População carcerária dos EUA cresceu 780% em 30 anos

Nos últimos 30 anos, a população reclusa em penitenciárias federais passou de 25 mil para 219 mil pessoas

Unidade 4 da prisão estatal de Novo México, Estados Unidos. Foto: Shelka04 en en.wikipedia - CC BY-SA 3.0
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Nos últimos 30 anos, a população reclusa em penitenciárias federais passou de 25 mil para 219 mil pessoas Por Carey L. Biron, da IPS/Envolverde O braço investigativo do parlamento  dos Estados Unidos alertou que três décadas de aumento “sem precedentes históricos” da população carcerária levaram a uma superpopulação que afeta a infraestrutura do sistema federal de prisões. Nos últimos 30 anos, a população reclusa em penitenciárias federais passou de 25 mil para 219 mil pessoas, o que representa aumento de quase 780%, segundo o Serviço de Investigações do Congresso, datado de 22 de janeiro. Os Estados Unidos prenderam uma proporção maior de pessoas do que nenhum outro país, e hoje registra 716 reclusos para cada cem mil habitantes. Embora os informes do Serviço de Investigação não tenham sido entregues ao público, uma cópia do mesmo pode ser encontrada no link http://www.fas.org/sgp/crs/misc/R42937.pdf. [caption id="attachment_21326" align="alignright" width="300"] Unidade 4 da prisão estatal de Novo México, Estados Unidos. Foto: Shelka04 en en.wikipedia - CC BY-SA 3.0[/caption] “Este é um dos maiores problemas de direitos humanos dentro dos Estados Unidos, já que muitos dos detentos pertencem a setores de baixa renda e a minorias étnicas e raciais, frequentemente marginalizados pela sociedade”, disse à IPS a subdiretora do programa norte-americano da organização Human Rights Watch, Maria McFarland. Nos últimos anos, o escritório de McFarland registrou novas tendências nas medidas de detenção, que mostram aumento de menores de idade e de idosos colocados atrás das grades, em consequência da imposição de uma política de castigos mais severos. “No ano passado, cerca de 95 mil menores de 18 anos foram para a prisão, e nesse número não contamos os que foram enviados para instituições penais para adolescentes”, pontuou McFarland. “E, entre 2007 e 2011, a população de maiores de 64 anos cresceu 94 vezes em relação à população carcerária em geral. É evidente que as prisões não estão equipadas para cuidar de idosos, e se pode perguntar que perigo representam para a sociedade, qual é a justificativa para mantê-los presos”, acrescentou. Segundo o informe do Serviço de Investigações, uma quantidade crescente desses detentos é presa por acusações vinculadas a violações de normas migratórias e posse de arma. Mas o número maior se deve a pequenos delitos de drogas, uma tendência que pode ser contraproducente para reduzir as estatísticas de delinquência, afirmou o autor do informe, Nathan James, especialista em políticas penais. “A investigação sugere que, embora o encarceramento tenha contribuído para reduzir as taxas de crimes violentos na década de 1990, há reduções marginais associadas com níveis de encarceramento sempre crescentes”, apontou James. Uma explicação possível é que cada vez mais as pessoas são condenadas à prisão por crimes que têm “um alto grau de substituição”, acrescentou. Por exemplo, ao enviar para a prisão um violador contumaz, o sistema judicial tem o poder de impedir mais ataques sexuais desse criminoso e é provável que ninguém ocupe seu lugar. “Mas, ao prender um vendedor de drogas, é possível que alguém assuma a vaga. Portanto, prendendo esse indivíduo não se evita novos crimes”, ressaltou. O boom da população carcerária nos Estados Unidos deve ser rastreada em mudanças dentro do sistema penal federal. Nas últimas décadas ficou popular a “mão de ferro” judicial, pela qual mesmo crimes não violentos são reprimidos com duras penas de reclusão. Já a superpopulação é um problema generalizado. Em 2011, o sistema penitenciário funcionou 39% acima de sua capacidade, segundo o informe. Em consequência, quase duplicou o orçamento do Escritório de Prisões, chegando a US$ 6,4 bilhões, embora ainda haja problemas de infraestrutura não resolvidos no valor de centenas de milhões de dólares. Estes problemas contrastam com certas tendências no âmbito dos Estados. Embora alguns tenham níveis preocupantes de superpopulação carcerária – como a Califórnia, que em 2011 recebeu ordem da Suprem Corte de Justiça para adotar medidas a respeito –, nos últimos anos foram tomadas medidas para reduzir o encarceramento. Algumas podem ser em razão da escassez orçamentária. O custo anual de alojamento de um detendo gira em torno de US$ 25 mil a US$ 30 mil. Um informe do grupo promotor de reformas penitenciárias Sentencing Project, todas as populações carcerárias dos Estados Unidos diminuíram 1,5% em 2011. E mais, no ano passado legisladores de 24 estados adotaram políticas que “podem contribuir para diminuir o número de presos”. “Houve uma notável mudança na atividade estadual para acabar com o nosso vício em encarceramento”, disse à IPS a subdiretora legal da União de Liberdades Civis dos Estados Unidos, Vineeta Gupta. “Alguns estados debatem algo que teria sido impossível há dez anos, sobre atuar com inteligência, em lugar de dureza, contra o crime. Nenhuma dessas medidas é suficientemente ampla para responder à grande dimensão do problema, mas são pontos de partida importantes. Lamentavelmente, o governo federal vai na direção contrária”, ressaltou Gupta. O elemento mais importante para explicar os números da população carcerária pode ser os requerimentos mínimos obrigatórios para impor sentenças, que, tanto sob a lei federal quanto a estadual, impõem de forma automática certas penas de prisão para determinados crimes, em particular o narcotráfico. Tais políticas cercearam a capacidade dos juízes em conceber respostas judiciais às circunstâncias individuais. Com o passar dos anos, alguns magistrados renunciaram a essas políticas de requerimentos mínimos e outros travaram visíveis batalhas por seu desmantelamento. “Deve-se dar atenção especial à reforma dos requerimentos mínimos e aos mecanismos de liberdade condicional, pois podem funcionar para reduzir a população carcerária estadual”, diz o Sentencing Project. “Os requerimentos mínimos obrigatórios não reduzem o crime, e têm como resultado penas mais longas que contribuem para a superpopulação”, acrescenta. No ano passado, sete Estados relaxaram ou rechaçaram algumas regulações de requerimentos mínimos obrigatórios. Esta análise se assemelha às conclusões do Serviço de Investigações. No mês passado o senador Patrick Leahy, presidente do influente Comitê Judicial do Senado, disse que está disposto a apoiar o fim dos requerimentos mínimos federais, que qualificou de “um grande erro”. Para Gupta, “os comentários de Leahy são um grande passo para uma conversação sobre as forças motrizes do crescimento federal. A esperança é que algo do que está ocorrendo nos Estados, que registram em certos lugares uma criminalidade muito baixa, sirva de exemplo para o sistema federal.