O relato dos sobreviventes ao massacre na Nigéria

Residentes que conseguiram escapar de Baga narram como foi o terrível ataque do Boko Haram, que deixou mais de dois mil mortos em poucos dias.

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Residentes que conseguiram escapar de Baga narram como foi o terrível ataque do Boko Haram, que deixou mais de dois mil mortos em poucos dias Por Vinicius Gomes Começam a vir a público os primeiros relatos de sobreviventes do massacre na Nigéria, que deixou mais de dois mil mortos na cidade de Baga, uma pequena comunidade pesqueira às margens do Lago Chade, no nordeste do país. O horror teve início no primeiro final de semana do ano, em 3 de janeiro, quando integrantes do grupo extremista Boko Haram atacaram e dominaram a base militar de uma força-tarefa internacional, para depois voltarem seu ímpeto assassino à população de Baga – naquilo que acreditam ser uma represália ao grupo de autodefesa dos civis, que ajudavam os militares na luta contra o Boko Haram. Apesar de um porta-voz do ministério da Defesa ter dito que os números do massacre eram “exagerados” (eles estimavam 150 mortos), os relatos daqueles que começam a chegar a um campo de deslocados internos, em Maiduguri, capital do estado do Borno, contradizem a versão do governo. Os insurgentes chegaram à cidade em caminhonetes e motocicletas, para então perseguir e matar todos aqueles que fugiam do ataque. O motorista de caminhão Ibrahim Gambo, 25, afirmou ao jornal nigeriano Premium Times que os agressores “entraram em Baga vindos de quase todas as direções – atirando e matando sem parar". "Não tivemos outra escolha a não ser nos unir àqueles que fugiam”. Mas muitas pessoas não conseguiram correr rápido o suficiente para escapar. “Eu vi muitas crianças e mulheres mortas – até mesmo, grávidas, com a barriga”, afirmou Gambo, que já se encontrava em Maiduguri. Segundo ele, as pessoas que se refugiaram em suas casas acabaram sendo queimadas vivas, depois que homens do Boko Haram as incendiaram. Outros residentes de Baga que tentaram fugir para o país vizinho Chade, através do lago fronteriço, acabaram morrendo afogados. De acordo com o Alto Comissariado para Refugiados da ONU, cerca de mil pessoas se encontram isoladas em Kangala, uma pequena ilha no meio do Lago Chade. Um residente de Baga, Abubakar Gamandi, afirmou que essas pessoas ilhadas estão morrendo: “Eu estou em contato com eles através do celular e eles me disseram que estão morrendo pela falta de comida, de frio e pela malária, pois a ilha é infestada de mosquitos”. Ainda segundo a agência da ONU, mais de 7 mil refugiados conseguiram chegar ao Chade, nos últimos 10 dias. Uma das histórias mais gráficas veio de Yanaye Grema, 38, um pescador que se escondeu por três dias entre um muro e a casa de seu vizinho, enquanto o Boko Haram destruía sua cidade. Ele relata que sobreviveu os três dias, pois toda noite – com os insurgentes do Boko Haram montando acampamento a 700 metros de onde estava escondido - subia à sua casa para “comer rapidamente uns grãos de mandioca e beber água”, antes de se esconder novamente. Apenas depois de conseguir fugir na escuridão que Gamae percebeu a extensão do horror e destruição que os homens do Boko Haram causaram. “Por cinco quilômetros, eu continuei pisando em cadáveres até eu chegar o vilarejo Malam Karanti, que também foi incendiado e se encontrava deserto”. Yahaya Takakumo, um camponês de 55 anos, disse que os insurgentes emboscavam aqueles que tentavam fugir pelo lago e que, apesar de o primeiro dia ter sido o mais massivo no ataque, matando os soldados e a população, ele não foi o único. “Mesmo depois de eles terem tomado Baga, eles continuaram atacando vilarejos vizinhos no dias seguintes”. Foto de Capa: Premium Times