Chico D'Angelo: Olimpíadas em tempos de ameaça

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"Quando o Rio de Janeiro conquistou o direito de sediar as Olimpíadas de 2016, durante o governo de Lula, que se empenhou pessoalmente para trazer os jogos, o Brasil vivia um momento de euforia no campo da cultura. Paradoxalmente, a realização dos jogos acontece em um momento em que essa dimensão inclusiva, construída nos últimos anos, se encontra ameaçada. Nada mais contrário ao espírito plural das Olimpíadas, afinal, que o ministério branco e masculino do governo interino de Michel Temer" Por Chico D'Angelo* Em tempos de Jogos Olímpicos e Paralímpicos, nunca é demais lembrar que cultura e esporte não são áreas que caminham separadas. O direito à prática do esporte e ao acesso a bens culturais, sobretudo entre os jovens, traz com ele uma questão da maior relevância: precisamos, em tempos de radicalizações e rupturas, desenvolver nas crianças práticas de convivência e sentimentos de inserção e pertencimento à sociedade. Cultura e esporte são, portanto, campos fundamentais de construção de sociabilidades. Há que se entender também, que a realização dos Jogos Olímpicos é uma excelente oportunidade para pensarmos em dois pontos fundamentais na reflexão sobre as culturas dos povos: as ideias de pluralidade e unidade. As Olimpíadas e Paralimpíadas, afinal, são marcadas pelo encontro entre atletas oriundos de culturas extremamente diversificadas: línguas, tradições, hábitos, maneiras de se comer, dançar, cantar, compartilhar, vestir, rezar, celebrar; toda essa pluralidade que faz a riqueza cultural do mundo, fundada na diversidade e no respeito às diferenças, se concentra na cidade que sedia os jogos. Ao mesmo tempo, as diferenças que poderiam ser fatores de distanciamento, desconfianças e dissabores, acabam se encontrando na unidade da prática desportiva e no congraçamento proporcionado pela realização dos jogos. Articular essa abertura que o esporte dá ao encontro entre diferentes às práticas e reflexões sobre o campo da cultura é não apenas pertinente, mas necessário. Quando o Rio de Janeiro conquistou o direito de sediar as Olimpíadas de 2016, durante o governo de Lula, que se empenhou pessoalmente para trazer os jogos, o Brasil vivia um momento de euforia. No campo da cultura, as ações implantadas pelo ministério de Gilberto Gil, entre 2003 e 2008, colocaram na pauta dos debates a percepção das pluralidades de práticas culturais e a ideia do estado como reconhecedor, e não como simples formulador, de saberes diversos. As políticas afirmativas também caminhavam no sentido de ampliar o arco de representatividade das populações historicamente reprimidas, com o reconhecimento dos direitos das minorias como elemento fundamental para a construção de uma sociedade mais generosa. Paradoxalmente, realização dos jogos acontece em um momento em que essa dimensão inclusiva, construída nos últimos anos, se encontra ameaçada. Nada mais contrário ao espírito plural das Olimpíadas, afinal, que o ministério branco e masculino do governo interino de Michel Temer. Aliás, o interino ali dava um sinal totalmente contrário ao que significa a arte e o esporte: nas duas esferas as palmas são reservadas unicamente para quem com esforço ganha o reconhecimento do público pelos méritos que possui. A Temer, as merecidas vaias em uma cerimônia de abertura que mostrou um Brasil diverso, o Brasil de Lula e Dilma, que o governo atual pretende destruir. Que os jogos sirvam, portanto, de alerta também para os setores progressistas. O momento de celebração da diversidade acontece em um contexto em que ela se encontra duramente ameaçada. O esporte e a cultura, neste sentido, nos servem de lição e convite à ação. Tomara que a chama olímpica fortaleça o caminho que devemos tomar: o do respeito às diferenças, apreço pela democracia fragilizada e batalha incessante em defesa da fraternidade entre os povos. *Chico D'Angelo é deputado federal pelo PT-RJ e presidente da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados Foto: Sputniknews