Espaço aberto, um processo ou assumuir bandeiras ou se relacionar com partidos?

Escrito en NOTÍCIAS el

O Fórum Social Mundial deve ser um espaço aberto, buscar ser um processo ou assumir bandeiras e se relacionar com partidos políticos por agendas de mudança? Os rumos do FSM são rediscutidos constantemente e, aos nove anos, o movimento continua a debater a questão. Assim como há muita diversidade de áreas de ação e metodologias de trabalho, também há divergências sobre para onde o Fórum vai. Um desses momentos foi o painel Abordando criticamente os princípios subjacentes ao Fórum Social Mundial, organizado pela Critical Action Centre Movement (Cacim).

"Senti um alívio nesta manhã ao chegar ao me dar conta de que o FSM não perdeu seu toque: sempre somos capazes de reproduzir o mesmo caos", diverte-se o indiano Amit Sengupta, secretário-geral da All India Peoples Science Network e membro do Comitê de Trabalho do Fórum de seu país. "Esse caos não necessariamente é um problema, porque muita criatividade pode emergir dele", emenda.

Ele defende que o evento permaneça como espaço aberto, mas chamou atenção para a necessidade de os movimentos sociais assumirem posições mais claras, usando o FSM como plataforma. Sengupta criticou ainda o que considerou falta de representatividade dos membros do Conselho Internacional, formado por organizações sociais de todo o mundo. "Um dos desafios do Fórum é sua governança, buscar uma estrutura tão horizontal quanto possível para ficar mais próximos de quem participa dos eventos, mas essa representatividade não é alcançada hoje", explica.

Uma forma diferente de garantir estruturas mais horizontais foi defendida por Cindy Weisner, coordenadora da Grassroot Global Justice Alliance, sediada nos Estados Unidos, onde participou da organização do Fórum do país, em Atlanta, em 2007. "Em 1999, em Seattle, foi um momento decisivo", lembra. Uma das questões era o fato de muita gente não estar vinculada a nenhum movimento social, o que colocava em dúvida quem poderia participar do Fórum Social Mundial quando ele surgiu. Estar alinhados e conectados com outros movimentos do mundo era uma questão vital até pela "localização geográfica", quer dizer, por estarem na sede da maior potência econômica, política e militar do mundo.

Para o segundo Fórum Social Estados Unidos a estratégia é de organização de fóruns locais e regionais no país para garantir horizontalidade, transparência e representatividade inclusive de negros, mulheres, do movimento LGBT etc. A opção poderia ser adotada em outras partes, com menos fóruns mundiais -- menos mídia, portanto -- mas mais possibilidades de articulação.

Relação com partidos
Um dos pontos mais polêmicos diz respeito à possibilidade de se dialogar com partidos polícos mais próximos dos ideais dos movimentos que participam do Fórum. O professor de estudos sociais da Universidade de Harvard, Thomas Ponniah, autor de um dos primeiros livros sobre o movimento altermundista nos Estados Unidos, defendeu que essa pode ser uma forma de fazer o Fórum ir além e conquistar mais resultados.

O FSM emergiu, segundo ele, como uma primeira reaglutinação depois da derrocada de três experiências de esquerda: o Estado de bem-estar social, nos países europeus e na América do Norte, do regime comunista na União Soviética e Leste Europeu, e do projeto Bandung (batizada com o nome da cidade onde ocorreu a conferência em 1955 que defendia intervenção do Estado na economia capitalista). "Naquele momento, os grupos dispersos puderam se aglutinar dentro da idéia do evento como espaço aberto, com diálogo entre ambientalistas, feministas, anarquistas etc. levando em conta as diferenças culturais e compromisso com a democracia participativa", resume.

Passados nove anos, alguns novos projetos de Estado surgiram, o que traria a necessidade de diálogo. "As manifestações em todo o mundo contra a guerra [do Iraque] em 2003 foram muito importantes e o Fórum teve papel central para isso", exemplifica Ponniah. "Mas não param a guerra, o que aconteceu, no caso da Espanha, foi que a população elegeu um governo socialista que tirou o país do conflito", explica. O que ele defende é que se construam espaços específicos para diálogos com partidos nos Fóruns. Combinados a ações globais, ele acredita que se consiga ampliar a capacidade de se promover transformações sociais.

Mas quando o assunto é a participação dos presidentes sul-americanos Luiz Inácio Lula da Silva, Hugo Chávez, Rafael Corrêa; Evo Morales e Fernando Lugo, o indiano Jai Sen, do Cacim, é incisivo: "Não podemos nos iludir, eles estão aqui porque precisam da legitimidade do Fórum."

O debate da Cacim e de outras organizações sobre o Fórum deve prosseguir nos próximos dias.