Paul Craig Roberts: A democracia ocidental morreu?

Para garantir que os bancos não tenham perdas, a população é obrigada a aceitar a diminuição de seus padrões e abdicar de sua qualidade de vida. Assim é a “Nova Democracia”, o ressurgimento da ordem feudal. Alguns aristocratas absurdamente ricos e todo o resto da população como servos obrigados a sustentar a nova ordem vigente. A pilhagem que teve início na Grécia continua agora na Ucrânia. Quem será a próxima vítima?

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Para garantir que os bancos não tenham perdas, a população é obrigada a aceitar a diminuição de seus padrões e abdicar de sua qualidade de vida. Assim é a “Nova Democracia”, o ressurgimento da ordem feudal. Alguns aristocratas absurdamente ricos e todo o resto da população como servos obrigados a sustentar a nova ordem vigente. A pilhagem que teve início na Grécia continua agora na Ucrânia. Quem será a próxima vítima? Por [*] Paul Craig Roberts ? Institute for Political Economy. Original “Is Democracy Dead In The West?”. Traduzido por Mberublue e publicado por redecastorphoto Descobriremos a resposta para a pergunta colocada no título quando soubermos o resultado da contenda entre o novo governo grego, formado pelo partido político Syriza e o Banco Central Europeu que se alinha aos interesses da União Europeia e dos Estados Unidos contra a Grécia. Os espartanos, cujas capas vermelhas e proezas na guerra enchiam de medo os invasores da terra grega e de seus oponentes de outras cidades-estados, não existem mais. Mesmo a própria Atenas não passa de uma ruína histórica. Os gregos quando confrontados foram capazes, apesar de contar com apenas 300 espartanos aos quais se somaram alguns milhares de coríntios, tebanos e outros guerreiros, de deter um exército persa de cem mil homens nas Termópilas, e que no final derrotaram a frota persa na Batalha de Salamina e o exército persa na Batalha de Plateia só existem nos livros de História. Os gregos históricos se tornaram um povo legendário. Nem mesmo os romanos conseguiram conquistar a Pérsia, mas um punhado de gregos conseguiu deter a tentativa persa de conquistar a Grécia. Mas, apesar de sua história gloriosa, os gregos não conseguiram deter um punhado de bancos da Alemanha e da Holanda que invadiram a Grécia. Caso ainda existisse aquela Grécia gloriosa e destemida da historia, os bancos privados da União Europeia estariam tremendo de medo, pois o povo grego está sendo explorado impiedosamente por estes bancos e pela União Europeia, que representam atualmente para a Grécia uma ameaça muito maior do que a Pérsia jamais representou. A Grécia, espoliada de sua independência pela adesão à União Europeia e pela aceitação do Euro como moeda única, perdeu sua soberania. Não pode financiar a si mesma, pois perdeu o controle sobre o próprio dinheiro. A Grécia tem que contar com bancos privados de outros países. No século XXI os bancos privados europeus não podem contemplar a possibilidade de perder dinheiro simplesmente porque são incompetentes e concederam empréstimos sobre empréstimos aos países membros da União Europeia. Por incrível que pareça, a falha evidente desse procedimento não é creditada aos bancos e sim aos governos mutuários e sua população. Há relatos esclarecendo que os banqueiros norte americanos da empresa Goldman Sachs, também chamada ocasionalmente de “Gold Sacks” (“ouro em sacas” – NT) escondeu o real volume do débito grego, para que os bancos estendessem ainda mais os empréstimos para a Grécia, colocando dessa maneira o país e o povo grego prontos para serem saqueados. Os banqueiros trapaceiros podem sempre argumentar, mais uma vez desonestamente, que o povo grego se aproveitou dos recursos obtidos através dos empréstimos e, portanto, agora têm que pagar esses empréstimos através do corte das pensões de seus idosos, do desemprego, da redução dos salários e através da venda dos bens nacionais gregos. Esta é a verdadeira face da austeridade imposta ao povo grego pela União Européia e dos credores da Grécia. A Grécia se encontra