“Queremos que nossa experiência se multiplique”, diz fundador da Educafro

Frei David dos Santos fala sobre o cursinho popular, que neste ano completa 25 anos, tendo atendido cerca de 60 mil pessoas.

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Frei David dos Santos fala sobre o cursinho popular, que neste ano completa 25 anos, tendo atendido cerca de 60 mil pessoas. Por Ana Maria Morau, da Rede Fórum de Jornalismo | Foto: Agência Áfricas redeforum-logoUm dos mais antigos cursinhos comunitários do país quer se transformar em franquia social. Em entrevista à Rede Fórum, frei David dos Santos, fundador e diretor executivo da Educafro, explica como a iniciativa tem levado muitos jovens negros e negras ao ensino superior. Segundo ele, a cada dez alunos atendidos, entre sete e oito conseguem uma vaga numa universidade, seja em pública ou particular com bolsa via Prouni. Além disso, o foco da instituição tem sido a luta por políticas públicas para os negros. “É algo revolucionário e queremos que nossa experiência possa ser multiplicada em todo o Brasil porque entendemos que a exclusão do negro e do pobre nas escolas públicas por falta total de seriedade e de empoderamento dos pobres é algo que nos deixa arrepiados. Portanto, queremos acelerar esse processo e para isso concluímos que o único caminho é transformar a Educafro em franquia social”, diz. Com a experiência de ter atendido cerca de 60 mil pessoas, a entidade tem dois focos: a oportunidade para negros e pobres romperem a barreira da exclusão social e a sua organização para exigirem políticas públicas que possam transformar a realidade e promover cidadania, combatendo a discriminação, o preconceito e a falta de acesso à educação e saúde. Confira a entrevista a seguir. Há quanto tempo existe o cursinho? O cursinho Educafro existe desde 1992. Foi um trabalho que começamos na Baixada Fluminense com outros nomes, mas o foco é garantir o ingresso do pobre, do negro nas universidades públicas e, para aqueles que não conseguem passar nas universidades públicas, garantir boas parcerias que ofereçam bolsas de estudos em universidades particulares. Como surgiu a ideia do cursinho? A ideia surgiu a partir de uma constatação. Como padre, fiz uma reunião em uma assessoria para quase cem jovens e para nossa tristeza, a maioria negros da Baixada Fluminense, só dois tinham interesse em cursar uma faculdade. E isso me deixou muito espantado, assustado porque eram jovens que estavam prontos para ser mão de obra barata do capitalismo. E não é esse o sonho de Deus. Quantas pessoas foram atendidas na Educafro até hoje? Estimamos que ao longo desses anos, mais de 60 mil pessoas foram atendidas pela Educafro, entrando nas universidades públicas, no Prouni e recebendo bolsas em faculdades particulares, no Rio de Janeiro, em São Paulo, Brasília, Minas Gerais, Baixada Santista e Regional Bragantina. Quem pode cursar a Educafro? O cursinho é aberto a qualquer pessoa pobre que queira se empoderar nos processos educacionais e recuperar seu direito de cursar universidade pública ou particular, direito esse quebrado, arrebentado, proibido pela péssima qualidade do ensino público nas escolas estaduais. Como é feita a inscrição? A inscrição é feita diretamente nas sedes da Educafro. É preciso consultar, no site (www.educafro.org.br),as datas das reuniões que os candidatos necessitam participar. Nossa estratégia tem sido a seguinte: o pobre vence não quando a gente quer, mas quando eles querem, quando se sentem provocados ou envergonhados pela exclusão e querem mudar. Até quando pode ser feita a inscrição? Diante desse fato citado acima, decidimos que o cursinho Educafro abre sua inscrição o dia 1 de fevereiro e acaba no final do ano, quando termina a prova do Enem. Ou seja, nos concluímos que o aluno que entra em setembro tem muito mais chance de voltar com garra no ano seguinte do que aquele que se compromete a iniciar os estudos no começo do ano e não retorna. A inscrição é feita de maneira direta. O candidato deve participar de uma reunião que trata do funcionamento da entidade e ele recebe uma carta encaminhando-o para um dos núcleos existentes da rede Educafro. A inscrição poderá ser feita em qualquer época do ano, porque nossa experiência mostrou que com  pobre não é quando a gente quer, mas quando eles querem, quando despertam, quando estão entusiasmados. Quando será o início das aulas? As aulas se iniciam de acordo com a realidade de cada núcleo. Por exemplo, tem núcleo cujas aulas já começaram. Outros vão começar as inscrições agora. Então há um dinamismo concreto e constante. Tem núcleo que se inicia no mês de maio, outros, em junho. Então esse dinamismo de amplitude e constante nascimento de novos núcleos permite que acolhamos os jovens em qualquer época do ano. Quais os endereços? Hoje, nós estamos focando muito mais no cursinho online. Temos núcleos presenciais, mas percebemos que hoje o que está pegando são os cursos Educafro online. Todo mundo que mora em São Paulo e que tenha interesse deve comparecer na sede central da Educafro, que fina na rua Riachuelo, 342, Centro, próximo a Praça da Sé. No Rio de Janeiro, os interessados devem ir na sede estadual Rio, que fica na rua Uruguaiana, 77, dentro da igreja do Rosário. Existe uma estatística de aprovação nas universidades de alunos oriundos do cursinho da Educafro? A estatística funciona da seguinte maneira: só consideramos os alunos que perseveram até o fim. Ou seja, quem se escreve para prestar o Enem e nas universidades públicas. Entre esses, de cada dez alunos, sete ou oito são aprovados em algum curso via Enem, nas públicas, no Prouni ou recebem bolsas de estudos em faculdades particulares. O cursinho é totalmente gratuito ou existe alguma taxa que o aluno tem de pagar? O curso comunitário é radicalmente contra o paternalismo. Então o aluno contribui com 5% do salário mínimo por mês. Esse dinheiro paga lanches e passagens para os professores e também custeia os materiais necessários para o funcionamento do cursinho. O material didático é oferecido aos alunos? Já tivemos umas cinco apostilas e muitos problemas porque cada professor tem um jeito de trabalhar, tem um foco, tem um conceito de trabalho em sala de aula em função da qualidade, do nível dos alunos de cada sala. No momento, temos uma apostila online e os professores têm liberdade para adotá-la ou não. O professor é voluntário e, portanto, é importante que ele já tenha sua metodologia. Além do cursinho, existem outras atividades oferecidas aos estudantes? Nós oferecemos várias outras atividades e, principalmente, focamos na empregabilidade, com oferecimento de estágios e, acima de tudo, nosso foco número dois, que levamos com muita radicalidade, é organizar os alunos carentes para lutar por políticas públicas. Por exemplo, o Prouni só nasceu no Brasil porque nós unimos nossos alunos e os levamos para o Congresso Nacional para pressionar os deputados e senadores para votar a criação do Prouni. Nós só temos hoje as cotas para negros nas universidades públicas porque lotamos oito ônibus e fomos para Brasília também para pressioná-los para votar a lei de cotas. Portanto nosso foco número dois é luta por políticas publicas para os negros a nível nacional. Esta matéria faz parte da série de reportagens sobre cursinhos populares produzida pelo Primeiro Módulo da Rede Fórum de Jornalismo. Confira abaixo mapa dos cursinhos populares no Brasil. Conhece algum cursinho popular? Escreva pra gente: [email protected]