Imigrantes ilegais no mundo equivalem à população da Argentina

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Em 2005, o número estimado de imigrantes irregulares na Europa, nos Estados Unidos e na Índia, estava entre 35 e 38 milhões de pessoas, segundo relatório da Comissão Global para Migração Internacional. É como se as populações atuais inteiras de Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai, ou toda a Argentina, resolvessem viver clandestinamente na Europa, nos EUA e na Índia. Estes migrantes fazem parte do que o relatório chama de grupo dos “não-cidadãos”. São pessoas que vivem de forma precária em países nos quais não têm acesso a direitos como saúde, educação e segurança pública.

O assunto é tema do documento Moradores Precários: Controle de Migração, Sociedade e direitos dos Não-Cidadãos, do pesquisador do Departamento de Desenvolvimento Internacional da Universidade de Oxford, Matthew J. Gibney. O texto é um dos estudos que subsidiarão a elaboração do RDH (Relatório de Desenvolvimento Humano) global de 2009-2010, que terá como tema central a migração.

Por serem irregulares, a ameaça de deportação faz com que muitos dos imigrantes não procurem os serviços básicos e acabem se sujeitando a situações degradantes, como exploração econômica e sexual. Além dos ilegais, de acordo com Gibney, fazem parte deste grupo aqueles que buscam asilo em um outro país (inclusive os que têm seu pedido negado), trabalhadores temporários e pessoas com proteção temporária contra deportação.

A conclusão do estudo de Gibney é de que “quando a exploração floresce, condições médicas são deixadas de lado e residentes de longa data são excluídos do reconhecimento político. É tolice acreditar que os cidadãos podem ser isolados das consequências sociais”. Como exemplo, o autor cita um estudo dos Estados Unidos que mostrou que os imigrantes sem documentação com tuberculose apresentam sintomas por mais tempo antes de procurar um médico, o que aumenta o risco de contágio entre as pessoas de seu convívio, sejam elas imigrantes ou não. “Baixos níveis de acesso a tratamento emergencial podem ser atribuídos a uma série de fatores (...) mas a preocupação com a expulsão também representa um importante papel,” afirma o autor.

Estes residentes precários – diz o texto – são alguns dos mais vulneráveis migrantes no mundo hoje. Eles têm pouco ou nenhum status para reivindicar direitos básicos porque, aos olhos dos oficiais do Estado (e de boa parte do público), são intrusos sem direito de estar no país ou apenas tolerados, pessoas as quais o país deseja ou é legalmente obrigado a receber por um período limitado, mas que não devem ser vistos como membros plenos”

Sugestões

Para reduzir a precariedade em que vivem estes imigrantes, Gibney sugere três alternativas. A primeira é “construir um muro entre os serviços de emergência a migrantes e as autoridades de migração”. A medida, segundo o autor, seria importante para fazer com que imigrantes irregulares tenham acesso aos direitos básicos. Ele ressalta que esta alternativa vai justamente na contramão da postura adotada por muitos países ocidentais. Na Itália, por exemplo, uma lei aprovada em 2 de julho deste ano endurece as medidas contra a imigração ilegal, instituindo multas entre 5 mil e 10 mil euros para imigrante flagrado em situação ilegal, e até três anos de prisão para italianos que alugarem quartos ou residências para os de fora.

A segunda sugestão do pesquisador é o fornecimento de “ajuda e recursos para assistir aqueles migrantes que queiram voltar a seus países de origem”. A ideia é que o país que recebeu o imigrante forneça dinheiro para ele começar um negócio, ou investir nos estudos em sua terra natal. Por fim, Gibney sugere que os países abram caminhos para que estes não-cidadãos transformem-se em imigrantes legais, cidadãos. “A adoção desta medida emana tanto da necessidade de encontrar caminhos para evitar a exploração de residentes precários (...), quanto do reconhecimento de que o país tem uma responsabilidade moral com quem reside a longos períodos em seu território (...)”, afirma o texto.

Brasil

A estimativa de imigrantes ilegais vivendo no Brasil hoje é de 50 mil, segundo o Ministério da Justiça. A maioria é de bolivianos e chineses. O país adota uma postura parecida com a terceira sugestão de Gibney. No mesmo dia em que a Itália dificultava ainda mais a permanência de migrantes ilegais em seu território, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou uma lei que regulariza a presença dos irregulares no país por mais dois anos, podendo tornar a residência permanente.

O Secretário Nacional de Justiça, Romeu Tuma Jr., explica que a anistia recém-sancionada pretende “combater o tráfico de pessoas, que vivem muitas vezes em situações análogas à da escravidão”. Para ele, o Brasil “rema contra a discriminação do imigrante”. “[A política em relação aos imigrantes em países da Europa e nos EUA] é totalmente descabida. A nossa é contrária, nós não criminalizamos”, critica.

Não é a primeira vez que o Brasil decide anistiar seus imigrantes. Medidas semelhantes foram tomadas em 1988 e em 1998. O secretário nacional de justiça ressalta, porém, que não há uma institucionalização da anistia. “Não é como alguns dizem: de dez em dez anos tem anistia; é uma decisão de governo.”

O modelo brasileiro acaba se encaixando na crítica feita por Gibney em seu texto: “Também é importante que a regularização [dos imigrantes] seja uma possibilidade contínua, preferivelmente do que uma oportunidade única”, diz o pesquisador. E sugere uma legalização conquistada, em que o imigrante só seria regularizado se cumprisse requisitos como ter emprego fixo, estar no país há determinado tempo e não ter antecedentes criminais. “A cidadania conquistada certamente traria uma melhora sobre as recentes práticas de regularização que tendem a ser um tanto arbitrarias e sem continuidade”, argumenta.

Sobre isso, Romeu Tuma afirma que, uma nova lei de estrangeiros ainda não aprovada pelo Congresso deve melhorar a situação dos imigrantes permanentemente. “Se for aprovada a lei, pode ser que nem sejam necessárias outras anistias”, diz.


(Por Envolverde/PNUD Brasil)