Cenas apocalípticas

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Foto: Jaume d?Urgell/Flickr

Os habitantes de Gaza que sobreviveram à ofensiva militar israelense de 22 dias, chamada Operação Chumbo Derretido, começam a sair de seus abrigos e tentam reconstruir suas vidas. “As pessoas sentem-se aturdidas e confusas. Muitos procuram desesperadamente entrar em contato com familiares e amigos através das poucas linhas telefônicas que restam e funcionam, para saber se estão vivos ou feridos”, disse à IPS Abdala Al Agha, de Khan Yunis, no sul da Faixa de Gaza. “Outros abandonaram os abrigos da Organização das Nações Unidas pela primeira vez em dias, para ver se resta algo de suas casas”, acrescentou.

Elena Qleibo, trabalhadora humanitária da organização Oxfam e ex-embaixadora da Costa Rica em Israel, disse à IPS que partes do território palestino parecem cenas do Apocalipse. “A destruição em Beit Lahiya, norte da Faixa de Gaza, e no subúrbio Zeitoun, a leste da cidade de Gaza, é imensa”, afirmou. “O esgoto inunda as ruas. As torres de alta tensão, as obras dos serviços de água e saneamento, os prédios municipais e da área da saúde, as casas... tudo foi derrubado”, prosseguiu Elena.

As estimativas iniciais indicam que 15% dos edifícios da Faixa de Gaza foram danificados e cerca de 30 mil habitantes foram obrigados a buscar abrigo em locais da Agência das Nações Unidas para os Refugiados da Palestina no Oriente Médio (UNRWA). Um terço dos quase 1.300 palestinos mortos devido à ofensiva iniciada em 27 de dezembro era de meninas e meninos. O número de feridos chega a quatro mil.

As pessoas estão muito irritadas, e o grau de ódio a Israel é muito alto. Vivi e trabalhei em Gaza muitos anos e nunca vi tanto ódio na população”, disse Elena Qleibo. Os habitantes de Gaza não culpam o, Hamás. “As pessoas riem das afirmações de que esta foi uma guerra contra a organização de resistência islâmica e não contra os civis”, acrescentou a funcionária da Oxfam. “Eles consideram que se tratou de uma guerra contra todos os palestinos. O número de civis assassinados ou mutilados e a destruição foi muito grande”, disse.

“A escala de morte e destruição é definitivamente contraproducente. Ao longo de todo este conflito, muitos especialistas e líderes globais destacaram que não há solução militar para o conflito, e que é necessária uma solução política”, disse o chefe da UNRWA, John Ging, à agência de notícias Maan. O principal complexo dessa agência da ONU em Gaza, onde são alimentados 750 mil refugiados, metade da população total, foi destruído em um ataque israelense no dia 15 deste mês. Ging disse que 50 caminhões com ajuda entraram em Gaza no sábado, dia em que Israel anunciou o cessar-fogo unilateral.

“Entretanto, precisamos de centenas de caminhões. As necessidades crescem de forma exponencial e o canal para fornecimentos humanitários é muito estreito. Mesmo aqueles, como os funcionários da Autoridade Nacional Palestina, que não dependiam da assistência da UNRWA, agora dependem dela. Não há na nos mercados e não há dinheiro”, disse Ging. “Não podemos ficar vendo os pontos de passagem permanecerem fechados. É preciso haver um futuro melhor. As pessoas comuns pagam o preço deste conflito e desta operação durante o cerco. Para eles, sua única prioridade é recuperar a dignidade para sua existência”, acrescentou. O bloqueio de Gaza “levou milhares de pessoas à dependência da ajuda humanitária contra sua vontade. Isso tem de acabar. É necessário encontrar uma solução que priorize as necessidades da população comum”, ressaltou Ging.

O Egito permitiu que 42 palestinos feridos graves passassem pelo posto fronteiriço de Rafah no sul para serem levados a hospitais dopais. Além disso, toneladas de suprimentos médicos internacionais e três ambulâncias do Qatar entraram em Gaza. Quarenta e nove médicos estrangeiros colaboram nos hospitais palestinos. Além de remédios, 401 toneladas de alimentos doados por Líbia, Marrocos, Omã e Jordânia entram em Gaza através do Egito. Outras 90 toneladas entraram por um posto israelense. Organizações da sociedade civil egípcia doara cerca de 12 mil cobertas para substituir as destruídas em um ataque israelense contra um edifício da ONU.

“Enquanto se precisa desesperadamente de comida e remédios, também é imperativo que no longo prazo haja tratamento urgente psico-social para a população, severamente traumatizada”, disse Elena Qleibo à IPS. Enquanto isso, equipes de resgate tentam retirar cadáveres das montanhas de escombros, o que havia sido impedido antes pelos soldados israelenses. Uma vez que todos os corpos sejam resgatados, certamente o número de mortos aumentará. (IPS/Envolverde)