Juan L. Ortiz: Três poemas

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[caption id="attachment_960" align="alignleft" width="224" caption="Juan L. Ortiz"][/caption] Juan L. Ortiz (Juanele) nasceu em 11 de junho de 1896 em Puerto Ruiz, Entre Ríos. Em 1942 mudou-se a Paraná, capital da mesma província, onde morou até sua morte, em 2 de setembro de 1978. Com a exceção de algumas rápidas idas a Buenos Aires e uma breve visita à China e a outros países socialistas em 1957, jamais abandonou sua morada, às margens do rio. Ali dedicou toda a vida a uma única tarefa: tecer uma obra poética singular, que renovaria o idioma como poucas. Debutou em 1933 com El agua y la noche. Seus primeiros dez livros – todos publicados discretamente, sem estardalhaço, sem reclamos de atenção, como cifras para um leitor futuro – seriam reunidos a outros três volumes inéditos sob o título En el aura del sauce em 1971. Há uma pequena amostra da obra de Juanele disponível na internet. Dele, eu já traduzi “Sim, as escamas do crepúsculo”, que abre o volume De las raíces y del cielo (1958) e “Por quê …?”, do mesmo poemário.  Seguem abaixo "Dia cinza" e "Deus se despe na noite", de A água e a chuva (1933), e "Vi dois homens...", de A brisa profunda (1954)   . . Dia cinza Que nos pergunta o vago horizonte que vem à nossa melancolia cheio de gestos molhados – estendido fantasma que absorve os arvoredos e nos inverte o lírio úmido e sozinho d'alma?   ***********   Deus se despe na chuva.... Deus se despe na chuva como uma carícia inumerável. Cantam os pássaros entre a chuva. As plantas dançam de alegria molhada.   A terra como uma fêmea se dissolve nos dedos penetrantes com uma palidez de mil olhos desmaiados.   Caminho sob a chuva, todo molhado, cantando, para miragens que fogem num rumoroso sonho.   Chuva, chuva! Nudez do deus primaveril, que desce dançando, dançando, a fecundar a amada toda aberta de espera, quebrada já de ardor amarelo e longo.   ********* Vi dois homens ...  Vi dois homens que se davam as mãos, alegres Ó, vi saltar a luz dessa alegria como um ligeiro fogo novo. A noite, ainda iluminada, da rua não existia. Era a noite primeira e era a noite para mim jogada desses fogos. Bastava o encontro, o puro encontro, para que a chispa brotasse?   E vi os outros homens, todos os homens, encontrando-se na festa revelada de uma ainda tímida unidade.   As mãos se uniam fortes para que o calor não escapasse e fosse esse o hálito da criação conjunta …   Mas as outras criaturas? Ah, todas esperam. Não é só “o homem e as pedras”. Os outros também esperam, também vivem e podem “colaborar”. Do homem, e fora do homem, para voltar ao homem, quiçá, ao ser que será tudo, mesmo que humilde, no absoluto do amor …