Fórum nas bancas: Balança desequilibrada

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No Brasil, cerca de dois terços da população brasileira não têm condições de pagar advogados. Isso significa, em muitas ocasiões, que os mais pobres forçosamente têm que abrir mão de direitos fundamentais, já que não contam com profissionais que possam fazer a sua defesa. Com a Constituição Federal de 1988, ficou expressamente prevista a criação das Defensorias Públicas, que seriam um instrumento de acesso à justiça utilizado pelos mais necessitados. Mas sua implantação e ampliação ainda caminham a passos lentos no país.

As Defensorias Públicas ainda não existem em Goiás, Paraná e Santa Catarina. Em outros 18 estados não possuem estrutura suficiente para garantir sequer um representante por comarca, onde há juízes e promotores de plantão. Dentre estes, a situação é pior no Maranhão, em São Paulo e no Piauí, que não chegam atender 10% de seu território (veja tabela com as comarcas atendidas). Números do Ministério da Justiça, publicados no último Diagnóstico da Defensoria Pública, de 2006, mostram que, em média, os estados gastam 24,37% do orçamento do Judiciário com o Ministério Público e 3,33% com a Defensoria. “Percentual claramente insuficiente diante da constatação de que mais de 70% da população precisaria acessá-la”, conclui o estudo, apontando que além das famílias com baixa renda há aquelas com comprometimento de quase todo o orçamento com doenças ou educação.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), que desenvolve um estudo sobre a relação entre acesso a justiça e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em parceria com o Ministério da Justiça destaca que “em regra, os serviços são menos abrangentes nas unidades da Federação com os piores indicadores sociais”. Um indício de que a falta de acesso à Justiça não apenas é reflexo da desigualdade como colabora para que ela seja perpetuada.

Em junho deste ano, um questionário foi enviado a todos os defensores públicos do país para dar início a um diagnóstico atualizado. O presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), André Luís Machado de Castro, acredita que haverá avanços em itens como criação de cargos e até na “interiorização”, mas ainda assim serão insuficientes. “Houve progresso, sim, mas ainda estamos muito longe de atender à obrigatoriedade constitucional. Além disso, o sistema judiciário como um todo cresce”, diz. Entre 2004 e 2006, por exemplo, o número absoluto de comarcas atendidas pela Defensoria Pública aumentou em 19,9%, mas a cobertura percentual diminuiu porque o crescimento de comarcas foi de 27,2%.

O Secretário Nacional de Reforma do Judiciário, Rogério Favreto, em resposta à Fórum, enviou nota comunicando que não há prazo estabelecido para que os estados criem as Defensorias Públicas. “A competência para criação destas é do Executivo Estadual, que deve encaminhar projeto de lei criando a instituição. O trabalho do Ministério da Justiça tem sido o de dialogar com os estados, fomentando a criação da instituição nos moldes previstos na Constituição Federal”, disse. Segundo ele, como o alcance depende da criação de cargos em cada estado, o Ministério busca “modernização e aprimorar as estruturas”. As linhas gerais para criação e organização das Defensorias Públicas Estaduais, diferentemente da do Distrito Federal e da União, foram delegadas para competência de cada Unidade Federativa, com iniciativa do Governador do Estado condicionada a aprovação pela Assembleia Legislativa.

No Paraná, o governo defende que existe Defensoria Pública, embora ela não seja reconhecida pelo Executivo Federal. O estado mantém um prédio que institui para defender um cidadão profissionais de outras áreas do governo. “A maioria das pessoas é atendida por estagiários que só pedem assinaturas de um advogado”, critica Solange Aparecida de Souza, presidente da Organização Jurídica de Apoio ao Cidadão, ONG que presta serviços jurídicos gratuitos. “Muitas pessoas com câncer só recebem remédios caros do governo depois de pedir judicialmente e, em geral, só quem tem advogado pede”, exemplifica.

Uma das assistidas pela ONG, a auxiliar-administrativa de Curitiba Daiane Wercy, ficou surpresa ao saber que tinha direito a um advogado gratuitamente. “Faz três anos que procuro um advogado e já fui em todas as repartições que me indicaram. Nunca me falaram sobre Defensoria Pública”, diz. Com uma remuneração mensal de R$ 420, ela tenta buscar na Justiça o direito a pensão alimentícia da filha de 12 anos para complementar a renda. “Cheguei a pagar advogado, mas ele se mudou e não me avisou. Preciso muito do dinheiro para dar uma roupa e até uma comida melhor para ela”, conta.

No terceiro estado sem Defensoria Pública, Goiás, o órgão foi criado por lei aprovada em 2005, mas ainda não funciona por falta de profissionais. O primeiro concurso público está previsto para este ano e o início do trabalho para 2010. Enquanto isto, o Conselho Nacional de Justiça solicitou ao Distrito Federal o empréstimo de 12 defensores que farão mutirões eventuais nas penitenciárias do estado.

Em São Paulo, a Assembleia Legislativa recebeu em junho projeto do Executivo que abre concurso para contratar mais 100 defensores públicos e elevar o total para 500. O número ainda é baixo comparado com estados como o Rio de Janeiro, que tem Defensoria Pública desde 1954 – a mais antiga do país – e atualmente conta com 752 profissionais.

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