Guardiões do Crivella: Câmara do Rio rejeita impeachment contra prefeito

Por apenas 2 votos de diferença, os vereadores impediram a abertura de processo contra Marcelo Crivella

Marcelo Crivella (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)
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A Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro decidiu não admitir o pedido de impechment apresentado pela deputada estadual Renata Souza (PSOL) contra o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) em sessão realizada nesta quinta-feira (3). O placar terminou em 23 a favor e 25 contra, com 1 abstenção e 2 ausências. O mínimo necessário era 26.

O pedido estava relacionado às denúncias apresentadas pela TV Globo sobre a existência de um grupo de caráter miliciano chamado "Guardiões do Crivella" que fazia plantões na porta de hospitais municipais com o objetivo de cercear entrevistas com críticas à situação da Saúde no município, além de atuar como claque do prefeito e coagir moradores a elogiar o bispo.

Os defensores

Um dos que cumpriu a função de subir ao plenário para defender o prefeito foi o vereador bispo Inaldo Silva (Republicanos). Silva fez questão de citar o presidente Jair Bolsonaro. "Qual o interesse desse pedido de impeachment? O Rio de Janeiro tem avançado e a gestão do prefeito durante a pandemia foi uma das melhores do Brasil. Se no Rio de Janeiro não morreu mais gente, foi graças a ele e à equipe dele. Será que o medo da esquerda tem a ver com as últimas pesquisas que mostram que o prefeito Marcelo Crivella, com o apoio do presidente Jair Bolsonaro, tem chance de se reeleger?", defendeu. Apesar da declaração, se fosse um país, o estado do Rio seria segundo no mundo no índice de mortes por milhão de habitantes - mais da metade dos óbitos ocorreu na capital.

"O senhor tem a maioria dessa casa, o senhor vai continuar o seu trabalho e, quem sabe, terá a graça de mais um mandato para mostrar que foi um gestor que geriu sem dinheiro uma cidade como essa. Prefeito, pode contar com essa casa", completou o bispo.

O vereador Dr. Jairinho (Solidariedade) defendeu que fosse aberta uma CPI para investigar Crivella e não um processo de impeachment. "Com o impeachment eu acho que querem ganhar a eleição no tapetão. Não querem disputar a eleição. Desgastar o prefeito sem ter a certeza que ele fazia esse comandamento é, no mínimo, querer ganhar a eleição no tapetão", disse.

O filho do presidente Jair Bolsonaro, Carlos Bolsonaro, está entre os que ajudou a salvar o prefeito. Ele, no entanto, não se manifestou durante toda a sessão.

Críticas

Apesar da vitória do prefeito, a maioria dos vereadores que pediram a palavra defenderam o impeachment. Um deles foi Tarcísio Motta (PSOL), que destacou que o episódio não é "pontual" na gestão Crivella. "A denúncia feita no pedido de impeachment não é algo pontual que foge à lógica de uma gestão incompetente, incapaz, violenta, pequena. Eu chego ao quarto ano de mandato com a certeza de que a cidade não merecia ter essa gestão. Uma gestão que nunca teve um projeto para a cidade do Rio. Ele pensa pequeno. Pensa o tempo todo na base da pequena política, não entende a cidade e o cargo que ocupa", declarou. "Crime no final de mandato ainda é crime. Contratar capanga para atacar a imprensa é crime", reforçou, criticando os defensores do prefeito.

Reimont Otoni (PT) apontou que o caso dos Guardiões é "flagrantemente um crime de responsabilidade" e que o prefeito feriu todos os princípios da administração pública. "Esse é um momento lamentável da política do Rio de Janeiro. Quero dizer que não imaginava que aquilo que nós esperávamos da condução da nossa cidade fosse levada a uma situação de tanta tristeza. Para mim não há nenhuma expectativa de que a Câmara acate o pedido, mas independente do resultado de hoje, fica o rei nu. O rei está pelado", disse.

"O prefeito deliberadamente disse: 'eu não quero que o povo as mazelas da Saúde na minha cidade'. É isso que está em jogo. Não está em jogo se a gente gosta ou não da administração do Crivella. Nós, de fato não gostamos, ele é um péssimo administrador. Mas não é isso que está em pauta. O que está em pauta é que ele disse pros 6 milhões e meios de cariocas: 'eu não quero que vocês tenham conhecimento de como a saúde está degringolada'. Foi um gesto deliberado do senhor prefeito, que participa do grupo. Vamos agora incriminar os pequenos ou quem os mandou?", disse ainda.

Paulo Messina (MDB), ex-chefe da Casa Civil do governo, também detonou o prefeito. "Que vergonha. Vergonha. Eu sinto vergonha. O que virou o governo Crivella? Virou uma milícia. Milícia paga com o nosso dinheiro, com o dinheiro do povo, dos nosso filhos. Vocês sabem que um dos meus anos eu passei na Prefeitura. Ajudamos as contas da cidade, mas eu não reconheço... A única coisa que me consola nesse evento trágico é: ainda bem que eu dei meu 'basta' de loucura que já tinha começado a acontecer desde o final das eleições de 2018. Eles estão enlouquecidos, retorcidos, de desejo de manutenção de poder", disparou. "Está todo mundo louco, é uma histeria coletiva. Tem que ser todo mundo internado! É corrupção por poder! Estão vendendo a cidade do Rio de Janeiro por poder!". Ele ainda denunciou supostos esquemas de desvio de dinheiro.

O vereador Átila Nunes (DEM), autor de outro pedido de impeachment, ainda afirmou que Crivella "usa e abusa dos cargos de comissão" para nomear cabos eleitorais e "jagunços". "Aquilo que a gente viu são jagunços. Ele quer voltar no tempo, quer impedir que o cidadão faça sua denúncia, quer impedir o trabalho da imprensa. Que ano esse prefeito pensa que está?", questionou. "A história é tão surreal que é difícil até de acreditar que é real", completou.

Investigações e eleições

O Ministério Público investiga as denúncias e o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) pediu a convocação de Crivella na Câmara dos Deputados. Segundo O Globo, entre os membros do grupo já identificados, ao menos quatro já disputaram eleições e dois pretendem se candidatar a vereador este ano pelo Republicanos, mesmo partido do prefeito.

Placar final da votação. O vereador Marcos Paulo teve problemas para votar e acrescentou voto favorável ao final da sessão | Reprodução/Youtube
https://www.youtube.com/watch?v=_bIfx2pNlQ0
Reprodução/Youtube/Câmara do Rio