Na Cúpula das Américas, Dilma pede fim de embargo a Cuba

Presidenta elogiou Barack Obama por reaproximação dos EUA com o país liderado por Raúl Castro, mas criticou sanções estadunidenses à Venezuela. Confira a íntegra do discurso

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Presidenta elogiou Barack Obama por reaproximação dos EUA com o país liderado por Raúl Castro, mas criticou sanções estadunidenses à Venezuela. Confira a íntegra do discurso Por Opera Mundi Dilma Rousseff elogiou neste sábado (11/04) a reaproximação diplomática entre Cuba e Estados Unidos, negociada pelos presidentes Raúl Castro e Barack Obama. Durante discurso na sessão plenária da VII Cúpula das Américas  no Panamá, a presidente pediu ao norte-americano o fim do embargo norte-americano. "Celebramos a iniciativa corajosa dos presidentes Raúl Castro e Barack Obama de restabelecer relações entre Cuba e Estados Unidos, de pôr fim a este último vestígio da Guerra Fria na região que tantos prejuízos nos trouxe", disse. Dilma declarou que a aproximação entre os países "abre uma nova era nas Américas", na qual todos os países do continente deverão compreender que "nenhum pode impor nada a outro". Falando sobre "os antagonismos que tanto afetam nossas sociedades", Dilma também comentou as sanções norte-americanas à Venezuela. "Este bom momento das relações hemisféricas já não admite medidas unilaterais de isolamento", motivo pelo qual "rejeitamos as sanções (dos Estados Unidos) contra a Venezuela", um país que, em sua opinião, "reivindica moderação de todas as partes". Leia abaixo o discurso de Dilma na íntegra Agradeço ao Povo e ao Governo do Panamá, na pessoa do Presidente Juan Carlos Varela, a calorosa acolhida e a eficiente organização desta VII Cúpula das Américas. Panamá – “ponte do mundo” – é hoje o lugar de reencontro das Américas. Celebramos, aqui e agora, a iniciativa corajosa dos Presidentes Raúl Castro e Barack Obama de restabelecer relações entre Cuba e Estados Unidos, pondo fim a este último vestígio da Guerra Fria na região. Saúdo, igualmente,  Sua Santidade, o Papa Francisco, pela contribuição dada para que essa aproximação se realizasse. Com o aplauso de todos os líderes presentes neste encontro, os dois Presidentes deram uma primeira prova do quanto se pode avançar quando aceitamos os ensinamentos da História, deixando de lado preconceitos e nocivosantagonismos, que tanto afetaram nossas sociedades. Estamos seguros que outros passos serão dados, como o fim do anacrônico embargo – que, há mais de cinco décadas, vitima o povo cubano e enfraquece o sistema interamericano. Aí,sim, continuaremos construindo as linhas que pautarão nosso futuro e estaremos sendo contemporâneos de nosso presente. Amigas e amigos, Inúmeras oportunidades nascem desse novo ambiente, razão pela qual saúdo o tema escolhido pelo Panamápara esta Cúpula. A prosperidade, a equidade e a cooperação são valores muito caros a todos nós e, ao Brasil. Refletem o espírito que deve presidir essa nova etapa das relações hemisféricas. Desde a Cúpula de Miami, nossos avanços econômicos, sociais e políticos foram notáveis. Enfrentávamos em 1994 problemas crônicos como a fome, a miséria, o desemprego, causados, em grande medida, por visões e políticas equivocadas que agravavam a exclusãosocial. Recém-saídos de regimes autoritários, recebemos um legado de recessão, endividamento e concentração de renda. Hoje, estamos reunidos em um contexto muito diferente. A consolidação da democracia e novos paradigmas políticos inverteram a lógica da ação do Estado, conferindo prioridade ao desenvolvimento sustentável com justiça social. A América Latina e o Caribe têm agoramenos pobreza, menos fome, menos mortalidade infantil e materna, menos analfabetismo. Aumentamos a expectativa de vida, o Índice de Desenvolvimento Humano e o PIB per capita. Também temos mais comércio, investimentos, turismo. Em meu país, erradicamos a fome, objetivo que parecia inatingível. Essas conquistas sociais são uma demonstração do vigor democrático e da capacidade de mobilização de nossas sociedades. A afirmação da democracia – em seu sentido mais completo, com participação social – é um patrimônio de grande valor em nossa região. É precisopreservar e ampliar essas conquistas. Mas não podemos fechar os olhos para a persistência de desigualdades, que ainda afetam, em diferentes graus, a todos os países do hemisfério. Esse fenômeno não passa despercebido a uma sociedade cada vez mais esclarecida e exigente. A concentração de renda e de riqueza ainda ameaça a coesão social e o desenvolvimento de nossas economias. Essa disparidade é ainda maior quando analisada sob os prismas de gênero e raça, em especial no acesso à educação, à renda e ao poder. Combater a desigualdade em todas as suas manifestações, no espírito da cooperação que coroa o lema desta VII Cúpula, é o maior desafio das Américas e do mundo no século XXI. Esse combate, aqui na nossa América, demonstra também a necessidade de umc rescimento econômico contínuo de nossos países, capaz de assegurar a sustentabilidade da inclusão social. Esse combate deve estimular uma verdadeira cultura