em estado de prostração. Os gregos atualmente estão na realidade cometendo suicídio, por que não podem prover a si mesmos, nas atuais condições de baixa em que vivem e que foram criadas para eles pela União Europeia e pelos bancos privados, sem nenhuma outra razão a não ser a negativa dos bancos, que não devem amortizar (write down – condição econômica em que acontece a depreciação monetária de determinado ativo, porque ele se encontraria supervalorizado em relação ao seu real valor de mercado – NT) os empréstimos. Então, um dos resultados da “democracia” grega é o suicídio. Com suficiente democracia, poderemos controlar a população mundial e deter a destruição do capital natural. Tudo o que temos que fazer é permitir que os banqueiros saqueiem à vontade o mundo inteiro. O que o Syriza pode fazer? Na realidade muito pouco, sem os espartanos. As intenções do partido e de seus líderes são honestas e merecem o nosso respeito. O Syriza é um partido popular e é exatamente isso o que o marca para a destruição. Jamais se permitirá que a voz do povo afete as políticas do mundo ocidental. As pessoas que eles governam não poderiam ser menos importantes para os poderosos grupos de interesses dos ricos que dominam o mundo ocidental. Mal o Syriza havia se instalado no gabinete quando a Bloomberg, uma agência de notícias de negócios, comunicou ao novo Primeiro Ministro grego, Alexis Tsipras, que o Syriza tinha que dançar conforme a música dos credores. Tsipras declarou que o novo governo grego não pretende impor um “choque catastrófico” aos seus credores, mas apenas conseguir melhorar as condições irracionais impostas à Grécia, na intenção de poder dar satisfações aos bancos privados que são seus credores e ao mesmo tempo evitar a instabilidade social, política e econômica da Grécia. Em oposição a estas declarações bem razoáveis, a Bloomberg relatou que o novo gabinete grego teria comunistas que são favoráveis a uma maior aproximação com a Rússia. Na clara intenção de lembrar ao novo gabinete dos dominados gregos quem é o dono do chicote que desce sobre suas costas e sobre o mercado financeiro grego, as ações e títulos gregos sofreram um ataque do qual resultou uma baixa violenta. O aviso de Wall Street e da União Europeia foi claro: você será destruído se nos desafiar. A punição do novo governo grego foi imediata. Segundo a Bloomberg: (...) as ações e títulos gregos tiveram queda por três dias consecutivos, depois que os novos ministros afirmarem que devem cessar com a venda de alguns bens do Estado Grego e aumentar o salário mínimo. Os rendimentos de títulos com vencimento em três anos subiu de 2,99% para 16,69%. O referencial Índice Geral de Atenas decresceu 9,2%, atingindo o menor nível desde o ano de 2012, levado para baixo por um colapso no valor dos bancos. Entenderá Tsipras que as instituições financeiras gregas continuarão a ser punidas enquanto estiverem por trás de seu governo? A Bloomberg colocou tudo em pratos limpos: (...) a Alemanha advertiu a nação mediterrânea contra o abandono de acordos de ajuda previamente assinados, depois de analistas afirmarem que a Grécia parecia estar em rota de colisão com seus pares europeus, o que fatalmente levaria a um futuro abandono da zona do euro. As declarações dos ministros recém nomeados “sugerem que em futuro breve deverão acontecer confrontação e negociações tensas”, escreveu em nota a seus clientes Vangelis Karanikas, presidente da Títulos Euroxx, baseada em Atenas. O que é a “rota de colisão” (aqui, parece ter havido um erro de digitação no original, pois anteriormente o autor grafara “collision course” [rota de colisão] e neste parágrafo “collusion course” - NT) do Syriza? O novo governo quer apenas tornar menos onerosos os acordos feitos pelos governos anteriores que venderam o povo grego. O novo governo quer apenas para de doar os bens gregos a preço vil para os clientes de seus credores e aumentar o salário mínimo para que o povo grego possa ter pão e água o bastante para sobreviver. No entanto, para os bancos privados que são credores da Grécia, para