Gordinhas dizem não!

A educadora e blogueira Ana Rita Duarte, especialista em Educação em Direitos Humanos e feminista, analisa o assédio machista contra mulheres fora dos padrões

Quadro da artista Mara Siaca (Reprodução)
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A educadora e blogueira Ana Rita Duarte, especialista em Educação em Direitos Humanos e feminista, analisa o assédio machista contra mulheres fora dos padrões 

Por Ana Rita Duarte, para o Blogueiras Feministas

[caption id="attachment_24182" align="alignleft" width="300"] Quadro da artista Mara Sicca (Reprodução)[/caption]

“Na luta das mulheres contra a balança, a gente que sai ganhando”

Essa frase eu ouvi a uns dias atrás quando estava próxima a um grupo de caras que conversavam sobre os planos para o final de semana. Um dos rapazes comentou que estava com tanta vontade de transar, que naquele dia “comeria” até uma mulher gorda. Nisso um outro rapaz complementa dizendo que então o dia estava ganho, porque mulher gorda não diz não, ela transa com qualquer homem, as gordinhas aceitam qualquer coisa.

Esse diálogo grotesco acabou me lembrando que há um bom tempo atrás existiam (devem existir ainda) comunidades pelo Orkut voltadas especificamente para mulheres gordinhas: Sou gordinha linda, sou gordinha e feliz, gordinhas sexys. Nesses espaços mulheres com os corpos fora do padrão de beleza se encontravam para conversar sobre suas frustrações, qualidades, expectativas, baixa estima, autoestima.  Outra questão marcante desses espaços: o número imenso de homens que surgiam para cantar as garotas. Cantar, elogiar, falar pornografia, convidar para um sexo escondido e rápido, pois a mulher gordinha não diz não. Alias, ela não pode dizer não. Para esses homens, esses locais eram verdadeiras lojas de produtos de segunda mão. Era um serviço rápido, um produto com defeitos, mas que fazia o serviço básico, que é abrir as pernas.

Lembro-me aqui da “piada” de que para algumas mulheres o estupro é na verdade um favor, elas deveriam agradecer seu violentador.  É a idéia de que a mulher acima do peso não diz não, que faz com que ao andarmos na rua ouçamos: Ei vem aqui que te como e resolvo teu problema, ei eu como gordinha vem aqui. Além das falas vem também o toque sem convite, a mão na bunda, no seio, porque afinal você quer isso e logicamente aceita, pois ninguém quer comer você, você esta naturalmente disponível. Aliás na nossa cultura, existe mulher não disponível?

É o machismo do dia a dia! É o machismo avassalador de nossa sociedade, de nossa cultura, que coloca as mulheres em categorias como fácil, comestível, não comestível e por ai vai.  E a vítima de tudo isso? Bom essa mulher muitas vezes sofre calada e acredita que este é seu fim, que este é seu destino, que sim ela deve erguer as mãos para o céu se algum homem quiser manter relações sexuais com ela, pois afinal ela não vale nada, e sim ela precisa de um homem para legitima-la. Sim, meninas são educadas de forma machista e crescem envolvidas nessa mentalidade absurda e cruel.

Enquanto continuarmos imersos em uma cultura machista, patriarcal, mulheres continuarão sendo mercadoria fácil porque são gordas demais para dizerem não, magras demais para dizerem não, altas demais, baixas demais, feias demais para dizer não, gostosas demais para dizer não. Afinal, o fato de ser mulher já lhe incube a necessidade nata de precisar de um homem.

Educar, militar para romper com essas concepções é tarefa árdua! Há de se lutar contra essas estruturas dominadoras e violentas que agridem as mulheres. Há de se gritar aos quatro cantos que a mulher é fim em si mesmo, que mulher é gente, que seu corpo é sua propriedade.

Mulheres! Espero que essa violência não nos atinja mais. Espero que essa violência finde um dia.