinucci conta que se mudou de Curitiba para Trancoso porque havia passado em um concurso de início imediato para lecionar na rede pública local. Só que, com a pandemia e o fechamento das escolas, ele não chegou a tomar posse do cargo. Com isso, os R$ 600 do auxílio vinham sendo sua única fonte de renda, usada para pagar o aluguel e a alimentação.

“Qual o sentido de o governo ter disponibilizado compras ou pagamentos via aplicativo em vez de simplesmente liberar o valor para o auxiliado?”, questiona ele. “E por que, se a Caixa está ciente de tantas fraudes, eu devo provar que não realizei uma comprar que não está em meu nome, que não poderia ter sido feita por mim pois eu não possuía o aplicativo e a Caixa tem esses dados?”

Martinucci não é a única vítima de fraude no auxílio emergencial. Outras ocorrências semelhantes vêm sendo denunciadas. Uma pesquisa no site Reclame Aqui já dá conta de casos parecidos com o do professor: quando o auxílio passa a cair na conta digital, com acesso pelo app, as parcelas são sacadas ou usadas para pagar boletos.

Posição da Caixa

Procurada pela Fórum, a Caixa informou, por sua assessoria de imprensa, que “pedidos de contestações de saque podem ser solicitados” pelos clientes nas agências do banco. A instituição escreveu na nota que “os processos são analisados com a máxima celeridade”. E que, no caso de negativa do pedido, poderá ser solicitada a reanálise na agência. Martinucci disse que faria esse pedido de reanálise.

Questionada sobre o caso de Martinucci, a Caixa respondeu que “os resultados das análises são repassados diretamente aos interessados”.

Sobre as fraudes, o banco informou que tem tomado diversas medidas para evitá-las. Destacou algumas: validação digital de dados dos clientes em bases internas e externas; validação documental por imagem; monitoramento de cadastros; monitoramento de transações; atuação junto à Polícia Federal para investigar atuações de quadrilhas.

A Fórum ainda perguntou quantas contestações do tipo a instituição recebeu e quantas foram aceitas, mas a Caixa não respondeu.