EUA: Cinco previsões para depois das eleições

A maioria dos economistas concorda que, na melhor das hipóteses, os EUA podem esperar uma “década perdida” de estagnação econômica – na pior, um duplo mergulho na recessão/depressão

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A maioria dos economistas concorda que, na melhor das hipóteses, os EUA podem esperar uma “década perdida” de estagnação econômica – na pior, um duplo mergulho na recessão/depressão Por Shamus Cooke, do Counterpunch. Tradução de Luis Leiria para o Esquerda.net É verdade que Barack Obama e Mitt Romney têm muitas diferenças políticas. Mas também estão de acordo em muitas políticas essenciais; o suficiente para tornar os próximos quatro anos facilmente previsíveis, seja quem for o vencedor. Eis cinco previsões baseadas nas mais importantes convicções que os dois candidatos partilham: 1) A guerra contra os sindicatos vai continuar. Os republicanos são explicitamente contra os sindicatos, enquanto os democratas são a favor em palavras, mas têm uma prática anti-sindical. A muito falada “Race to the Top”, política educacional nacional de Obama, atinge diretamente os sindicatos de professores – os mais poderosos sindicatos do país – atacando os direitos adquiridos por tempo de serviço e restringindo salários e benefícios. Também os governadores democratas e republicanos, estado a estado, pretendem arrancar gigantescas concessões dos funcionários públicos ou retirar-lhes os direitos sindicais – a menos má política de exigir concessões (democratas) está apenas um passo atrás do fim da negociação coletiva (republicanos). À medida que a recessão avança, esta política bipartidária contra os sindicatos irá intensificar-se, qualquer que seja o presidente. O alvo é baixar os salários de todos os trabalhadores, já que, dizem eles, os sindicatos distorcem artificialmente o mercado laboral em benefício dos trabalhadores em geral; atacar os sindicatos é assim um ataque a todos os trabalhadores, organizados ou não, com o objetivo de reduzir os custos laborais das empresas, que ganham assim “lucratividade”. 2) A guerra contra o meio ambiente vai continuar. Ambos os partidos tratam a questão ambiental da mesma maneira que o trabalho organizado. Os republicanos degradam-no abertamente e os democratas fazem declarações pró-ambientais ao mesmo tempo que praticam o oposto. Quem quer que vença as eleições continuará vinculado aos combustíveis fósseis, continuará a promover as prospeções de petróleo perigosas no Ártico e no Golfo, a causar estragos com a extração de “gás natural”, a construir o oleoduto Keystone, ao mesmo tempo que pouco ou nada fazem para construir a absolutamente necessária infra-estrutura energética alternativa que iria criar empregos e esperança à Humanidade contra as alterações climáticas. Obama e Romney recusam-se a tomar as medidas necessárias para enfrentar as alterações climáticas porque fazê-lo poria em causa os lucros das grandes empresas poluidoras. Nenhum dos candidatos presidenciais sequer dará início a uma honesta discussão pública sobre o problema, fazendo assim com que outros países sigam esse caminho, pondo-nos a todos em perigo. 3) Wall Street continuará a reinar. Durante os debates ficou claro que não era necessária qualquer outra ação contra Wall Street. Mas os bancos estão maiores sob Obama que na era de Bush, o que significa que continuam a ser “demasiado grandes para falirem”, garantindo que haverá futuros resgates pagos pelos contribuintes. A política da Reserva Federal não é controversa para republicanos ou democratas: as taxas de juros baixas combinadas com a emissão de largas somas de moeda – chamado de “quantitative easing” – têm ambas servido os lucros dos bancos de Wall Street, ao mesmo tempo que todos os restantes sofrem cortes nos salários e benefícios. Os empréstimos aos trabalhadores não foram facilitados, enquanto os bancos e as empresas estão literalmente sentados sobre biliões de dólares de reservas em dinheiro. 4) Cortes de austeridade nacionais após as eleições. O déficit nacional é consequência do resgate aos bancos, às guerras externas e a décadas de sucessivas reduções dos impostos aos ricos e às empresas. Obama e Romney ignoram estes factos, e são a favor de reduções maciças de empregos e cortes nos programas sociais que entrarão em vigor se republicanos e democratas não chegarem a acordo sobre quantos bilhões de dólares de cortes vão aplicar (a proposta de plano de corte de déficit de Obama seria de 4 bilhões de dólares; Paul Ryan quer 6 bilhões). E apesar de Obama ter feito muito barulho sobre “cobrar impostos aos ricos” para ajudar a combater o déficit, as mesmas promessas foram feitas nas eleições anteriores e acabaram em nada quando ele mesmo manteve as reduções de impostos que Bush promovera para os ricos. Fazer com que os ricos paguem impostos é a única alternativa aos cortes, já que os trabalhadores pouco têm para pagar mais. Em vez disso, Obama está usando o déficit para justificar cortes maciços do Medicare, na educação pública, no subsídio de desemprego, e provavelmente noutros programas da Segurança Social. O debate de Obama/Romney sobre o déficit é, na realidade, uma discussão bem educada sobre como melhor cortar e queimar programas sociais, ao mesmo tempo em que as diferenças são exageradas para o bem das respetivas campanhas eleitorais. 5) As guerras externas vão continuar. Ouvir Obama e Romney a debater as guerras externas foi muito semelhante a um debate do tipo Pepsi/Coca-Cola. Ambos amam Israel, odeiam o Irã e a Síria, mentem sobre um calendário para o Afeganistão (nenhum analista sério acredita que os EUA saiam do Afeganistão em 2014). Ambos são a favor de continuar a bombardear com drones o Paquistão, o Iêmen e a Somália,o que constitui obviamente crime de guerra. Ao mesmo tempo, ambos acusam hipocritamente a Síria de “violações dos direitos humanos”. Em resumo, ambos candidatos discutem como melhor empurrar o Médio Oriente e o Norte de África na direção de uma guerra regional, sem receberem as culpas por isso. Na verdade, existem sim diferenças de política social entre o presidente Obama e Mitt Romney. Mas as políticas descritas acima vão afetar profundamente todos os trabalhadores dos Estados Unidos. O país não está numa recessão típica. A maioria dos economistas concorda que, na melhor das hipóteses, os EUA podem esperar uma “década perdida” de estagnação econômica – na pior, um duplo mergulho na recessão/depressão. As políticas descritas acima estão desenhadas tendo em conta o pior cenário, com a premissa de que para que o capitalismo se reestabilize, é necessário aumentar o poder dos bancos e das empresas, que têm de perder quaisquer restrições em relação à questão laboral, ambiental, e outras regulamentações, de forma a aumentarem os seus lucros, em detrimento de todos nós. Assim, democratas e republicanos têm a mesma agenda na generalidade, uma agenda que todos os trabalhadores deveriam considerar detestável, já que os ganhos das grandes empresas são obtidos à nossa custa. Quando os trabalhadores se organizam e vão à luta, como fizeram os professores de Chicago, todas as ilusões nos democratas começam a desvanecer-se, porque as pessoas veem com os próprios olhos que os democratas não só se recusam a ajudá-las, mas opõem-se-lhes ativamente, tal como fizeram aos professores de Chicago. Acontecimentos como este permitirão a emergência de um movimento real que ponha em causa a agenda bipartidária dominada pelos grandes negócios. Até que os grupos de trabalhadores e comunitários se unam numa base alargada em ações independentes contra a citada agenda bipartidária, seremos sempre arrastados ao apoio a um dos dois candidatos, nenhum dos quais defende os nossos interesses básicos. (*) Shamus Cooke é trabalhador do serviço social, sindicalista e escreve para o Workers Action. Email: [email protected]