e prática daintegração. A integração comercial e de cadeias produtivas é um dos mecanismos capazes de assegurar que em todos os momentos e, em especial diante de problemas ou crises, possamos sustentaro desenvolvimento. Nosso hemisfério foi capaz de construir arranjos de integração diversos, concretos e complementares, que ampliaram o diálogo político, o intercâmbio comercial, a realização de investimentos e a integração de cadeias produtivas. Já não se pode pensar em temas como comércio, saúde e drogas de maneira local. Já não se pode pensar em democracia, em promoção dos direitos humanos e em políticas econômicas com base em modelos únicos. Presidentes e Presidentas, Há tempos, celebramos o fato de que, do Alasca à Terra do Fogo, nossos países vivem em paz uns com os outros. Esperamos comemorar, em breve, o fim do mais longo conflito interno nas Américas. Saúdo a coragem do povo colombiano, de seus atores políticos e  do Presidente Santos, demonstrada no esforço de  pôr  fim ao ciclo de violência que infelicitou, por décadas, seu país. A opção por uma paz negociada constitui precedente inestimável para a região e para o mundo. Celebramos também os avanços na consolidação da paz no Haiti e reafirmamos nosso firme compromisso com a estabilidade democrática, o desenvolvimento e a soberania haitiana. Apoiamos a reconfiguração da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH), tal como determinada pelo Conselho de Segurança. O bom momento das relações hemisféricas já não admite medidas unilaterais e políticas de isolamento, em geral contraproducentes e ineficazes. Por isso, rechaçamos a adoção de sanções contra a Venezuela. O atual quadro nesse país irmão pede moderação e aproximação de posições de todas as partes. É com esse propósito que a UNASUL trabalha para acompanhar e apoiar o diálogo político entre o governo e a oposição na Venezuela, buscando contribuir para o pleno respeito, por todos, ao Estado democrático de Direito e à Constituição do país. Senhoras e senhores, A cooperação facilita a busca de soluções para problemas comuns a nossos países. Quatro temas são especialmente relevantes: a segurança, a educação, as migrações e a mudança do clima. Assegurar o direito humano à segurança para os cidadãos das Américas continua a ser um desafio premente. Temos de buscar uma cooperação que privilegie um enfoque abrangente e atente para as diversas causas e consequências da violência, conferindo especial atenção aos grupos mais vulneráveis – as mulheres, os jovens, especialmente os negros, os povos originários, e as pessoas discriminadas por sua orientação sexual e identidade de gênero. O combate ao tráfico de drogas devecombinar repressão e prevenção.  As pessoas que usam drogas têm direito a uma política de saúde pública integrada e multidisciplinar, baseada em evidências científicas e no respeito aos direitos humanos. Uma educação inclusiva e de qualidade, em todos os níveis, é indispensável para romper o ciclo de reprodução da desigualdade; para gerar oportunidades e inovação; para democratizar o acesso e a produção do conhecimento, como aponta a Agenda Educativa Interamericana. Essencial, sobretudo, para não sermos apenas produtores de commodities e simentrarmos na economia do conhecimento,baseada na educação de alta qualidade e na  pesquisa científica e tecnológica, como base para a inovação. O século XXI requer um novo enfoquesobre migração, que deve ser centrada nos direitos humanos dos migrantes, ser sensível ao crescimento dos fluxos migratórios entre países em desenvolvimento; favorecer o trabalho decente; e prevenir e mitigar os efeitos de desastres socioambientais. Sigamos no sentido oposto ao da xenofobia e da intolerância, ascendentes em diversas partes do mundo. A agenda global de mudança do clima também requer avanços. Com base nos debates realizados em Lima, é fundamental que a próxima Conferência das Partes, em Paris, produza um acordo ambicioso, equilibrado e legalmente vinculante, firmemente ancorado no marco da Convenção do Clima. O combate à mudança do clima exige equilíbrio entre o crescimento da economia, a diminuição da desigualdade social e a proteção do meio ambiente. O Brasil reafirma seu engajamento nesse tema, refletido em compromissos voluntários audaciosos. Reafirmamos e adotamos as conclusões da Conferência Rio Mais Vinte de que é possível preservar, incluir e crescer . Caros amigos e amigas, A VII Cúpula inaugura uma nova era nas relações hemisféricas, na qual poderemos conviver com diferentes visões de mundo, sem receitas rígidas ou imposições. É nossa reponsabilidade fazer deste século um período de paz e de desenvolvimento para todos. O século XXI tem de resgatar a esperança que um dia marcou nossa região. Região que, como disse Eduardo Galeano: “(se encuentra) al otro lado de la mar – mágica mar que transfigura destinos – la gran promesa de todos los tiempos.” A geografia nos legou um só continente, onde vivemos juntos, separados do resto do mundo por dois oceanos. Estamos todos neste mesmo e imenso barco. Cabe a nós levá-lo a porto seguro. Muito obrigada. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR