Deputadas da oposição entram com projeto para anular portaria que dificulta aborto legal

Norma publicada pelo Ministério da Saúde obriga médico a denunciar estupro sofrido pela paciente e viola sigilo profissional

Manifestação contra a cultura do estupro (Foto: Fotos Públicas)
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Treze deputadas da oposição ao governo Jair Bolsonaro (sem partido) protocolaram nesta quinta-feira (24) na Câmara dos Deputados um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) para anular a portaria do Ministério da Saúde que, na prática, dificulta o aborto legal.

A portaria 2.561/2020 foi publicada nesta quinta-feira (24) no Diário Oficial da União. Entre outras regras, ela obriga o médico a denunciar o estupro sofrido pela vítima que procura o serviço de saúde. A medida viola o Código de Ética Médica, que prevê a confidencialidade da relação entre o profissional de saúde e seu paciente.

Ela substituiu outra portaria semelhante, a 2.282/2020, publicada em agosto. Para justificar a nova norma, o Ministério da Saúde retirou do texto a previsão de que a equipe médica propusesse à vítima de estupro que ela visse o feto em um exame de ultrassom.

A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que assina o PDL, disse que esse ponto retirado da nova regra era uma tortura à vítima de violência sexual. No entanto, destaca que a portaria mais recente “mantém todos os outros itens, que violam a Constituição, violam a legislação, violam o Código Penal, violam o Código de Ética Médica”.

Jandira afirmou ainda que a nova portaria, assim como a anterior, “também impõe constrangimentos, travas burocráticas e dificulta o acesso ao direito de realização do aborto legal nos casos previstos em lei”.

São autoras também do PDL as deputadas Alice Portugal (PCdoB-BA), Erika Kokay (PT-DF), Maria do Rosário (PT-RS), Sâmia Bomfim (PSOL-SP), Teresa Nelma (PSDB-AL), Lídice da Mata (PSB-BA), Rosa Neide (PT-MT), Luiza Erundina (PSOL-SP), Fernanda Melchionna (PSOL-RS), Áurea Carolina (PSOL-MG), Talíria Petrone (PSOL-RJ) e Gleisi Hoffmann (PT-PR).

Ação no STF

A parlamentar lembrou que há uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a portaria anterior. “O governo tenta driblar esta ação fazendo uma nova portaria maquiando suas decisões”, disse.

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 737 foi impetrada no início de setembro no STF por cinco partidos: o PCdoB, de Jandira, e mais PT, PSOL, PDT e PSB. Ela é relatada pelo ministro Ricardo Lewandowski e tem julgamento previsto para esta sexta-feira (25).

Para a advogada Luciana Boiteux, uma das responsáveis pela ação, a publicação da nova portaria foi uma “chicana contra o STF”, por ter anulado a medida contra a qual corria processo na véspera de seu julgamento.

Pautar no Congresso

Jandira solicitou ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que paute a votação do PDL que ela protocolou.

No início de setembro, Maia já havia dito que a portaria anterior era “ilegal e absurda”.  “Não é o Ministério da Saúde que pode tomar a decisão como tomou, uma interferência numa lei. A melhor decisão é que o governo pudesse recuar, se isso não ocorrer, devemos ter voto aqui na Câmara ou ir ao Supremo Tribunal Federal para sustar uma portaria ilegal”, afirmou na época.