OAB/MG emite "nota de alerta" contra liminar que proibiu debate político em universidade

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"O Estado Democrático de Direito é totalmente incompatível com o cerceamento às liberdades civis", diz trecho da nota que mostra "preocupação" da entidade com a decisão judicial que proibiu, na semana passada, um debate sobre o momento político do país promovido pelo Centro Acadêmico da Faculdade de Direito da UFMG. "Estamos vivendo um estado judicial de exceção", disse advogado que manifestou apoio aos estudantes Por Redação Centenas de estudantes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) realizaram, na tarde desta segunda-feira (2), uma manifestação contra a decisão judicial que proibiu, no final da semana passada, a realização de um debate sobre o atual momento político do país, que seria promovido pelo Centro Acadêmico Afonso Pena, entidade que representa os estudantes da Faculdade de Direito da Instituição. De acordo com o Centro Acadêmico, a Assembleia Geral Extraordinária (AGE) foi convocada para discutir "o posicionamento político das alunas e dos alunos do curso de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais perante o processo de impeachment da Presidente da República" e os "possíveis desdobramentos e medidas a serem tomadas". Poucas horas antes do início do evento - que seria na última sexta-feira (30) -, no entanto, os estudantes foram surpreendidos por um oficial de justiça, comunicando a prolação de uma decisão judicial impedindo a realização da reunião. De acordo com a liminar, concedida pela juíza Moema Miranda Gonçalves, "a matéria veiculada na pauta não se reveste de qualquer urgência para os estudantes e para a prestação de serviços educacionais fornecidos pela UFMG". A ação foi impetrada por dois alunos da graduação da universidade que estabeleceram, entre as alegações, um "aparelhamento político-partidário" do Centro Acadêmico. Em nota divulgada na própria sexta-feira (30), a Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Minas Gerais (OAB/MG) fez um "alerta" mostrando "preocupação" com a decisão da juíza de proibir o debate político na universidade. No texto, a entidade relembra que o debate político está na essência da faculdade e que "a mais antiga Faculdade de Direito de Minas Gerais nasceu como “Faculdade Livre de Direito” e não por acaso, Afonso Pena, seu patrono, foi o primeiro governador de Minas eleito pelo voto direto do cidadão".  "Não cabe nem sequer ao Supremo Tribunal Federal intervir no exercício do direito de associação e escolher a matéria sobre a qual deva ou não deva haver debate no âmbito do universo estudantil", alerta a nota. Pelo Facebook do Centro Acadêmico Afonso Pena, o advogado Tito Lívio de Figueiredo, membro da Ordem, manifestou apoio aos estudantes e classificou a decisão da juíza como "fascista". "Meu escritório está à disposição de vocês. Decisão fascista de juiz que não está comprometido com nossa CF. É o que digo: "estamos vivendo um estado judicial de exceção!", escreveu. Procurada pela reportagem da Fórum para que se pronunciasse, a juíza responsável pela decisão liminar não foi localizada. Confira abaixo a íntegra da nota da OAB sobre o episódio. Nota de alerta da OAB/MG sobre liminar que impediu assembleia na Faculdade de Direito da UFMG Foi com grande preocupação que a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais recebeu a notícia de que uma magistrada da 9ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte deferiu, na sexta-feira (29/4), liminar (autos n. 50598243120168130024) proibindo o Centro Acadêmico Afonso Pena (CAAP), órgão de representação estudantil da Faculdade de Direito da UFMG, de realizar assembleias para debater e se posicionar sobre o contexto político da atualidade. Segundo a decisão, o CAAP não poderia discutir com seus associados o referido tema “por fugir às suas atribuições estatutárias”. A Faculdade de Direito da UFMG é também conhecida como a “Casa de Afonso Pena” e foi criada, em 1892, por obra de intenso labor desse político ilustre, que também dá nome ao seu Centro Acadêmico. A mais antiga Faculdade de Direito de Minas Gerais nasceu como “Faculdade Livre de Direito” e não por acaso. Afonso Pena, seu patrono, foi o primeiro governador de Minas eleito pelo voto direto do cidadão. Ao longo de seus quase 125 anos, a “Vetusta” faculdade formou nomes conhecidos pelo seu compromisso com as causas democráticas, como Tancredo Neves, Edgar Godoy da Mata Machado, Ariosvaldo de Campos Pires e Patrus Ananias. Um dos mais ilustres presidentes do CAAP, José Carlos Mata Machado, pereceu, em 1973, na luta pela democracia. A Faculdade de Direito da UFMG e o Centro Acadêmico Afonso Pena participaram ativamente da construção de um Brasil livre. O movimento estudantil, que se pretendeu policiar no presente caso, é o mesmo que forneceu e sempre fornecerá alguns dos quadros mais importantes para a construção política do Brasil. De suas fileiras saíram nomes que ocuparam papel de destaque nos principais cargos da vida pública nacional, inclusive da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu Conselho Federal e nas Subseções de todo o país. É surpreendente que, em pleno 2016, na plenitude da experiência democrática, um juiz togado entenda por bem proibir os estudantes da sempre “Faculdade Livre de Direito” da UFMG de discutir o contexto político da atualidade, que tem assumido protagonismo na mídia nacional e internacional e movimentado todos os setores da sociedade civil. Mesmo em caso de eventual desistência dessa ação judicial por seus autores, fica, para todos os brasileiros, um alerta a respeito desse lamentável episódio: o Estado Democrático de Direito é totalmente incompatível com o cerceamento às liberdades civis. A Constituição Cidadã de 1988 pontifica: “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização” (art. 5º, XVI). Por outro lado, se alguma proibição tiver de ser invocada, no presente caso, ela não se dirigirá contra o direito de reunião – sagrado – de todo cidadão e cidadã. Proibida, em realidade, é a ingerência do Estado em matéria de direito de associação, como se extrai do art. 5º, XVIII, da Constituição: “a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”. Não cabe nem sequer ao Supremo Tribunal Federal intervir no exercício do direito de associação e escolher a matéria sobre a qual deva ou não deva haver debate no âmbito do universo estudantil. Restrições ao direito de reunião apenas podem ser toleradas em casos de ESTADO DE DEFESA ou de ESTADO DE SÍTIO; situações, obviamente, não vivenciadas pelo Brasil na atualidade (arts. 136 e 139, CF). Por fim, a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais confiante na prevalência dos valores democráticos, reitera a importância de que a escolha de todos, em momento histórico como o atualmente vivenciado no país, seja a da defesa da liberdade e da igualdade, bem como a da supremacia do interesse popular. Antônio Fabrício de Matos Gonçalves, presidente da OAB/MG