Outro Fórum Social Mundial é possível

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Pela primeira vez, depois de três anos, o Brasil e Porto Alegre terão um janeiro sem Fórum Social Mundial (FSM). O encontro internacional dos que querem um mundo novo começa em 16 de janeiro, mas será em Mumbai, Índia. Em 2005, volta a seu local de origem. Mas há algo mais forte que as simples mudanças geográficas movimentando-se no planeta Porto Alegre. Longe dos olhos da “grande” imprensa, sempre incapaz de compreender o FSM, amadureceu rapidamente, nos últimos meses, a idéia de que o Fórum não pode ser apenas um grande festival. Ele precisa manter sua diversidade a todo custo, mas está pronto para dar um passo adiante. Trata-se de localizar propostas e ações comuns, de identificar questões decisivas para a construção de uma nova sociedade e de, possivelmente, desencadear campanhas internacionais em torno delas.

De Mumbai 2004 a Porto Alegre 2005 A mudança não se dará em Mumbai. As marcas do encontro na Índia serão a força, a multiplicidade e o colorido dos movimentos asiáticos. Até o final do ano, esperava-se para o IV FSM a presença de cerca de 100 mil pessoas e a realização de 1200 oficinas e seminários. São números semelhantes aos de Porto Alegre 2003. A experiência brasileira faz sucesso. O novo encontro vai se realizar a quase 20 mil quilômetros de distância dos anteriores, e sob uma cultura política totalmente distinta. No entanto, os traços essenciais da “arquitetura” do Fórum foram mantidos: estímulo às atividades “autogeridas” (oficinas e seminários propostos por qualquer organização inscrita); ausência de uma declaração final, ou de votações que dividam os participantes; pluralidade; balanço entre atividades de aprofundamento e grandes conferências onde se populariza o debate sobre alguns temas; acampamento da juventude. A idéia dos indianos parece ser: não se mexe em time que vem ganhando. Será?

A novidade de Perugia O Fórum Social Mundial é articulado (“facilitado”, no jargão FSM) por um Conselho Internacional, que reúne mais de cem redes globais de movimentos e organizações, e funciona por meio de seis comissões. Ao longo de 2003, a comissão mais ativa foi a de Conteúdos e Temas. Ao se reunir em outubro, na cidade italiana de Perugia, ela foi sensível a um anseio cada vez mais explícito no planeta Porto Alegre: não basta enunciar a idéia de um mundo novo, é preciso construí-lo. A vida é cheia de paradoxos: o fato que mais está estimulando esta mudança é a escalada imperial do governo Bush. Ela mostrou como nunca antes que o capitalismo contemporâneo é uma ameaça concreta e permanente de barbárie; e que, pulverizados, os movimentos são incapazes de enfrentá-la.

Diversidade é sinônimo de pulverização? A reunião de Perugia ocorreu sob impacto de uma mobilização notável. Na véspera de seu início, 250 mil pessoas – no mínimo 80% com menos de 25 anos – haviam participado de uma Marcha pela Paz que percorreu 24 quilômetros entre essa cidade e Assis (terra Francisco, o santo dos pobres e da natureza). Embalada por estes ares, a Comissão de Conteúdos formulou três propostas essenciais:

O Fórum deve trabalhar ativamente para que as atividades autogestionadas dialoguem entre si. Ou seja, devem ser criados mecanismos concretos que permitam a qualquer pessoa que propõe uma oficina ou seminário saber instantaneamente que outras organizações estão trabalhando com o mesmo tema e como contatá-las.
n O Fórum deve aprender com sua própria experiência. Solicitou-se ao sociólogo português Boaventura Souza Santos, presente em Perugia e estudioso destacado do FSM, um primeiro esforço para sistematizar o que há de convergências, divergências e lacunas entre os movimentos que vão a Porto Alegre.

Além de tudo o que já se faz nos encontros anuais, é possível criar os chamados temas transversais. Aqui está, talvez, a principal novidade.

“Temas transversais”, novo desafio Se em cada momento algumas questões são decisivas, para evitar o risco de barbárie e caminhar rumo a uma nova sociedade, não se deveria permitir que os movimentos possam somar esforços em torno dela? A resposta da Perugia a esta questão é, claramente, um sim. E a fórmula encontrada para materializar o passo adiante é coerente com a diversidade do FSM. Cada Fórum Social teria quatro “temas transversais”, rotativos e escolhidos com um ano de antecedência (no encontro anterior). Para evitar repetições, haveria sempre um tema sobre Política, um sobre Economia, um sobre Sociedade e um sobre Cultura. Estes temas seriam apresentados como desafios. Além das atividades relativas a seus temas específicos, as organizações que vão a cada Fórum seriam convidadas a contribuir para a formulação de alternativas em torno dos assuntos transversais. A fórmula de não submeter nada polêmico a votação permanece. Mas é provável que a simples existência de temas-desafio estimule um movimento de soma de esforços, do qual tendem a sair consensos avançados. A proposta será apresentada formalmente ao conjunto do Conselho Internacional logo após o FSM-Mumbai. Se for aprovada, você terá mais um motivo para ir a Porto Alegre, em janeiro de 2005. Pode ser o primeiro Fórum a passar das palavras à ação, na batalha para superar o capitalismo.