No México, camponeses lutam contra uma represa

No estado de Guerrero, no sul do país, camponeses mantém área ocupada há quatro anos

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No estado de Guerrero, no sul do país, camponeses mantém área ocupada há quatro anos Por Diego Cevallos, da IPS   Camponeses do estado de Guerrero, no sul do México, mantêm bloqueada desde 2003 uma área onde o governo pretende construir uma gigantesca represa hidrelétrica. No último dia 12, durante uma assembléia da qual participaram moradores da região, seus representantes e funcionários da Comissão Federal de Eletricidade, os camponeses decidiram por maioria que o projeto deveria ser abandonado. “Acordamos que seria respeitada a decisão tomada pela maioria e sem nenhum tipo de pressão”, disse à IPS José Hernández, um dos dirigentes da zona agrária de Cacahuatepec. “Que saibam que não cederemos, mesmo que isto custe nossas vidas”, advertiu. Perto de Cacahuatepec e outros núcleos agrários, onde vivem cerca de 30 mil camponeses, passa o rio Papagayo, no qual o governo planeja construir uma hidrelétrica, com investimento de aproximadamente US$ 1 bilhão. O projeto, batizado de La Parota, exigiria seis anos de trabalho e, uma vez finalizado, geraria 900 megawatts. Em 2003, o governo do conservador Vicente Fox (2000-2006) começou as obras com vistas à sua construção, como estradas e acampamentos para os trabalhadores. Porém, foram suspensas quase imediatamente devido aos protestos dos camponeses, que terras expropriadas. Desde então, e sem interrupção, os opositores mantêm dia e noite bloqueados os acessos à região com pedras, paus e outros obstáculos. A determinação é impedir a entrada de trabalhadores da estatal Comissão Federal de Eletricidade e autoridades governamentais. “Este processo tem sido muito longo, com muitos subornos e enganos, mas logo deve acabar. Saibam que não vamos vender nem abandonar nossas terras”, afirmou Hernández em uma entrevista por telefone com a IPS. O atual governo do também conservador Felipe Calderón, que com seu antecessor Fox pertence ao Partido Ação Nacional, continuou com a idéia de construir La Parota. Negociou com os camponeses uma assembléia para expor seus pontos de vista e ouvir os que se opõem ao projeto. A reunião aconteceu no último dia 12, com a presença de aproximadamente três mil moradores, que por votação erguendo as mãos, realizada diante dos delegados do governo, decidiram pelo fim do projeto. A resolução foi colocada em um documento. Entretanto, alguns camponeses que estão de acordo com a hidrelétrica afirmam agora que na assembléia houve pressões e que não aceitarão a decisão tomada. Tampouco o fará o governo do Estado de Guerrero, liderado por Zeferino Torreblanca, do opositor e esquerdista Partido da Revolução Democrática. As autoridades da Comissão Federal de Eletricidade não se pronunciaram, mas Hernández acredita que são elas que promovem o não-reconhecimento da assembléia. Segundo o governo de Guerrero, o projeto de La Parota continua vivo. A hidrelétrica, explicam os funcionários, beneficiará com empregos e geração de energia. Isso atenderá o déficit de eletricidade que já afeta várias cidades do Estado, entre elas a zona turística de Acapulco. De acordo com Hernández, um camponês de 44 anos que vive da plantação de milho e limão, “na última assembléia não houve pressão alguma. Todos puderam comprovar. Por isso nos indigna que agora digam que houve pressões e que não querem aceitar a resolução. Claramente, a mão do governo federal está por trás disso”. Se o projeto for adiante, será construída uma represa de 14 mil hectares, afetando dois mil camponeses, de acordo com o governo. Mas os opositores e alguns pesquisadores afirmam que 20 mil pessoas sofrerão o impacto da obra e argumentam que haveria mudanças culturais e ambientais na área. “Foram ganhas todas as batalhas legais contra La Parota. Se as autoridades desconhecerem isso haverá um enfrentamento sem fim e uma total desconfiança frente a lei”, disse à IPS Mario Patrón, advogado do Centro de Direitos Humanos de La Montana Tlachinollan, com sede em Guerrero. Patrón, que assessora os camponeses vizinhos do projeto La Parota, afirma que a insistência em construir a represa “mesmo às custas de centenas de camponeses e do meio ambiente”, atende a fortes interesses econômicos e empresariais. A construção da represa gerou interesses em companhias locais com Engenheiros Civis Associados e Ideal, bem com nas estrangeiras Teching e General Electric. “Os opositores à La Parota têm ao menos sete resoluções judiciais ao seu favor indicando que as assembléias camponesas de 2005, onde aparentemente se aprovou o projeto, foram ilegais e ameaçadas, e agora têm um documento votado em uma nova assembléia com a presença de autoridades e com total força legal”, disse Patrón. O governo de Fox disse há dois anos que a maioria dos camponeses estava a favor de La Parota e, inclusive, esteve aponto de abrir a licitação para concretizar o projeto, mas os juiz disseram que as assembléias nas quais a represa foi aprovada não tinham validade. “Que o governo de Calderón esqueça de La Parota, pois jamais será construída”, disse Hernández. Os opositores do projeto incluem grupos ambientalistas locais e de outros países. O não-governamental Tribunal Latino-Americano da Água, com sede na Costa Rica, concluiu em março de 2006 que o projeto não era adequado e que em sua tentativa de levá-lo adiante o governo Fox havia enganado e violado os direitos dos camponeses. Os opositores à hidrelétrica afirmam que a represa beneficiará principalmente empresas privadas, não as comunidades. Acrescentam que o desemprego, a miséria e os efeitos irreversíveis no meio ambiente serão as conseqüências se a construção for levada adiante. Os defensores do projeto dizem que as represas contribuem para garantir o controle do fluxo de água, podem evitar inundações e reduzem o uso de petróleo na geração de energia. No México, quase metade da eletricidade consumida é gerada a partir de combustíveis fósseis, que aumentam a contaminação ambiental. Porém, as represas hidrelétricas também implicam custos ambientais, entre eles a perda de espécies animais e a inundação de terras agrícolas. Também provocam uma recolocação de populações. As comunidades rio abaixo e o meio ambiente pagam um preço “inaceitável e desnecessário” pelos benefícios das grandes hidrelétricas, diz um informe da Comissão Mundial de Represas. Envolverde/ IPS