a Alemanha de Merkel que está por trás dos bancos, para Washington que pouco se importa com o que quer que venha a acontecer com os gregos, para as elites gregas que se veem como “parte da Europa”, o Syriza é apenas um obstáculo a ser removido. Assim, os títulos e ações gregos são atacados, ameaças que podem influenciar e causar medo em parte da população grega saturada de propaganda no sentido de que ou a Grécia faz parte da União Europeia ou será ignorada pela história são lançadas diuturnamente. Uma conclusão a ser tirada disso tudo é que o povo grego parece muito com o povo americano em sua despreocupação. O partido Syriza obteve apenas 37% dos votos. São mais votos que os obtidos por qualquer outro partido grego, mas não o suficiente para demonstrar para a União Europeia e para os Estados Unidos que o povo grego está ombro a ombro com seu governo. Em vez disso, mostra que o novo partido teve que formar um governo em coligando-se com outro partido, o qual poderia cair fora do governo a qualquer tempo em troca, talvez, de um pouco de dinheiro. Mostra também que o partido Syriza pode ser demonizado no ocidente e apresentado ao povo grego como uma ameaça para a Grécia. O novo partido está ciente de sua fraqueza. O novo Primeiro Ministro afirma não querer confronto, mas que também não pode continuar com a leniência exibida por governos anteriores. É necessário que se alcance uma acomodação razoável de parte a parte. Acontece que é pouco provável que haja uma acomodação razoável, pelo simples motivo de que tal acomodação não faz parte dos desejos de Washington, da União Europeia e dos credores da Grécia. Qual o propósito da criação da “crise financeira da Grécia”? É deixar estabelecido para todos os países membros que não mais existe soberania entre eles e que os bancos que emprestam dinheiro para os tais estados não soberanos não são responsáveis por quaisquer perdas relativamente a esses empréstimos. A responsabilidade é da população dos países endividados. Para garantir que os bancos não tenham perdas, a população é obrigada a aceitar a diminuição de seus padrões e abdicar de sua qualidade de vida. Assim é a “Nova Democracia”. Nada mais que o ressurgimento da ordem feudal. Alguns aristocratas absurdamente ricos e todo o resto da população como servos obrigados a sustentar a nova ordem vigente. A pilhagem que teve início na Grécia continua agora na Ucrânia. Quem será a próxima vítima? Terá o partido Syriza condições para levantar o povo grego contra seus saqueadores, levando-se em consideração de que obteve apenas 37% dos votos? Conseguirá a Grécia obter forças para escapar de uma situação semelhante à Idade das Trevas na Europa, quando as populações foram longa e barbaramente espoliadas por piratas saqueadores? Talvez, se a Grécia se realinhar com a Rússia e ao grupo de países BRICS em busca de amparo financeiro. [*] Paul Craig Roberts (nascido em 03 de abril de 1939) é um economista norte-americano, colunista do Creators Syndicate. Serviu como secretário-assistente do Tesouro na administração Reagan e foi destacado como um co-fundador da Reaganomics. Ex-editor e colunista do Wall Street Journal,  Business Week e Scripps Howard News Service. Testemunhou perante comissões do Congresso em 30 ocasiões em questões de política econômica. Durante o século XXI, Roberts tem frequentemente publicado em Counterpunch e no Information Clearing House, escrevendo extensamente sobre os efeitos das administrações Bush (e mais tarde Obama) relacionadas com a guerra contra o terror, que ele diz ter destruído a proteção das liberdades civis dos americanos da Constituição dos EUA, tais como habeas corpus e o devido processo legal. Tem tomado posições diferentes de ex-aliados republicanos, opondo-se à guerra contra as drogas e a guerra contra o terror, e criticando as políticas e ações de Israel contra os palestinos. Roberts é graduado do Instituto de Tecnologia da Geórgia e tem Ph.D. da Universidade de Virginia, com pós-graduação na Universidade da Califórnia, Berkeley e na Faculdade de Merton, Oxford University.