O que a Veja não vai dizer sobre os Black Blocs

Adeptos da tática seguiram pelas ruas de São Paulo até chegarem ao prédio da Abril para ato contra a revista. O Brasil de Fato presenciou que, em sua maioria, são jovens que sofrem a violência do Estado nas periferias

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Adeptos da tática seguiram pelas ruas de São Paulo até chegarem ao prédio da Abril para ato contra a revista. O Brasil de Fato presenciou que, em sua maioria, são jovens que sofrem a violência do Estado nas periferias

Por José Francisco Neto e Erick Miranda, do Brasil de Fato 

“Eu já vi um homem morto com mais de dez tiros em cima de um carrinho de mão na viela da favela de onde eu morava. Não foi bandido. Foi PM.” A frase, dita por um adepto do Black Bloc, foi dirigida a um policial militar que estava junto com a Tropa de Choque fechando a Avenida das Nações Unidas, em São Paulo, durante o ato desta sexta-feira (23) contra a revista Veja.

Crédito: Joel Oliveira

O ato dos Black Blocs - tática anarquista que tem como alvo a destruição de símbolos de instituições capitalistas e da força militar - teve como motivação uma matéria distorcida sobre os ativistas que foi publicada pela revista na semana passada.

Com toucas encobrindo os rostos para não serem facilmente identificados, os jovens, como constatou o Brasil de Fato, em sua maioria alvos da violência do Estado nas periferias, seguiram pela avenida Faria Lima até chegarem ao prédio da editora Abril, na avenida Nações Unidas.

A reportagem da Veja, feita no Rio de Janeiro, dizia que os Black Blocs não passavam de jovens drogados e vândalos, descaracterizando os motivos pelos quais lutavam. “O protesto de hoje é pela democratização da mídia. Porque o que a Veja fez foi uma manipulação total”, disse um ativista.

Em dois momentos, vários exemplares da Veja foram queimados diante de dezenas de policiais que apenas observavam a ação. Inicialmente, no Largo da Batata, no bairro de Pinheiros, e, depois, em frente a sede da Abril, editora que publica a Veja.

Não demorou muito para que a Tropa de Choque, que já se posicionava junto com policias da Força Tática, dispersasse as pessoas com tiros de balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo. Até mesmo crianças que estavam nas proximidades foram atingidas. Indignados com a ação da PM, alguns ativistas quebraram vidros de bancos públicos e privados, fazendo com que o ato terminasse com perseguição policial e a prisão de um manifestante.

Durante o trajeto, na altura da avenida Euzébio Matozo, um segurança particular de uma concessionária de automóveis sacou uma arma de fogo. Houve discussão entre manifestantes e alguns policiais militares que acompanhavam o ato. Apenas uma pedra foi lançada em direção à concessionária em protesto à atitude do segurança.

“Ninguém manda e ninguém obedece”

Em contraste com meios de comunicação que procuram deturpar a configuração dos Black Blocs, o Brasil de Fato apurou que os jovens que praticam ações diretas contra a opressão capitalista são oriundos de bairros pobres e periféricos. Em sua maioria, trabalhadores e estudantes que convivem diariamente com a violência do Estado.

“A gente tá aqui com um motivo muito claro que é a luta contra o símbolo do capital, proteger aqueles que se propõem a ir contra o capitalismo e passar outra mensagem muito clara: ninguém manda e ninguém obedece”, explicou um ativista que se identificou como Amarildo.

“Destruímos bancos porque eles servem ao capitalismo. Eles geram miséria, ódio, tristeza e desavença na população”, complementou.

Durante os protestos, eles andam sempre juntos e, usualmente, atacam bancos, grandes corporações ou qualquer outro símbolo de instituições. “Essa é a defesa do oprimido contra o opressor. Ninguém é invisível. Essa invisibilidade é imposta pelo capitalismo”, finalizou.

Eles também afirmam não temer o confronto com a polícia. “É uma tática de defesa. Nós estamos aqui pra demonstrar que ninguém tem que ficar com medo de ninguém.”

Crédito: Joel Oliveira

Mídia manipuladora

A revolta contra os meios de comunicação que descaracterizam as ações dos Black Blocs era evidente. Além de queimarem exemplares da revista Veja, os ativistas se reuniram para decidir se falariam ou não com a imprensa quando o ato se concentrava ainda no Largo da Batata. Houve um consenso da maioria, e eles aceitaram falar com o Brasil de Fato, a TV Brasil, que é pública, e outras mídias independentes.

A matéria da revista Veja referente aos Black Blocs dizia que eles não passavam de jovens drogados e vândalos. Uma ativista, identificada como Emma, diz ter sido procurada no acampamento no Rio de Janeiro por uma repórter da Veja e também pelo Globo para dar entrevista. No entanto, ela disse que recusou ambos os convites por não concordar com a grande mídia.

Afirmou, ainda, ter dito à repórter da Veja que não conversaria com ela, pois o editor manipularia tudo conforme seu interesse. Porém, enquanto lia a reportagem da revista, por diversas vezes, declarou: “Eu não disse isso”.

Na Carta ao Leitor da mesma edição, a Veja disse que “sempre se pautou pela busca da informação correta em nome do interesse público.” Ao ler, Emma disse: “a população está vendo o que vocês estão fazendo.” E, realmente, viu, e reagiu pelas ruas de São Paulo no ato da noite desta sexta-feira (23).

(Foto de capa: José Francisco Neto / Brasil de Fato)