Opinião: o que a demissão de Xico Sá diz a respeito da mídia tradicional

O "proselitismo eleitoral" que a Folha diz condenar marca presença quase todos os dias em seu conteúdo, às vezes sob a forma disfarçada de "análise". Por que não se posicionar de forma transparente em prol desse ou daquele candidato, como fazem tantos veículos mundo afora?

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O "proselitismo eleitoral" que a Folha diz condenar marca presença quase todos os dias em seu conteúdo, às vezes sob a forma disfarçada de "análise".  Por que não se posicionar de forma transparente em prol desse ou daquele candidato, como fazem tantos veículos mundo afora? Por Glauco Faria Ontem surgiu a notícia de que o colunista Xico Sá pediu demissão da Folha de S.Paulo por não poder ter expressado declaração de voto em Dilma Rousseff em sua coluna na publicação. Na justificativa do editor-executivo do jornal, Sérgio Dávila, “em sua última coluna semanal, que seria publicada no sábado 11/10 no caderno Esporte, ele declarava voto num dos candidatos à corrida presidencial, o que fere a política do jornal, segundo a qual os colunistas devem evitar fazer proselitismo eleitoral em seus textos. Se quiserem, podem escrever artigo em que revelam seu voto e defendem candidatura na pág. A3 da Folha. Esta opção foi dada a Xico Sá, que recusou a oferta”. “É a política da empresa”, você pode alegar. Mas será que é mesmo? Quando se fala em “proselitismo eleitoral” isso não equivale a uma declaração de voto explícita. Afinal, em textos de outros colunistas como Reinaldo Azevedo e na página A2 da Folha, por exemplo, o proselitismo eleitoral marca presença quase todos os dias, sob a forma disfarçada de “análise”, muitas vezes tendo por objetivo a crítica, por vezes desmedida, a uma candidatura. No segundo turno, quando só existem duas opções, atacar sistematicamente um lado só significa o que mesmo? O marketing da Folha de S.Paulo, há tempos, se baseia em uma dita pluralidade, que seria refletida em textos de articulistas que pensam de forma divergente da linha do veículo. Mas não há opinião ou análise dissonante que compense toda uma cobertura toda editorializada, seja por meio de textos, infográficos, posicionamento de fotos, imagens, charges e tantos outros meios que tornam a diversidade alegada só um item de propaganda. Seria saudável que a Folha se posicionasse de forma transparente em prol desse ou daquele candidato, como já fez em outras ocasiões o Estadão ou como fazem veículos mundo afora, a exemplo do posicionamento que Fórum e Carta Capital assumiram nesse segundo turno. Não fazê-lo é ruim não só para o leitor, mas também para a própria credibilidade da imprensa, ou, se preferirem, da mídia, de uma forma geral. O proselitismo velado Vejamos um exemplo de como o tal “proselitismo eleitoral” é permitido em certas áreas da Folha, na sua versão on-line. No domingo, vi que uma das cinco postagens mais lidas do portal Uol tinha como título “Bruna Marquezine e a retórica petista”. Percebe-se que é um texto que ataca Dilma e o PT do início ao fim, concluindo que “o arsenal retórico do PT pode ajudar a eleger Dilma”, mas “em nada ajuda a evolução da sociedade”. Lá no rodapé, estava: “Samuel de Abreu Pessôa é formado em física e doutor em economia pela USP e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV”. O leitor que acessa o texto espera não uma análise imparcial, posto que esta não existe, mas talvez isenta, sem interesses diretos sobre o que está sendo falado ali. Daí vou à pesquisa sobre o autor. Descubro aqui que ele participou de um programa, em julho de 2014, sobre economia e agronegócio, representando o candidato Aécio Neves. Em outra postagem de um colunista da revista Veja, ele é saudado como um “nome muito bom” que o candidato tucano escolheu para a sua área econômica. Quem lê o texto, percebe toda a sua inclinação. Mas pela descrição que consta do autor, na qual não se diz que é um integrante da campanha de Aécio, pode-se chegar à conclusão de que se trata de um observador externo. Não é. É alguém que chega a representar um candidato à presidência em dado contexto e faz parte da equipe que pensa a área econômica do presidenciável do PSDB. Mas isso, para a Folha, não é proselitismo. Afinal, ele não "declarou" seu voto, não é mesmo? Já o Xico Sá... Pode ser até que esta informação sobre o colunista esteja em outro texto do autor, mas nenhum leitor vai navegar em cada postagem para achar tal dado.Tais contradições refletem o quanto a estrutura de determinadas empresas é autoritária e até mesmo discriminatória. E elas se dizem defensoras da liberdade de imprensa, argumentando ainda que entendem esta garantia como equivalente à liberdade de expressão. Alguém ainda acredita nisso? Xico Sa