Mumia Abu-Jamal, 20 anos no corredor da morte

Habilidades de advogados, médicos patologistas, cientistas e investigadores penais dos Estados Unidos estão aliadas na tentativa de salvar a vida do condenado à morte Mumia Abu-Jamal

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Por Adrianne Appel, da IPS

Habilidades de advogados, médicos patologistas, cientistas e investigadores penais dos Estados Unidos estão aliadas na tentativa de salvar a vida do condenado à morte Mumia Abu-Jamal, e também demonstrar o papel que pode ter a cor da pele nas sentenças à morte. No último dia 17, após quase 20 anos de frustradas tentativas, um tribunal federal de apelações voltou a analisar este caso, dando o primeiro passo para a possível determinação de um novo julgamento para Abu-Jamal, um dos mais conhecidos dos 2.500 condenados à morte neste país.

Robert Bryan, o advogado que lidera a batalha pela vida do ativista há quatro anos, acredita que seu caso é contundente e que os magistrados deveriam ordenar um novo processo. Pela primeira vez desde a condenação de Abu-Jamal em 1982, o sistema judicial norte-americano questiona seriamente se a discriminação racial e a política do momento impediram que o acusado tivesse um julgamento justo. “Meu objetivo é que ele volte para casa. Esse é o melhor dos resultados”, disse Bryan à IPS.

Abu-Jamal, jornalista e ativista político negro, foi condenado por um júri formado quase totalmente por brancos na cidade de Filadélfia pelo assassinato do policial Daniel Faulkner. O agente foi morto em um confuso incidente após parar um automóvel conduzido pelo irmão de Abu-Jamal, em dezembro de 1981. Na época foi dito que Abu-Jamal correu desde um táxi até a cena do crime, e ali foi preso com uma pistola registrada em seu nome. Os relatos de testemunhas são contraditórios. A evidência é incompleta e foi perdida em parte. Abu-Jamal, ferido à bala no peito, sempre afirmou sua inocência.

“O fio condutor que atravessa esse caso desde o dia em que Abu-Jamal foi preso até hoje é o racismo. No julgamento original, o júri somente viu um lado da moeda. Foi uma comédia de erros. Este caso nunca foi adequadamente investigado”, disse Bryan. Na audiência de apelações, Bryan e outros alegaram que o julgamento original foi injusto porque os negros foram intencionalmente excluídos do corpo de jurados, violando a Constituição. O júri final foi formado pro 10 brancos e dois negros. Na época, 40% dos habitantes da Filadélfia eram negros.

“O que importa é que foi negado aos cidadãos afro-norte-americanos seu direito de participar deste importante direito cívico e desta responsabilidade tendo por base a raça”, disse à IPS Christina Swarns, advogada da Associação Nacional para o Avanço do Fundo de Defesa Legal das Pessoas de Cor. “A questão do justo esteve ali desde o momento da escolha dos jurados. Se os tribunais do Estado da Pennsylvania tivessem respeitado a lei, está audiência já teria ocorrido há muito, muitos anos”, acrescentou.

Houve outros problemas com o julgamento de 1982, segundo Bryan. O promotor fez o júri acreditar que se condenassem Abu-Jamal à morte as possibilidades de ele ser efetivamente executado eram escassas. E o juíz que presidiu o processo, Albert Sabo, dirigiu uma difamação racial contra o ativista durante um recesso do julgamento, acrescentou Byran. Sabo também teve um conflito de interesses e nunca deveria ter presidido o julgamento, disse à IPS Jill Soffiyah Elijah, membro do Sindicato Nacional de Advogados. Sabo foi membro ativo da Ordem Fraternal de Policia, poderoso grupo que representa os interesses da policia e pressiona a favor da pena de morte nos casos em que houve agentes assassinados.

“Fizeram muita pressão pela execução de Abu-Jamal. A participação do juíz Sabo supôs um conflito de interesses e comprometeu sua capacidade de ser objetivo”, disse Alijah, professor na Universidade de Harvard. O magistrado, falecido em 2002, era chamado de “o juiz da forca’. Em um período de 14 anos, presidiu julgamentos nos quais 31 acusados foram sentenciados à morte, número que supera a de qualquer outro juiz dos Estados Unidos. desses condenados, 29 pertenciam a minorias étnicas.

Embora os advogados de Abu-Jamal pressionassem na audiência de apelação para conseguir um novo julgamento, os promotores pediram que os juizes reafirmem sua condenação à morte. O governador da Pennsylvania, Ed Rendell, declarou publicamente que se os juizes optarem pela confirmação, ele próprio ordenaria a execução de Abu-Jamal. Rendell tem interesse de longa data neste caso. Foi promotor principal do distrito de Filadélfia em 1982, e foram seu escritório e seus funcionários que julgaram o ativista.

No passado, o escritório do promotor distrital mostrou um padrão de discriminação em muitos casos, disse Bryan. Isto incluiu apresentar falsas evidencias e obter testemunhos mentirosos. Entretanto, este advogado se mostrou confiante em que os juizes permitirão um novo julgamento para Abu-Jamal. “Meu objetivo é ganhar este caso. Temos muitas evidências novas. Se conseguirmos novo julgamento, serão apresentadas ao novo júri. Será feita uma quantidade de provas patológicas, de DNA balísticas. Tenho fé em que 12 homens e mulheres do júri deixem meu cliente ir para casa”, acrescentou. Porém, Bryan deseja levar o julgamento para outra cidade. “Há tanta corrupção e injustiça no sistema judicial da Filadélfia que é difícil imaginar um julgamento justo”, afirmou.

Abu-Jamal, de 53 anos, ganhou milhares de adeptos em todo o mundo. “Quando foi condenado à morte, eles pensaram que o deixariam paralisado. No entanto, Abu-Jamal se converteu em um símbolo internacional contra a pena de morte”, destacou o advogado. Entre seus partidários há celebridades de Hollywood, políticos e universitários. Na cidade francesa de St. Denis, uma rua leva seu nome. Na audiência de apelações, cerca de 200 pessoas lotaram a sala, enquanto do lado de fora aproximadamente outras 500 da França, Alemanha e outros países, se manifestavam em nome de Abu-Jamal.

Envolverde/ IPS