Estupros e violência: mulheres sequestradas pelo Boko Haram relatam cotidiano no cativeiro

234 mulheres e crianças foram libertadas no último domingo por Exército nigeriano; muitas delas estão grávidas dos jihadistas

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234 mulheres e crianças foram libertadas no último domingo por Exército nigeriano; muitas delas estão grávidas dos jihadistas Por Opera Mundi
“Me transformaram em um objeto sexual. Faziam revezamento para se deitarem comigo. Agora estou grávida e não sei quem é o pai”. O relato da jovem A. A. de 23 anos, que passou seis meses sequestrada pelo grupo Boko Haram e foi libertada no último domingo (03/05) pelo Exército nigeriano, é uma síntese das situações a que foram submetidas as mais de 200 mulheres mantidas em cativeiro pelo grupo. A gravidez tampouco é exceção. Entre as libertadas, várias esperam filhos dos combatentes, fruto das diversas violações. De acordo com o Exército nigeriano, cerca de 700 pessoas foram resgatadas nas últimas ofensivas contra o grupo. Neste domingo (03/05) foram libertadas 234 mulheres e crianças. Em declarações concedidas a meios de comunicação locais, as jovens relataram um cotidiano de estupros, casamentos forçados e até a obrigação de combater ao lado dos jihadistas. As jovens foram libertadas na última semana e o último grupo deixou o cativeiro neste domingo (03/05). Agora, se encontram em campos de refugiados no noroeste da Nigéria.De acordo com o médico Babatunde Osotimehin, diretor executivo do Fundo de População das Nações Unidas, “algumas estão visivelmente grávidas e outras tiveram exame positivo para gravidez”, afirmou. “Cada dia morria alguma de nós e apenas esperávamos que chegasse a nossa vez. Não era permitido que nos movêssemos sequer um centímetro, até para ir ao banheiro nos acompanhavam”, disse A. U. aos jornais. Além das mortes em cativeiro, outras morreram durante o resgate. Isso porque os integrantes do Boko Haram exigiram que elas os acompanhassem na fuga, mas muitas se negaram. “Quando nos negamos, começaram a nos apedrejar. Apertei meu bebê contra meu estômago para protegê-lo e me encolhi”, conta L. M., de 27 anos. “Algumas morreram por causa das pedras”, acrescenta. Houve também mortes provocadas pela ação dos militares que ali estavam para salvá-las. Soldados não perceberam "a tempo que não éramos os inimigos" e algumas mulheres e crianças foram "atropeladas por seus caminhões", disse A. U. à agência de notícias Reuters.O assassinato de pais e maridos diante das mulheres também é algo presente em diversos depoimentos. “Sequestraram toda minha família e mataram meu marido no bosque de Kilkasa quando eu estava grávida de quatro meses. Me disseram que quando o bebê nascesse me casariam com um de seus comandantes. Passavam dias sem que nos dessem comida ou água, até que há três dias, na noite antes de ser libertada, dei à luz a uma menina”, contou L. M. à BBC. Segundo a Anistia Internacional, cerca de duas mil mulheres e meninas foram sequestradas pelo grupo Boko Haram no último ano. As 219 meninas sequestradas da escola de Chibok em abril de 2014 ainda não foram encontradas. Algumas delas conseguiram fugir, mas o grupo segue em paradeiro desconhecido. O caso ganhou repercussão internacional no último ano e foi responsável pelo aumento da visibilidade do grupo Boko Haram, cujo nome significa “religião ocidental é pecado” e atua na Nigéria desde 2009. A violação de mulheres em contexto de guerra não é prática exclusiva dos jihadistas. Em artigo publicado em Opera Mundi, a jornalista e integrante do coletivo feminista Casa de Lua Marina Terra observou que “crimes sexuais contra mulheres e meninas são uma praga global. E se inserem não somente em contextos de guerra deflagrada tradicional, mas também de guerra não convencional. Em ambas, há o uso político da violação: a partir da conquista territorial do corpo feminino, se vence uma trincheira diferente. Além disso, a mensagem de domínio masculino é muito clara e significativa, como a expressada pelo Boko Haram no rapto de abril [das garotas de Chibok], mas como também em diversos outros casos de uso sistemático da violência sexual contra mulheres ao longo da história”. Foto: Creative Commons/AK Rockefeller

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